Acórdão nº 119/15 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelCons. Catarina Sarmento e Castro
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 119/2015

Processo n.º 606/14

  1. Secção

Relator: Conselheiro Catarina Sarmento e Castro

Acórdão na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I - Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Central Administrativo Sul, veio A., S.A. interpor recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), identificando, como objeto do recurso, a interpretação, extraída do artigo 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, conducente ao sentido de as taxas ali previstas incidirem sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas abastecedoras dos postos de abastecimento.

    Invoca a recorrente a inconstitucionalidade material de tal sentido interpretativo, por violação direta do artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, e dos princípios de proporcionalidade e de justiça consagrados em tal preceito.

  2. O processo teve início na impugnação, apresentada pela aqui recorrente, contra o ato de liquidação de taxa relativa à emissão de licença de obras de remodelação de um posto de abastecimento de combustíveis. Invocou a recorrente, além do mais, a inconstitucionalidade da norma de incidência objetiva da taxa colocada em crise, plasmada no artigo 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro.

    Por decisão de 4 de setembro de 2013, o Tribunal Tributário de Lisboa julgou a impugnação improcedente, mantendo o ato de liquidação.

    Inconformada, a aqui recorrente interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul.

    Por acórdão de 27 de março de 2014, foi negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida.

    É deste acórdão que a recorrente interpõe o presente recurso de constitucionalidade.

  3. Notificada para o efeito, a recorrente apresentou alegações, concluindo do seguinte modo:

    1. A Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da norma contida no art. 15º, n.º 1, al. l) do Decreto-Lei n.º 13/71, se for interpretada no sentido de se entender bomba de combustível como mangueira abastecedora, por entender que a mesma padecerá de várias inconstitucionalidades, ocorrendo uma frontal violação dos princípios constitucionalmente consagrados da proporcionalidade e justiça - v. art. 266º, n.º 2 CRP – da liberdade de iniciativa económica privada – art. 61º/1 – além de ser organicamente inconstitucional.

    2. Sem prejuízo de esta norma ter sido revogada muito recentemente pelo Decreto-Lei n.º 84/2014, de 29/05, a verdade é que a ora Recorrente tem sido alvo de inúmeras e sucessivas liquidações deste tipo de taxas sobre mangueiras abastecedoras de combustível, por parte das Estradas de Portugal, referentes aos vários postos de abastecimento que detém por todo o território nacional, que considera não só ilegais, como inconstitucionais, razão pela qual pretende submeter à apreciação de V. Exas. esta questão que se afigura de grande relevância jurídica e social.

    3. É inequívoco que a letra do preceito em causa determina a incidência objetiva da taxa sobre as bombas abastecedoras, não havendo quaisquer razões lógico-jurídicas que levem a que a norma em causa possa ser objeto de uma interpretação corretiva.

    4. Com efeito, esta norma de incidência objetiva manteve-se inalterada, continuando a base da tributação a ser as bombas de abastecimento e não as mangueiras dessas bombas, que são apenas “elementos” dessas bombas, sendo que a bomba de abastecimento é o dispositivo mecânico que permite, designadamente, mover ou elevar materiais líquidos, no caso, combustíveis, desde o depósito que está enterrado no posto, até ao depósito do veículo a abastecer.

    5. Se o legislador tivesse pretendido alterar a base da incidência objetiva desta taxa, passando a assentar no número de mangueiras e não nas bombas, seguramente que o teria escrito expressamente e não teria mantido o mesmo texto, quando em 2004, através do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, alterou a norma, mas mantendo inalterada a base de incidência objetiva de tributação – quando em 2004 já proliferavam as bombas multiproduto.

    6. Deste modo, e de acordo com as regras e princípios da interpretação e aplicação da lei consagrados no artigo 9.°, n.° 3 do Código Civil, em que o intérprete deve sempre presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento corretamente e em termos adequados, conclui-se que a taxação desta norma deve incidir sobre a bomba de combustível enquanto possibilidade de extração do mesmo do depósito onde está armazenado para o recetáculo do veículo automóvel.

    7. Além disto, diga-se que por uma questão prática e por impossibilidade física, o abastecimento apenas pode ser feito em simultâneo por dois veículos, um de cada lado da bomba, no máximo!

    8. O que se tributa não deve ser a disponibilização de um produto, mas o benefício retirado da possibilidade de em determinado momento um veículo automóvel ser abastecido no posto de abastecimento, e por isso, as possibilidades de abastecimento não são proporcionais ao número de mangueiras.

    9. Já vários Acórdãos do TC se pronunciaram sobre esta questão, referindo que o critério de fixação do quantum de uma taxa é relevante, em termos de se aferir da utilidade que o sujeito passivo dela extrai, não podendo ser completamente alheio aos custos da entidade pública ou a essa utilidade.

    10. Perante esta jurisprudência, decorre que o critério encontrado pela B. para fixar o montante das taxas a pagar, nos termos do referido art. 15º, n.º 1, al. l) do DL 13/71, baseando-se no número de mangueiras e não no número de bombas já constitui uma total desproporção, que compromete a correspondência que deverá existir entre o serviço prestado (o licenciamento) e a utilidade que a entidade que explora os postos retira.

    11. Se é verdade que uma mangueira é o equipamento da bomba de abastecimento que representa uma possibilidade de saída do carburante do depósito onde este se encontra armazenado para o depósito do veículo, o facto é que cada cliente apenas poderá optar por um produto de cada vez, não obstante ter várias ofertas de produtos (geralmente, são quatro os produtos disponibilizados: gasóleo, gasolina s/ chumbo 95 e 98, e gasolina “Gforce”).

    12. Nem poderá a B. dizer que o licenciamento rodoviário que é feito nestes moldes tem como finalidade garantir a segurança rodoviária e...

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