Acórdão nº 56/15 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCons. Maria Lúcia Amaral
Data da Resolução27 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 56/2015

Processo n.º 787/2014

  1. Secção

    Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral

    Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

    I – Relatório

    1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A., foi proferida decisão sumária de não conhecimento do objeto do recurso com a seguinte fundamentação:

    2. O recurso de constitucionalidade foi interposto ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), nos termos do qual cabe recurso para o Tribunal Constitucional de decisões que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.

      Não se encontrando o Tribunal Constitucional vinculado pela decisão que admitiu o recurso, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 76.º da LTC, entende-se não se poder conhecer do objeto do mesmo.

      Compulsados os autos, verifica-se não ter sido previamente suscitada, de modo processualmente adequado, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer, tal como é exigido pelo n.º 2 do artigo 72.º da LTC, qualquer questão de constitucionalidade normativa.

      Desde logo, na resposta apresentada, a fls. 2450-2523, às alegações das Rés, ora recorridas, o ora recorrente não suscitou qualquer questão de constitucionalidade.

      É certo que, no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, o requerente, reconhecendo isso mesmo, entende que as questões foram suscitadas no requerimento de arguição de nulidade do acórdão que julgou procedente a revista (fls. 2730-2770), sustentando que, face à novidade que a interpretação do acórdão proferido pelo tribunal a quo introduziu, estar-se-ia perante uma decisão surpresa, pelo que não lhe era exigível que antecipasse tal interpretação, suscitando previamente inconstitucionalidades relativas à mesma, em vista de ulterior recurso para o Tribunal Constitucional.

      Sem razão, porém.

      Mesmo que, para efeitos de dar como verificado o pressuposto processual de suscitação prévia da questão de constitucionalidade, fosse de considerar o teor do requerimento de arguição de nulidade do acórdão que julgou procedente a revista, a verdade é que, depois de no ponto 77 se afirmar que «[…] sempre se verificam, ou poderão verificar, diversas violações da Constituição da República Portuguesa», em lugar algum dessa peça processual, designadamente nos pontos 84-93, se dá cumprimento àquilo que são as exigências decorrentes da jurisprudência do Tribunal Constitucional relativas ao ónus a que se refere o n.º 2 do artigo 72.º da LTC. Segundo jurisprudência firme do Tribunal Constitucional, «[s]uscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, obviamente, que – como já se disse – tal se faça de modo claro e percetível, identificando a norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender de quem suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao menos, a norma ou princípio constitucional infringido» (Ac. n.º 269/94, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Como se afirma no Ac. n.º 367/94, disponível em www.tribunalconstitucional.pt, «[a]o questionar-se a compatibilidade de uma dada interpretação de certo preceito legal com a Constituição, há de indicar-se um sentido que seja possível referir ao teor verbal do preceito em causa. Mais ainda: esse sentido (essa dimensão normativa) do preceito há de ser enunciado de forma a que, no caso de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos de tanto os destinatários desta como, em geral, os operadores do direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, deste modo, afrontar a Constituição».

      Assim, por não ter sido dado cumprimento ao ónus de suscitação prévia, de modo processualmente adequado, das questões de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, tal como é exigido pelo n.º 2 do artigo 72.º da LTC, não é de admitir o recurso interposto para este Tribunal.

    3. Notificado dessa decisão, A. veio reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, concluindo do seguinte modo:

  2. – A decisão do Douto Supremo Tribunal de Justiça foi proferida total e infundadamente contra a sua firme e uniforme jurisprudência em termos do respeito pela matéria de facto fixada e da competência das instâncias;

  3. – O próprio Douto Supremo Tribunal de Justiça afirmou que “não está em causa a factualidade provada e fixada pela Relação, que este S.T.J. tem de respeitar”;

  4. – Ainda assim, ao arrepio dessa afirmação de respeito e, também, da sua firme e uniforme jurisprudência sobre a culpa como matéria de facto, invadiu a competência exclusiva das instâncias;

  5. – Sem essa invasão, era impossível e juridicamente inviável a concessão da dirimente do exercício de um direito pelas rés;

  6. – Com tal conduta, o Douto Supremo Tribunal de Justiça, não só proferiu uma decisão anómala e absolutamente imprevisível, como violou a dimensão normativa das apontadas normas legais e dos indicados princípios consignados na Constituição;

  7. – Essas violações foram colocadas ao Douto Supremo Tribunal de Justiça em articulado próprio, vindo aquele Tribunal a conhecer delas, reforçando e ampliando essas violações; ou seja,

  8. – O Douto Supremo Tribunal de Justiça entendeu as inconstitucionalidades que lhe foram arguidas e conheceu delas, ainda que indeferindo-as;

  9. – Nestas condições, ciente da firmeza e uniformidade da jurisprudência do próprio Douto Supremo Tribunal de Justiça (cfr. os 20 acórdãos acima citados) sobre as referidas matérias, não só o recorrente não podia antever tais decisões, como fez a respetiva arguição de “modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer”.

  10. – Melhor dito, não podia o recorrente invocar qualquer inconstitucionalidade ou violação das normas legais adjetivas e substantivas antes de conhecer a inovação do conteúdo do acórdão do Supremo, que foi, sem a mínima fundamentação para tanto, contra a sua firme e uniforme jurisprudência e, mais, contra a sua categórica promessa, de a respeitar, isto é, tendo o Supremo a noção de que devia respeitar a interpretação dos questionados preceitos em conformidade com a Constituição.

  11. – Para a análise sobre a oportunidade e modo de suscitação que se diz em falta, não basta a simples enumeração dos pontos 77 e 84-93, contando, e sendo os mais importantes, os pontos acima transcritos, pela ligação natural e lógica àqueles em que expressamente se invocam as inconstitucionalidades.

  12. – Essas inconstitucionalidades ficariam, aliás, sem suporte completo se não fosse a argumentação antecedente, e daí que, no ponto 77 se tenha para ali remetido, ao dizer-se que “...além disso, ou se assim se não entender, sempre se verificam, ou poderão verificar, diversas violações da Constituição da República Portuguesa”, a cuja demonstração depois se procede, em termos bastantes para delas se obter, como se obteve, a pronúncia, esclarecida, do Tribunal recorrido.

  13. – Havendo violações...

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