Acórdão nº 80/15 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 80/2015

Processo n.º 1097/14

  1. Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. A., demandante civil no processo com o n.º 35/13.3PASNT.S1-A, reclama do despacho proferido em 30 de outubro de 2014 pelo relator no Supremo Tribunal de Justiça, que não lhe admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional.

      Sustenta que o recurso deve ser admitido, com os seguintes fundamentos:

      1- No art. 399º do CPP estabelece-se o princípio geral da admissibilidade de recursos das sentenças, dos acórdãos e dos despachos judiciais; Por outro lado,

      2- A Constituição da República Portuguesa garante a todos os cidadãos o acesso aos Tribunais para defesa dos seus direitos e garantia dos seus direitos (art. 20º CRP);

      3- No caso concreto dos autos, com o devido respeito em contrário, a Assistente A. tem direito ao recurso. Pois,

      4- Conforme o consagrado na Constituição da República Portuguesa, Declaração Universal dos Direitos do Homem (arts. 8º e 10º) e na Convenção - Europeia dos Direitos do Homem (arts. 6º e 13º) o recurso é uma manifestação fundamental do direito; Assim,

      5- Não pode a lei ordinária limitar o direito ao recurso; Porquanto,

      6- O arguido nos presentes autos de processo penal recorreu do douto Acórdão proferido pela 1ª Instância para o Supremo Tribunal de Justiça;

      7 - A reclamante por concordar com esse mesmo acórdão não apresentou Recurso do mesmo;

      8- Esse douto Acórdão no seu modesto entender estava bem fundamentado e não enfermava de qualquer nulidade ou inconstitucionalidade;

      9- É o douto Acórdão proferido pelo STJ que põe em causa, pela primeira vez os direitos fundamentais da ora reclamante consagrados na Constituição da República Portuguesa. Pois,

      10- Até então esses direitos não tinham sido postos em causa pelo Tribunal "a quo", que bem tinha decidido ao atribuir indemnização à reclamante com base no nº 4 do art. 496º do C.C.;

      11- O Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça ao decidir que a ora Reclamante não tem direito a indemnização pelos seus danos próprios resultantes da morte do seu filho, quando resultou provado que foi ela quem mais sofreu com a morte da vítima, aplicou ao caso concreto o nº 2 do art. 496º do C.C. e não o nº 4 do mesmo artigo, pondo em causa os direitos fundamentais da ora reclamante;

      12- Este Acórdão adotou uma interpretação inesperada do nº 4 do art. 496º do C.C., pelo que, não era exigível que a ora Reclamante antevisse e tivesse suscitado a questão da inconstitucionalidade antes de proferido o Mesmo; Por isso,

      13- É, no modesto entender da Reclamante jurisprudência pacífica do Tribunal Constitucional que não tem que ser suscitada previamente uma questão de inconstitucionalidade com a qual a parte não contasse.

      14- É certo que o arguido tinha alegado que a ora Reclamante no seu entender não tinha direito à indemnização e que esta lhe respondeu. Porém,

      15- Não se punha na altura a questão da constitucionalidade.

      16- Esta questão só surge com o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, pelo que só nessa altura pode ser alegada.

      17- A Reclamante não previa, nem contava com tal entendimento, pelo que não podia nem devia levantar hipóteses antecipadamente.

      18- O certo é que a Constituição da República Portuguesa consagra o direito ao recurso para garantia de defesa dos direitos dos cidadãos e no caso concreto dos autos, com o devido respeito pela opinião em contrário, está a vedar-lho. Deste modo,

      19- E com o devido respeito pela opinião em contrário deve revogar-se a decisão que não admite e ordenar-se a sua admissão com as consequências legais.

    2. Neste Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação, nos seguintes termos:

      (…) 3. É deste acórdão que a demandante A., ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, uma vez que, não se conforma com ele, na parte em que absolveu o arguido do pagamento, a si, da quantia de € 40.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

      4. Nesse requerimento não vem enunciada de forma minimamente clara e autónoma uma questão de inconstitucionalidade normativa.

      5. Na verdade, a recorrente entende, fundamentadamente, que a decisão do Supremo Tribunal de Justiça, ao decidir que a demandante não devia ser indemnizada, violava os artigos 13.º, n.º 2, 26º, n.º 1, 36.º, n.º 6 e 67.º, n.º 1 da Constituição.

      6. A inconstitucionalidade é imputada direta e expressamente à própria decisão recorrida, pelo que estamos perante objeto inidóneo do recurso.

      7. Por outro lado, “durante o processo”, a agora reclamante também não suscitou uma questão de inconstitucionalidade daquela natureza, faltando, pois, esse requisito de admissibilidade.

      8. Na verdade, o arguido, na motivação do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, impugnando a decisão da 1ª instância, entendeu que a demandante não tinha direito à indemnização dizendo nas conclusões, a propósito:

      “k) Ora, o Tribunal a quo entendeu que tal exceção se verificaria apenas no tocante aos danos peticionados pelo sofrimento causado a B. e sentido por este antes de morrer (sem prejuízo de ter também entendido que nenhum facto se provou a tal propósito), e entendeu ainda que, quanto a danos não patrimoniais, a legitimidade para os peticionar decorreria, no caso de C. (filho da vítima), do artigo 496.º, n.º 2, do Código Civil, e no caso de A. (mãe da vítima), do n.º 4 do mesmo receito.

      l) Porém, o n.º 4 do artigo 496.º do Código Civil manda atender aos danos patrimoniais sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores – ou seja, restringe a possibilidade de demanda por danos não patrimoniais às pessoas cuja legitimidade resulte, designadamente, do n.º 2 do mesmo preceito.

      m) E o tribunal a quo foi categórico em referir que, tendo a vítima B. um filho (também demandante nos autos), fica arredada a legitimidade de A. em peticionar os danos derivados da morte deste, por força do disposto no mencionado n.º 2 do artigo 496.º do Código Civil.

      n) Ora, tal exclusão determina também, ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, que não tendo a demandante A. direito à indemnização prevista no referido n.º 2, fica igualmente excluída do campo de aplicação do n.º 4 do artigo 496.º do Código Civil, pois a expressão “direito a indemnização nos termos dos números anteriores” não pode deixar de significar, no caso concreto, apenas C. (filho da vítima), visto que em caso contrário, todos os potenciais habilitados por força do n.º 2 (incluindo descendentes, ascendentes, irmãos, sobrinhos, etc.) poderiam vir em simultâneo peticionar danos não patrimoniais.

      p) O Acórdão recorrido violou assim, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 496.º, n.º 2 e n.º 4, e 495.º, n.º 3, todos do Código Civil, ao condenar o arguido a pagar a A. a quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrente dos danos por si sofridos pela morte de B., seu filho.”

      9. Esta tese, sustentada pelo então recorrente, foi integralmente acolhida pelo Supremo Tribunal de Justiça, dizendo-se no final do acórdão:

      “Assim, no caso, a existência de beneficiário do primeiro grupo –...

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