Acórdão nº 0855816 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2008
Magistrado Responsável | ANABELA LUNA DE CARVALHO |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
APELAÇÃO Nº 5816/08-5 5ª SECÇÃO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: IB.......... e mulher, C.........., residentes na Rua .........., n.º .., .........., Figueira da Foz, propuseram contra D.........., LDA., com sede na .........., n.º .., .........., Vila Nova de Gaia, acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, alegando em síntese, que: Celebrou o Autor marido com a Ré um contrato promessa de compra e venda de um prédio rústico pelo preço de Esc: 219.300.000$00, tendo entregue de sinal Esc: 70.000.000$00; no contrato foi acordado que a Ré teria de ter a licença de construção a pagamento na C. M. de .......... até 30/01/00, com prorrogação de 45 dias, bem como teria de realizar até tal data determinadas obras, sendo que, se o não fizesse poderia o Autor marido resolver o contrato; a Ré não cumpriu tais obrigações pelo que em finais de Maio de 2000 o Autor marido resolveu o contrato.
Terminam pedindo a condenação da Ré no pagamento do dobro do sinal, ou seja, € 698.317,06.
Contestou a Ré alegando, em resumo, que não teve culpa no atraso da obtenção da licença, que tal se deveu a exigência do Autor em negociar previamente uma outra parcela; a cláusula do prazo deve ser interpretada de acordo as regras de boa-fé pois não estava na disponibilidade da Ré a maior ou menor demora na obtenção da licença; assim, por força da resolução do contrato, sem justa causa, tem direito a fazer seu o sinal.
Termina pedindo a improcedência da acção e, em pedido reconvencional, a perda do sinal prestado pelo Autor marido.
Replicaram os Autores mantendo a sua versão e pugnando pela falta de responsabilidade do A. no incumprimento do contrato.
Pedem a improcedência da reconvenção e, em termos subsidiários, que a Ré seja condenada a cumprir o contrato em prazo razoável e a indemnizar os prejuízos sofridos pela mora.
Realizou-se a audiência de julgamento tendo sido proferida sentença que julgou a acção procedente por provada e o pedido reconvencional não provado e, em consequência, decidiu condenar a Ré a entregar aos Autores a quantia de € 698.317,06 e absolver os Autores reconvindos do pedido reconvencional contra si formulado pela Ré reconvinte.
Inconformada com tal decisão dela veio recorrer a Ré concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: I - A ora Recorrente não se conforma com a Douta sentença que decidiu condenar a Recorrente no pedido, declarando resolvido o contrato promessa de compra e venda com fundamento em incumprimento da mesma e em consequência condenando a Recorrente a pagar o dobro do sinal.
II - Salvo o devido respeito, parece que o meritíssimo juiz a quo não valorizou sequer a prova documental apresentada pela Recorrente, nomeadamente a correspondência trocada entre as partes, Documentos nºs 3, 6, 7 e 8 apresentados com a contestação, e que, na nossa modesta opinião, são fulcrais à boa decisão da causa, invertendo em absoluto a decisão tomada.
III - Pois, naqueles documentos está bem patente a férrea vontade da Recorrente em cumprir o contrato e, por outro lado, transparece a vontade do Recorrido em não cumprir o contratado e a pretensão de o resolver.
IV - Tem algum cabimento que estando o projecto pronto a dar entrada na Câmara em Novembro, aliás o projecto foi mostrado ao Recorrido nas negociações para a celebração do contrato promessa de compra e venda, que a Recorrente não o tenha imediatamente entregue na Câmara.
V - E em vez disso, se tenha proposto adquirir uma parcela de terreno confinante com o lote E, designada pela letra "Z", que não lhe pertencia, por um preço exorbitante, obtendo com esse negocio um prejuízo líquido de 18.500.000$00.
VI - Pois a Recorrente acordou a venda daquela parcela de terreno, pelo preço global de 40.000.000$00 e o preço a pagar pelo Recorrido por aquela parcela, previamente estipulado (clausula décima segunda do contrato promessa) seria de 21.500.000$00 (4.300.000$00 X 5 fracções).
VII - Parece pois, mais do que evidente, que o Recorrido tinha muito mais interesse na aquisição daquela parcela do que a Recorrente, que não teve vantagem nenhuma, antes pelo contrário, daí que o Recorrido tenha pressionado a Recorrente para comprar a dita parcela e tenha pedido o adiamento da entrega do projecto na Câmara.
VIII - Exactamente neste sentido vão as declarações proferidas pelo Arquitecto E.........., autor do projecto, na audiência de julgamento realizada a 24-01-2003, gravadas na cassete 1, lado B: Arquitecto: "Eu na altura tinha o projecto concluído, houve por parte do Sr. B.......... que me transmitiu na altura que ele até compraria o terreno, mas também queria que fosse com a outra parte, que a D.........., Lda acordasse com o proprietário a compra daquela parte, porque não fazia sentido deixar aquele intervalo ..." Pergunta: - "O Sr. B.......... tinha ou não interesse na aquisição dessa parcela?" Arquitecto: - "Sim tinha, porque como disse há um bocado, numa das reuniões que tive com o Sr. B.........., ele chegou a dizer que se não fosse com aquele bocado ao lado, ele não manteria interesse em ficar com o terreno".
IX - O acordo para a aquisição daquela parcela foi estabelecido em Dezembro de 1999, conforme resulta provado do documento nº 3 junto com a contestação, nesse fax datado de 17-12-1999 o sócio da Recorrente informa o Recorrido que havia chegado a acordo - "muito desfavorável para nós", acrescentando "que o projecto de arquitectura se encontra pronto (já com o resto do terreno) para que o Sr. B.......... aprove antes de entrar na CM.........".
X - Consequentemente, em face desta prova, a matéria dos artigos 4º, 5º e 6º da Base Instrutória deve ser dada como provada.
XI - Quanto ao prazo esperado para a aprovação do projecto, existia a forte expectativa que esse prazo fosse curto, de 3 ou 4 meses, em virtude do plano de urbanização aprovado pela Assembleia Municipal em 17-10-96 e em Conselho de Ministros a 16-12-96, mas tal não se veio a verificar por inépcia da Câmara e não por culpa da Recorrente que procedeu com a máxima diligencia para a aprovação do projecto.
XII - Nesse sentido mais uma vez as declarações proferidas pelo Arquitecto E.........., autor do projecto, na audiência de julgamento realizada a 24-01-2003, gravadas na cassete 1, lado B: Arquitecto: Nós só teríamos que no fundo respeitar as regras do plano e meter um projecto que interiormente respeitasse os regulamentos para que aquilo saísse rapidamente.
Arquitecto: D.........., Lda andava ao mesmo tempo que eu a mexer na Câmara para tentar acelerar o processo, lá dentro, a tal ponto que nós conseguíamos obter as informações antes mesmo de serem oficiadas ... para lhe dar resposta imediata.
Arquitecto: São processos que demoram 2, 3 meses, no máximo 4 messes, neste momento.
Arquitecto: Fui eu que propus este negócio à D.........., Lda, exactamente pela celeridade que aquele processo iria implicar ... gorou-se completamente.
XIII - Por outro lado, a Recorrente teria que finalizar as infra-estruturas 6 meses antes da conclusão da construção dos edifícios, marcada para 20 meses após o início da mesma, ou seja, após a aprovação do projecto de especialidades e da licença de construção ser posta a pagamento, sendo esta da competência do comprador, neste caso Recorrido/Autor.
XIV - Todavia, apesar de ter muito tempo, a Recorrente iniciou imediatamente as obras de infra-estruturas, tanto assim que a Recorrente informa em 24-04-2000 por fax o Recorrido (Doc. nº 6 junto com a contestação) que a rua está concluída tendo os trabalhos sido aprovados pela Câmara.
XV - A Recorrente deu cumprimento ao clausulado na alínea a) da cláusula sexta do contrato promessa e a todas as exigências quer legais, quer camarárias, tendo o projecto todos os documentos para ser aprovado.
XVI - Pelo que, se o projecto não foi imediatamente deferido, deveu-se apenas aos trâmites, burocracia e delongas da Câmara Municipal .........., sem quaisquer responsabilidades da Recorrente.
XVII - Evidentemente que não está na disponibilidade das partes o deferimento dos projectos, da competência exclusiva das Câmaras, que no caso da Câmara de .......... demorava cerca de um ano a apreciação e deferimento de um projecto.
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