Acórdão nº 10154/2007-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelGILBERTO JORGE
Data da Resolução01 de Abril de 2009
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

I - Relatório.

J instaurou e fez seguir contra "S, S.A." a presente acção declarativa na forma sumária pedindo que a mesma seja julgada provada e procedente e, em consequência, condenando-se a ré a pagar ao autor a quantia de dois milhões duzentos e quarenta e nove mil oitocentos e sessenta e três escudos, acrescida de juros de mora à taxa supletiva comercial de 12 % até efectivo e integral pagamento, custas e procuradoria como de lei.

Para tanto e em síntese alegou o autor ter celebrado, em 20.11.1998, com a ré um contrato promessa de compra e venda de duas fracções autónomas do prédio urbano, designadas por "RR" e "QQ", correspondendo ao sétimo andar direito, lados nascente e poente, respectivamente, do edifício sito na Avenida General... Torres Vedras.

De acordo com o aludido contrato, o autor prometia comprar à ré e esta prometia vender pelo preço global de onze milhões e quinhentos mil escudos, livres de quaisquer ónus ou encargos bem como devolutas as supra referidas fracções.

Tendo o autor pago à ré, em 20.11.1998, a quantia de um milhão de escudos a título de sinal e princípio de pagamento, ficando o remanescente de ser pago no acto da escritura pública de compra e venda.

Competindo ao promitente comprador, ora autor, notificar o promitente vendedor, ora ré, para aquele acto notarial.

Alega o autor ter promovido o registo predial provisório da promessa, o qual enfermou de demoras por se terem verificado divergências na denominação social da ré e falta de prova do regime de casamento do autor, divergências essas removidas pelos respectivos interessados, autor e ré, dando origem aos competentes averbamentos.

A ocorrência de tal situação veio a impedir o cumprimento do prazo contratual imposto pela cláusula 4.ª n.º 1, in fine, do contrato em apreço.

Em 10.05.1999, o autor deslocou-se a Torres Vedras para proceder pessoalmente ao levantamento da certidão da Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, tendo apurado, então que, por volta da Páscoa de 1999, deflagrou um incêndio nas duas fracções prometidas.

Adianta o autor que a ré, apesar da ocorrência destes factos e deles ter tido conhecimento, veio a notificar o autor, por carta de 17.05.1999, com vista à celebração do contrato definitivo.

Sendo que as portas de entrada para as fracções prometidas exibiam, nessa data de 17.05.1999, sinais de deterioração em resultado de terem estado submetidas a fogo e temperaturas elevadas como acontecia com as paredes exteriores das ditas fracções.

O autor não dispunha das chaves de acesso ao interior das fracções desconhecendo, por outro, a gravidade e extensão de eventuais deteriorações no interior daquelas.

O que levou o autor a enviar uma carta à ré, em 18.05.1999, a solicitar uma inspecção ao local e uma fiscalização camarária para aferir a funcionalidade pós incêndio das fracções prometidas.

Decorrido mais de um mês sem ter havido qualquer resposta, o autor enviou à ré nova carta a comunicar que considerava o incumprimento definitivo do contrato por não se mostrarem satisfeitas as condições mínimas exigíveis.

Por carta de 29.06.1999, a ré respondeu pretendendo que fosse o autor a fazer as obras necessárias com dedução do seu valor no preço.

Perante a recusa presumida do autor, veio a ré, em 20.11.1999, a notificá-lo da marcação da escritura pública de compra e venda.

Finalmente, sustenta o autor que, volvidos dois meses e meio após o incêndio e mais um mês sobre o pedido de informações e reparação dos danos causados pelo sinistro, perdeu interesse no negócio.

A ré contestou defendendo-se por impugnação, pugnando pela total improcedência da acção com a sua consequente absolvição do pedido.

E deduziu pedido reconvencional pugnando pela procedência do mesmo e, consequentemente, que seja declarado e reconhecido o direito da ré a reter e fazer sua a quantia de 1.000.000$00 entregue pelo autor a título de sinal.

Formulou ainda contra o autor o pedido de condenação deste, como litigante de má-fé, a pagar-lhe a indemnização que for calculada nos termos do art. 457.º n.º 1 alínea b) do C.P.Civil.

Sendo ainda o autor condenado em custas e procuradoria condigna.

Alega a ré em síntese que, nos termos da cláusula 4.ª n.º 1 do referido contrato promessa, a escritura pública de compra e venda deveria ser marcada pelo promitente comprador, ora autor, "para data não posterior a 31 de Março de 1999".

Devendo o autor comunicar à ré, por carta registada com aviso de recepção, "com a antecedência mínima de dez dias", o dia, hora e local da realização da referida escritura.

Alega a demandada que o autor requereu, em 15.03.1999 - portanto quinze dias antes da data a que estava obrigado a proceder à realização da escritura pública - o registo de aquisição provisória das fracções em causa, a seu favor, sem que estivesse estipulado entre as partes contratantes que ao autor "competisse" a realização do registo de aquisição provisória.

Adianta também que, em 10.05.1999, não existiam vestígios de incêndio nas portas das duas fracções prometidas vender porque, nessa data, as mesmas já se encontravam reparadas por iniciativa da ré, pois que mal tomou conhecimento do incêndio, em 09.04.1999, mandou de imediato reparar integralmente as danificações resultantes do mesmo, encontrando-se tal reparação concluída desde 21.04.1999.

Sendo que tal ocorrência mais não foi do que um pequeno foco de incêndio ao nível do 7.º piso, na caixa da escada junto às portas dos apartamentos referenciados, pelo que a sua reparação se tornou relativamente simples.

Alega ainda a demandada que o autor foi informado do aludido incêndio e apesar de ter sido facultado àquele a possibilidade de visitar as fracções em causa, sucede que o autor apenas se dispôs a visitar tais fracções e o respectivo interior em 09.06.1999.

Alega também que, após ter sido interpelado pela ré para a realização da escritura publica de compra e venda das fracções, o autor, em 18.05.1999, enviou à ré uma carta invocando como pretexto o incêndio para se eximir à sua obrigação de comparecer no dia e hora marcados para a outorga da escritura pública de compra e venda.

Na sequência da visita feita pelo autor às fracções prometidas vender, este enviou à ré uma carta em que dá conta das reparações que ainda pretendia que a ré efectuasse, tais como, limpeza e pintura na parede da caixa da escada, nas aduelas das portas chamuscadas, substituição dos puxadores das portas por serem desiguais, secagem das alcatifas e substituição dos fios das campainhas por se encontrarem queimados.

Tendo a ré, em 09.06.1999, proposto ao autor que este procedesse às ditas reparações, ficando os custos por conta da ré que seriam abatidos no preço das fracções a pagar por aquele, sendo que o autor nunca se pronunciou sobre esta proposta, tendo apenas, em 24.06.1999, por carta dirigida à ré, invocado o incumprimento do contrato promessa de compra e venda pela ré por força da não realização das reparações e solicitando o pagamento do sinal em dobro.

Em sede reconvencional alega a ré/reconvinte que o autor não compareceu, por duas vezes, nas datas, locais e horas marcadas para a realização da escritura pública de compra e venda das fracções objecto do contrato-promessa, uma vez que o autor não tinha efectuado tal marcação até ao prazo limite fixado contratualmente.

Tendo a primeira data para a outorga da escritura pública sido marcada para o dia 15.06.1999 e a segunda data para o dia 03.11.1999; sendo que, em 17.05.1999 - data em que a ré deu a conhecer ao autor o dia 15.06.1999 para a realização da escritura pública - as portas e as paredes exteriores das fracções em causa já não apresentavam sinais de deterioração ou de exposição a fogo e temperaturas elevadas.

Finalmente, sustenta a ré que o autor sempre soube que não tinha qualquer fundamento para deduzir a pretensão a que se reporta os presentes autos, tendo inclusivamente omitido a carta de 09.06.1999 que enviou à ré e da qual constam pequenas reparações que pretendia que fossem efectuadas e que a ré alegadamente efectuou.

O autor replicou pugnando pela improcedência do pedido reconvencional, dando-se provimento à petição do autor, condenando-se a ré como litigante de má-fé, em multa e reembolso ao autor das despesas liquidadas a final com as legais consequências em matéria de custas.

Em síntese, alegou o autor que as deficiências nas fracções persistiam depois da pretensa reparação dada por concluída pela ré em 21.04.1999.

Que o autor se tivesse outorgado a escritura notarial ver-se-ia com aquisições de fracções em estado de conservação diverso, para pior, do que havia sido prometido.

Adianta também que as deficiências emergentes do incêndio não haviam sido integralmente eliminadas como verificou o autor no local e resulta confessado através do despacho manuscrito de um quadro da ré que expressamente diz " Julgo que o melhor será a mediadora acordar uma verba c/o promitente comprador para fazer face às obras apontadas que será descontado a final".

Sendo que os defeitos e anomalias resultantes do incêndio não se encontravam eliminadas em 28.06.1999.

Posteriormente (fls. 99-102), a ré veio requerer: - que o valor da causa obedeça aos critérios legais previstos no art. 308.º n.º 2 do C.P.Civil; - a ampliação do pedido reconvencional que consiste no cancelamento do registo de aquisição provisória efectuado a favor do autor com a inscrição G 6 que abrange os dois prédios em causa: fracções "RR" e "QQ"; - e, finalmente, que devem ser consideradas como não escritas as considerações constantes dos arts. 6.º e 8.º da resposta à contestação.

Por despacho (fls. 108-109) proferido pelo Mm.º Juiz decidiu-se fixar o valor da causa em 3.249.863$00, ordenando-se que os autos fossem remetidos ao Tribunal competente, no caso as Varas Cíveis de Lisboa, a fim de aí prosseguirem os seus trâmites legais, na forma ordinária.

Mais adiante teve lugar a audiência preliminar na qual se tentou em vão o acordo das partes.

Elaborou-se despacho saneador no qual o Mm.º Juiz a quo...

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