Acórdão nº 220/09 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução05 de Maio de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 220/2009

Processo n.º 86/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    Na presente acção emergente de contrato de trabalho, o Banco A., SA. recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra (a fls. 943 e seguintes) da sentença que, com fundamento em nulidade do processo disciplinar por omissão de diligências probatórias requeridas pelo arguido, julgou parcialmente procedente a acção que lhe movera B. e, em consequência, declarou a ilicitude do despedimento do autor.

    Nas alegações, concluiu o Banco, nomeadamente, que “[a] não junção aos autos de processo disciplinar dos mapas de resultados e rentabilidade da sua agência da Guarda, relativos aos anos de 2001 e 2002 […] não conduz à nulidade do mesmo, por não terem sido feridos os direitos à defesa do Recorrido” (cfr. conclusão B), e ainda que “o Banco deu cumprimento – ao contrário do que defende o tribunal recorrido – à exigência contida no n.º 5 “in fine” do artigo 10º do DL 64-A/89, justificando por escrito a não junção” (cfr. conclusão L).

    O autor contra-alegou através da peça processual de fls. 1024 e seguintes, que se dá como reproduzida, não tendo aí suscitado quaisquer questões de constitucionalidade, mormente quanto à invocada matéria da nulidade do processo por não junção de elementos instrutórios requeridos pelo arguido.

    Por acórdão de 23 de Outubro de 2008, o Tribunal da Relação de Coimbra (fls. 1210 e seguintes) concedeu provimento ao recurso de apelação da ré, aduzindo, na parte que agora releva, o seguinte:

    Assim, entendemos que a concordância prática dos princípios que regem o processo disciplinar, no que toca à sua estrutura inquisitória, aos princípios do contraditório, das garantias de defesa, por um lado, bem como aos que regem o segredo da escrita mercantil e suas excepções, por outro, nos levam a considerar justificada a recusa pela ré da requerida junção de elementos da sua escrita, podendo ter considerado (à luz dessa operação de concordância) tal tarefa patentemente impertinente.

    Por outro lado, não vemos que tendo em conta a matéria de facto a que se destinavam, em sede probatória, - embora de algum relevo em sede de apreciação global disciplinar -, se revista de essencialidade tal que a recusa da junção tenha afectado gravemente a defesa do autor. É que, como dissemos, a ré (como decisor disciplinar) tinha conhecimento desses elementos e podia ponderá-los, mesmo sem os juntar, na decisão a tomar no processo. Também por aqui não se afigura totalmente irrazoável a sua não junção.

    Por isso, diversamente do entendimento da 1ª instância, entendemos que o processo disciplinar não padece de nulidade insuprível, sendo válido, procedendo, assim, a apelação nesta parte.

    […]”.

    1. arguiu a nulidade e requereu a reforma deste acórdão (a fls. 1254 e seguintes), arguindo de inconstitucionalidade e ilegalidade as seguintes normas:

      1. A extraída do n.º 3 do artigo 659.º do CPC, segundo a qual é permitida a consideração de factos que não estejam contidos explicitamente na decisão de facto existente nos autos, por violação dos artigos 18º, n.º 2, e 20º, n.º 4, da Constituição.

      b) A extraída do n.º 5 do artigo 10.º do DL n.º 64-A/89, segundo a qual não é exigível que a entidade empregadora junte ao processo disciplinar documentos requisitados pelo trabalhador na sua defesa quando estes estejam na posse daquela e sejam do seu conhecimento.

      c) A extraída do n.º 5 do artigo 10.º do DL n.º 64-A/89, de 27/02, segundo a qual é patentemente impertinente a junção ao processo disciplinar de documentos requisitados na defesa do trabalhador com base na invocação do segredo mercantil por parte da entidade empregadora.

      O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 17 de Dezembro de 2008, julgou improcedente a reclamação (fls. 1330 e seguintes), concluindo nos seguintes termos.

      Tudo o que se considerou, ponderou e analisou no Acórdão foi a partir dos factos constantes na decisão de facto da 1ª instância (incluindo neles, como se disse, o processo disciplinar e os documentos que o constituíam), elaborando-se a partir deles uma argumentação lógico-dedutiva.

      Assim, não consideramos que tenha havido modificabilidade da decisão de facto da 1ª instância e, logo, a interpretação — alegada pelo requerente - do n.° 3 do artigo 659° do CPC, “segundo a qual é permitida a consideração de factos que não estejam contidos explicitamente na decisão de facto existente nos autos ou a consideração de factos, não provados, e a pronúncia sobre questões de que o Tribunal não possa conhecer”, ocorrendo violação do n°4 do artigo 20º da CRP.

      Pelo que não consideramos que, com base na arguida “nulidade” — que não reconhecemos —, tenha havido interpretação e aplicação inconstitucional do disposto no n°5 do artigo 10° do DL n° 64-A/89, de 27/02.

      A solução jurídica mencionada no Acórdão está suficientemente explicitada, não sendo permitido, como base na nulidade arguida e que não colhe, alterar a fundamentação e decisão contida no mesmo.

      […]”.

    2. interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, declarando o seguinte (fls. 1352 e seguintes):

      “B., Autor e Recorrido/Recorrente no processo acima referenciado, notificado do douto acórdão nele prolatado em 17/12/2008, proferido sobre o requerimento de arguição de nulidade e de pedido de reforma do também douto acórdão proferido nos autos em 23/10/2008 vem deste interpôr o competente recurso para o Tribunal Constitucional, o que faz nos seguintes termos e fundamentos:

      1 — O acórdão de 17/12/2008 confirma e mantém integralmente o acórdão de 23/10/2008, do qual foi arguida a nulidade/invalidade daquele acórdão, requerendo o suprimento da mesma e, subsidiariamente, pedida a reforma do mesmo. Pedidos esses considerados improcedentes.

      2 — Tais acórdãos fizeram aplicação de normas inconstitucionais. Na decisão do acórdão de 17/12/2009 foram aplicadas normas previamente arguidas de infringirem o disposto na Constituição e os princípios nela consignados, violando o disposto no seu artigo 204°. Por isso,

      3— Em conformidade com o disposto no art. 75.° - A da Lei n.° 28/82, de 15 de Setembro, cumpre-lhe dizer o seguinte:

      4 — É o recurso interposto ao abrigo do disposto no art. 280°, n.° 1. alínea b) da Constituição da República (CRP, doravante) e do artº. 70°, n.° 1, alínea b) da Lei n.° 28/82, de 5/l1;

      5 - As normas arguidas de ilegalidade e inconstitucionalidade são;

      1. A extraída do n.° 3 do artigo 659.° do CPC, aplicada no sobredito douto acórdão de 23/10/2008 e mantida e aplicada no acórdão de 17/12/2008, que o confirma e mantém integralmente, segundo a qual é permitida a consideração de factos que não estejam contidos explicitamente na decisão de facto existente nos autos.

        b) A extraída do n.° 5 do artigo 10° do DL n.° 64-A/89, aplicada no sobredito douto acórdão de 23/10/2008 e mantida e aplicada no acórdão de 17/12/2008, que o confirma e mantém integralmente, segundo a qual não é exigível que a entidade empregadora junte ao processo disciplinar documentos requisitados pelo trabalhador na sua defesa quando estes estejam na posse daquela e sejam do seu conhecimento.

        c) A extraída do n.º 5 do artigo 10.° do DL n.° 64-A/89, de 27/02, aplicada no sobredito douto acórdão de 23/10/2008 e mantida e aplicada no acórdão de 17/12/2008, que o confirma e mantém integralmente, segundo a qual é patentemente impertinente a junção ao processo disciplinar de documentos requisitados na defesa do trabalhador com base na invocação do segredo mercantil por parte da entidade empregadora.

        6 - A questão da ilegalidade e inconstitucionalidade normativa arguida, foi suscitada no requerimento do ora de recorrente, apresentado em 6 de Novembro de 2008, via fax e CTT, de fls. ... dos autos;

        7 - As normas legais e normas e princípios constitucionais violados pelas normas arguidas de ilegalidade e inconstitucionalidade, encontram-se consignadas:

        7.1 - Relativamente à norma referida na alínea a) do ponto 4 supra:

        i) Quanto à ilegalidade: no artigo 659.° e 664.° do CPC;

        ii) Quanto à inconstitucionalidade: no n.° 4 do artigo 20.° e n.° 2 do artigo 18.° da CRP.

        7.2 - Relativamente à norma referida na alínea b) do ponto 4 supra:

        i) Quanto à ilegalidade: no artigo 659.° e 664.° do CPC e nos n.ºs 4, 5 e 9 do artigo 10º do DL n.° 64-A/89, de 27/02;

        ii) Quanto à inconstitucionalidade: no artigo 53°, no nº 4 do artigo 20.° e n.° 2 do artigo 18.° da CRP.

        7.3 — Relativamente à norma referida na alínea c) do ponto 4 supra:

        i) Quanto à ilegalidade: nos n.° 9 do artigo 10.° e n.° 4 do artigo 10.° do DL n.º 64-A/89, de 27/02;

        ii) Quanto à inconstitucionalidade: no artigo 53.° e n.° 2 do artigo 18.° da CRP.

        8 — Salvo o devido respeito, a solução dada às questões postas, revela-se errónea, em virtude de ter sido apreciada:

        8.1— “Em abstracto” e em termos incongruentes e errados, face às questões colocadas no referido requerimento de 6 de Novembro de 2008 do ora Recorrente e ao teor do acórdão de 23/10/2008, tratando-se de requerimento relativo a vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade invocados quantos ás normas aplicadas e mantidas pela decisão recorrida, as quais levam a que os actos praticados com fundamento nessas normas sejam nulos/inválidos ou juridicamente inexistentes, por força do disposto nos artigos 3°, n.° 3, e 204.°, da Constituição.

        8.2 — “No campo dos princípios”, tendo em conta que o suprimento da nulidade invocada (com base na sobredita ilegalidade e inconstitucionalidade) ou subsidiariamente a reforma do acórdão de 23/10/2008, por efeito do provimento do citado requerimento de 6 de Novembro de 2008 do ora Recorrente, constituiria uma das garantias do processo equitativo;

        8.3 — Com o reconhecimento de que as interpretações das sobreditas normas arguidas de ilegalidade e inconstitucionalidade podem ter efeito

        socialmente negativo, imposto, em abstracto, pelas exigências:

        8.3.1 Quanto...

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