Acórdão nº 0826968 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Fevereiro de 2009
Magistrado Responsável | CARLOS MOREIRA |
Data da Resolução | 03 de Fevereiro de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº6968/08-2 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1.
A pedido de B................., S.A., foram, ao abrigo do artº 51º nº2 do CE, introduzidos em juízo autos de expropriação litigiosa em que é expropriante EP-Estradas de Portugal, E.P.E.
Os Srs. Árbitros fixaram a indemnização de 80.000 euros a atribuir à requerente, pois que a expropriação afecta parte de um edifício onde estão instalados os seus serviços técnicos administrativos e comerciais, bem como o acesso às instalações e outras construções.
Pela expropriante foi interposto recurso da decisão arbitral, defendendo que o edifício implantado no terreno expropriado não se encontra legalizado (uma vez que não foi pedido parecer obrigatório à Direcção de Estradas do Porto para a sua implantação), pelo que nunca o valor de indemnização poderá ser superior ao proposto em sede de fase amigável (25.000,00€), não para compensar a recorrida pelo edifício, mas apenas "a título de compensação por algum eventual prejuízo causado na sua actividade".
Respondeu a requerente defendendo, apara além do mais: a) que a sua ocupação da parcela expropriada está devidamente legalizada, estando o edifício onde laboram os seus serviços técnicos licenciado pela Câmara Municipal da Maia; b) que ainda que assim não fosse, sempre seria inconstitucional a interpretação do Código das Expropriações que fizesse depender o direito à indemnização da legalidade da construção - no entender da recorrida, é do facto de se ser arrendatário que nasce o direito a ser indemnizado.
Foi proferido despacho a atribuir à recorrida o montante sobre o qual existia acordo - 25.000,00€ - deduzido das custas prováveis nos termos do artº 52º nº3 do CE.
Procedeu-se seguidamente à avaliação prevista nos arts. 61.º a 63.º do CE, na sequência da qual são propostos dois valores distintos: - um pelos peritos nomeados pelo tribunal e pelo perito indicado pela recorrida - 60.000,00€ (sessenta mil euros); - outro pelo perito indicado pela expropriante - 4.500,00€ (quatro mil e quinhentos euros).
Realizou-se sessão para prestação de esclarecimentos orais dos peritos na qual pelo tribunal foi suscitada a questão da eventual nulidade do contrato de arrendamento celebrado pela requerente e notificada esta para se pronunciar sobre tal ponto.
Defendendo ela a inexistência de nulidade por ao contrato em causa não serem aplicáveis as regras do Regime do Arrendamento Urbano, (não sendo, por isso, obrigatória a redução do mesmo a escritura pública) e porque, ainda que o fossem, sempre a comprovação do pagamento das rendas seria suficiente para a prova da existência do contrato.
Já a expropriante defendeu a nulidade do contrato de arrendamento e a consequente consideração da recorrida como parte ilegítima ou, subsidiariamente, a fixação da indemnização no valor proposto pelo perito por si indicado.
A recorrida pugnou pela atribuição do valor indemnizatório de 80.000,00€ ou, em todo o caso, não inferior a 60.000,00€.
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Finalmente foi proferida sentença que: - declarou a nulidade, por vício de forma, do contrato de arrendamento celebrado, não reconhecendo a qualidade de arrendatária à requerida e, consequentemente, declarou que esta não tem direito a ser ressarcida pela expropriante por força da expropriação aqui em apreço.
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Inconformada recorreu a requerida.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: I- Não é nulo o contrato de arrendamento comercial com base no qual a ora recorrente sustenta a sua legitimidade processual (substantiva) nos autos; II- Na verdade, a ausência da escritura pública exigível (em 01-10-1995), como requisito de forma para a validade do contrato, trata-se de mera ausência de uma formalidade "ad probationem" e não "ad substantiam"; III- A formalidade em falta (escritura pública), destina-se muito mais a produzir efeitos e salvaguarda para as próprias partes contratantes (apelante e respectivo senhorio) do que perante terceiros (não sendo assim, e sendo essa a intenção, o legislador não teria distinguido, como fez, contratos sujeitos a registo e não sujeitos a registo - artigo 7º do Regime do Arrendamento Urbano, na redacção aplicável).
IV- Entender que a formalidade em falta é uma formalidade "ad substantiam", é colocar em causa a unidade do próprio sistema jurídico: se a lei admite o mais (na falta de escritura pública, num contrato de arrendamento onde além desta formalidade, era também exigível o registo, se admite que o mesmo se convalide e tenha eficácia desde que tenha sido celebrado pela forma escrita), há-de admitir o menos (no caso dos autos não era exigível registo, mas apenas escritura pública); V- Os elementos que a apelante trouxe aos autos são mais que bastantes para comprovar a existência, válida e eficaz, de relação arrendatícia e da sua qualidade de arrendatária da parcela expropriada (e pelo que reclama indemnização); VI- Não é nulo, portanto (e como Sentenciou o Tribunal " a quo") o contrato de arrendamento que titula a posição da apelante nos autos (respectiva legitimidade processual); VII- E interpretou-se, assim e erradamente, o artigo 7º do Regime do Arrendamento Urbano (na redacção vigente à data dos factos - 01-10-1995), bem como o artigo 220º do Código Civil; VIII- No mínimo à apelante sempre deveria ser reconhecida a qualidade de interessada (artigo 9º do Código das Expropriações), e portanto nunca poderia esta ter sido afastada do direito a uma indemnização justa; IX- Com efeito, a melhor interpretação do artigo 62º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa implicaria, face à conclusão a que o Tribunal "a quo" chegou (nulidade do contrato de arrendamento da apelante), que se indagasse se no mínimo esta não teria a qualidade de interessada no processo expropriativo; X- E, até à luz do que diz o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02-03-2005, se verá que mesmo não sendo arrendatária (o que por hipótese se admite), a ora apelante sempre seria interessada; XI- Qualidade essa que a coloca como titular do direito a justa indemnização; XII- Interpretou-se, pois, erradamente o sentido e alcance do artigo 9º do Código das Expropriações e omitiu-se sequer a aplicação e interpretação do artigo 62º da Constituição da República Portuguesa; XIII- Ainda que nenhuma das conclusões anteriores proceda sempre há-de considerar-se que a invocação da nulidade do contrato de arrendamento da apelante, obstando assim ao pagamento de justa indemnização, face a toda a factualidade provada, consubstancia abuso do direito; XIV- A apelada nunca teve, ao longo de todo o processo - e senão já após a audiência de julgamento em que o tribunal resolveu notificar a apelante para esclarecer se o contrato de arrendamento foi celebrado por escritura pública ou não - qualquer intenção de não reconhecer a qualidade de arrendatária à apelante; XV- E só o fez, isto é, só invocou essa nulidade, a "reboque" do tribunal "A quo"; XVI- Face aos elevados prejuízos e somas que, comprovadamente, a apelante teve de despender para respeitar a expropriação, e portanto possibilitar a prossecução do bem público, representa uma situação de verdadeiro abuso de direito a invocação que a apelada acaba por vir fazer aos autos (sobre a nulidade do contrato de arrendamento da apelante), como forma de nenhuma indemnização vir a pagar; XVII- é grave que se admita a invocação da nulidade do contrato de arrendamento para conseguir-se, sem mais, não pagar um cêntimo a quem para a prossecução do bem público teve prejuízos e custos como teve a apelante: isto afronta o próprio comando constitucional (artigo 62º, nº 2 da CRP) e é também, evidentemente, uma ostensiva situação de abuso de direito (artigo 334º do Código Civil); XVIII- É este o somatório de razões pelo qual se dirige a apelante a V. Exas., pedindo que, interpretando-se correctamente os preceitos legais supra assinalados, se ordene que: a. Seja revogada a decisão em crise e ordenada a sua substituição por outra que declare válido o contrato de arrendamento e declare a existência de legitimidade processual (substantiva), da apelante com a consequente fixação de justa indemnização em atenção aos factos provados; b. Caso assim se não entenda seja a decisão em crise revogada e substituída por outra que reconheça a apelante como interessada no processo expropriativo em...
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