Acórdão nº 94-1999.C3.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelURBANO DIAS
Data da Resolução28 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Relatório AA intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Pombal, acção ordinária contra BB e mulher, CC, pedindo a condenação de ambos a: - Reconhecerem que tem direito a resolver o contrato de empreitada que celebrou com o R. marido, por incumprimento definitivo deste; - A pagarem-lhe o montante de 6.357.662$00, a título de indemnização por danos patrimoniais; - A pagarem-lhe a quantia de 1.000.000$00, a título de indemnização por danos não patrimoniais; - A pagarem-lhe juros de mora contados sobre as referidas importâncias, desde a citação até efectivo cumprimento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: - Celebrou com o 1º R. um contrato de empreitada, visando a alteração e ampliação de um seu prédio, pelo preço de 9.000.000$00; - O 1º R. veio a abandonar a obra, deixando por concluir diversos trabalhos; - Por sentença transitada, foi fixado o prazo de 2 meses para que 1º R. concluísse a obra, nada tendo ele feito; - Para mandar executar os trabalhos que R. deixou por fazer terá de gastar um total 6.357.662$00; - A situação causou-lhe tristeza e depressão, danos morais que contabiliza em 1.000.000$00; - A R. mulher também é responsável pela dívida, por existir proveito comum do casal.

Os RR. contestaram, dizendo, em suma, que: - Foi o A. quem incumpriu o contrato, por não ter pago os montantes estabelecidos no plano de pagamentos para as fases de assentamento de caixilharias das tubulações para água e electricidade, no valor de 1.000.000$00, de aplicação de reboco, interior e exterior, também no valor de 1.000.000$00, bem como o montante de 500.000$00 para o início da colocação do piso cerâmico, apesar de interpelado diversas vezes, com a advertência de que se não pagasse, o R. não continuaria os trabalhos; - Existiu simulação do preço, a pedido do A., sendo o preço efectivamente ajustado de 13.000.000$00.

- O 1º R. veio a suspender os trabalhos por não ter condições para continuar já que tinha de suportar elevados encargos com mão-de-obra e materiais.

E, em sede de reconvenção, pediram a condenação do A. no pagamento global de 2.500.000$00, correspondente à soma dos valores parcelares que deveria ter entregue ao R. marido.

O A. apresentou articulado superveniente, com base em alegados novos vícios que a obra apresenta, de que só, então, teria tido conhecimento, os quais implicam a demolição da obra, sem que pudesse, desde logo, quantificar os respectivos prejuízos, ao que os RR. responderam, dizendo que tal não correspondia à verdade e que, mesmo que tal não sucedesse, sempre teria de proceder a excepção da caducidade.

Saneado e condensado, o processo seguiu para julgamento, após o que foi proferida sentença a julgar improcedentes tanto a acção como a reconvenção.

Sem êxito, apelou o A. para o Tribunal da Relação de Coimbra.

Continuando inconformado, pede, ora, revista, a coberto das seguintes conclusões com que rematou a sua minuta: 1. A matéria apurada nos autos não é suficiente para se poder concluir que foi o A que entrou em mora contratual, a partir da mera constatação de que o R. o interpelou, solicitando o pagamento de mais dinheiro para continuação da obra.

  1. Esse pensamento é claramente insuficiente para basear o juízo proferido pelas instâncias. Por um lado, e como se salienta na sentença do tribunal de 1ª instância, não se apurou qual o valor da obra realizada nem o valor total pago pelo A. ao R..

  2. E consequentemente 4. Não se apurou se o dinheiro recebido pelo R. é superior, adequado ou inferior ao valor da obra realizada (considerando o modo imperfeito e cheio de vícios como foi realizada), para cuja determinação terá necessariamente de ser apurado o valor da reparação/reconstrução.

  3. Por outro lado, o R. jamais notificou o A para aceitar os trabalhos realizados no âmbito da empreitada, dando-lhe a oportunidade de se pronunciar sobre a quantidade e qualidade dos trabalhos executados, e verificar a existência de eventuais defeitos.

  4. Nada consta nos autos sobre se o A. aceitou ou não os trabalhos, sendo que o ónus da prova competia ao R., e essa matéria é crucial para se solucionar o presente litígio.

  5. Haja em vista também, o que não é despiciendo, que o A. vivia no estrangeiro.

  6. O R. não podia desobrigar-se só por ter pedido ao A. mais dinheiro, quando não o notificou para que este aceitasse a obra até aí realizada, mediante declaração expressa.

  7. O R. abandonou a obra sem ter fundamento legal para a sua conduta ilícita.

  8. O acórdão julgou mal, em face da factualidade apurada, ao considerar que o A. entrou em mora contratual, quando a mora é do R., pelos motivos indicados.

    Acresce que, 11. Encontra-se na factualidade apurada pelas instâncias, designadamente nos nºs 79, alíneas a) a q), 83, 84,90 e 91 da matéria de facto apurada no acórdão recorrido, (mas não considerado o seu teor para efeitos de aplicação do direito e designadamente para efeitos de determinação do valor da obra realizado pelo R.) a comprovação da existência de vícios nos trabalhos executados pelo R., bem como que alguns desses trabalhos não cumpriram as regras do projecto aprovado.

  9. Tais vícios foram fixados pelos meios de prova apresentados, em especial as perícias realizadas nos autos. São objectivos, comprovados e graves! 13. Os vícios foram alegados pelo A. no decurso dos autos, e designadamente nas alegações de recurso de apelação.

  10. Surpreendentemente, as decisões das instâncias não se pronunciaram sobre os vícios existentes na obra, nem extraíram qualquer juízo de censura sobre a situação. Por outro lado, 15. Devia a matéria relativa aos vícios e à sua importância para a melhor compreensão da conduta contratual das partes, ter implicado o alargamento da Base Instrutória, bem como a repetição da audiência de julgamento, o que não aconteceu.

  11. Bem assim, deveria tal matéria - vícios na obra realizada e paga - ser considerada para efeitos de determinação de uma solução justa para o litígio.

  12. O acórdão violou o disposto no artigo 1218° do Código Civil, e as alíneas c) e d), do nº 1 do artigo 668° do CPC, pelo que deve ser revogado, sem prejuízo do mesmo ser considerado nulo por não se ter pronunciado sobre questões cuja apreciação lhe foi pedida, e substituído por outro que venha a considerar o valor da obra realizada, determinado tendo em atenção os vícios da obra, se necessário com remessa do processo para novo julgamento, com a ampliação da matéria de facto necessária para que se aprecia do mérito da presente acção e se alcance uma justiça material em detrimento de uma mera justiça formal.

    Responderam os recorridos, em defesa da manutenção do aresto impugnado.

    II.

    As instâncias deram como provados os seguintes factos: 1. Mediante contrato escrito que se encontra junto a fls. 10 a 16 dos autos apensos, o A. e o R. marido celebraram, em meados do ano de 1990, um contrato de empreitada, com vista à transformação e ampliação de um prédio que o primeiro possui na Estrada das Congostas, Pombal.

  13. O R. marido era, e é, empreiteiro da construção civil, profissão a que há muito se vem dedicando de modo organizado, lucrativo e permanente, movimentando capitais e trabalho.

  14. O A., quando contratou com o R. marido, estava emigrado na Alemanha e ali continua.

  15. O A. e o R. eram amigos e mantinham um bom relacionamento, sendo o R. afilhado do pai do autor.

  16. A. e R. tinham calendarizado os vários pagamentos de acordo com a evolução da obra, tal como consta do contrato: 1.000.000$00 no acto de outorga do presente contrato; 2.000.000$00 após a aposição da 1ª placa; 1.000.000$00 após a aposição da 2ª placa; 1.000.000$00 após a aposição do telhado; 1.000.000$00 após o assentamento das caixilharias, tubulações para água e electricidade; 1.000.000$00 logo após a conclusão do reboco; 1.000.000$00 no início do assentamento dos pisos cerâmicos; 850.000$00 no início do assentamento das portas, janelas, louças sanitárias, azulejos e demais trabalhos de acabamento; 150.000$00 no acto da entrega das chaves.

  17. Ocorreu um pagamento, por parte do A. ao R., referente ao contrato, no valor de 3.700.000$00.

  18. Em finais do ano de 1991, antes do início das obras de construção, foram efectuados trabalhos de desaterro.

  19. Com o acordo de A. e R., este iniciou a execução das obras em finais do ano de 1991.

  20. Durante os anos de 1992 e 1993, o R. executou trabalhos na obra.

  21. A obra foi acompanhada pelo técnico responsável pela mesma.

  22. O R. aplicou as diversas placas.

  23. O R. colocou o telhado.

  24. O R. fez todo o assentamento das caixilharias e das tubulações para água e electricidade.

  25. Pela totalidade dos trabalhos de assentamento de caixilharias das tubulações para água e electricidade, o A. deveria pagar ao R. a quantia de 1.000.000$00.

  26. O A. não efectuou o pagamento referente ao assentamento de caixilharias e das tubulações para água e electricidade.

  27. No rés-do-chão, foi aplicada grande parte dos fios eléctricos, o que ocorreu também no 1º andar e parte restante da obra, faltando aplicar, referente à instalação eléctrica, parte do entubamento (enfiamentos) dos fios eléctricos, o quadro eléctrico, os interruptores e as tomadas eléctricas (em relação às quais o réu se limitou a aplicar caixas de aparelhagens, as quais, como é habitual, foram chumbadas com massa de cimento), os quais constituem trabalhos de acabamentos.

  28. Foram executadas as canalizações das casas de banho do rés-do-chão, não tendo sido aplicadas louças...

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