Acórdão nº 0844346 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelFERREIRA DA COSTA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Reg. N.º 549 Proc. N.º 4346/08-1.ª Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B.......... deduziu contra C.........., a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que se declare a ilicitude do despedimento e que se condene a R. a pagar à A. indemnização por antiguidade, no montante de € 4.284,00; indemnização por danos, patrimoniais e não patrimoniais, no montante de € 3.000,00, 3 dias de salário relativo ao mês de Junho de 2006, no montante de € 95,29, o complemento de vencimento de Abril, Maio e Junho, todos de 2006, no montante de € 500,00, as férias e o subsídio de férias, vencidos a 31 de Dezembro de 2005 - sic - no montante de € 1.904,00 e as férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao tempo de trabalho prestado no ano de 2006, no montante de € 1.313,76, sendo tudo acrescido de juros de mora, desde a data da citação, até integral pagamento.

Alega a A., para tanto e em síntese, que tendo sido admitida ao serviço da R. em 2005-07-01 para, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado, exercer as funções correspondentes à categoria profissional de escriturária, foi despedida em 2006-06-16, na conclusão de processo disciplinar adrede instaurado com fundamento nos factos ocorridos em 2006-04-20, sendo certo que tal processo é nulo, que não existiu justa causa para o despedimento, que este lhe causou danos morais e que não lhe foi paga qualquer das quantias ora pedidas.

Contestou a R., alegando os factos constantes da nota de culpa e da decisão disciplinar, aceita que não foi paga à A. a quantia de € 1.629,40 a título de férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal, vencidos e proporcionais e, quanto ao mais, contestou por impugnação.

Realizado o julgamento com gravação da prova pessoal, foi assente a matéria de facto provada e não provada, sem reclamações, como se refere na acta de fls. 197.

Proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e a R. condenada a pagar à A. a quantia de € 3.813,05, acrescida de juros de mora, conforme pedido.

Inconformada com o assim decidido, veio a A. interpôr recurso de apelação, tendo invocado na alegação a nulidade da sentença, formulando a final as seguintes conclusões: 1. Existindo e encontrando-se junta aos autos uma carta registada com ar enviada pela R. à A. em 27 de Abril de 2005, que não foi objecto de qualquer reparo, em que a segunda comunica à primeira a "cessação da dispensa temporária que teve início no dia 20 de Abril do presente ano" (data da desobediência que deu origem ao processo disciplinar), informando-a que "terá obrigatoriamente de se apresentar ao serviço, nas instalações do C.........., a fim de retomar as suas funções, a contar da data da recepção desta missiva, sob pena de incorrer em faltas injustificadas, passíveis de incorrer em procedimento disciplinar", é manifestamente abusivo e arbitrário retirar-se daí qualquer outra ilação nomeadamente a que faz a Mma. Sra. Juiz Recorrida no ponto 16 dos factos provados, ao escrever que "a A foi mandada apresentar-se ao serviço da R., por carta datada de 27/04/2006, pelo facto de ter deixado o computador do C.........., usado exclusivamente por si, bloqueado e inacessível, ...".

  1. Tal ilação, alegadamente retirada do depoimento de uma única testemunha ("administrativa da R. desde Maio de 2006" - cfr. factos provados), é incompatível com o texto e sentido da carta referida no número anterior, onde se comunica à A "a cessação da dispensa temporária" e se solicita "a apresentação ao serviço a fim de retomar as suas funções" sob pena de processo disciplinar por faltas injustificadas.

  2. É que, "a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário posa deduzir do comportamento de declarante ..." tornando-se eficaz logo que chega ao poder do declaratário (arts. 236° e 224º, ambos do Cód. Civil).

  3. Por outro lado, é igualmente estranho (para não dizer impossível) que uma tal convicção da Exma. Sra. Juíza, alheia ao texto da sobredita carta e à própria nota de culpa, se tenha exclusivamente fundado no depoimento de uma única testemunha, "administrativa da R. desde Maio de 2006", ou seja, que só foi admitida cerca de um mês após a ocorrência da desobediência da A. !!!! 5. Encontrando-se também junto aos autos um ofício da GNR que se deslocou ao local no dia da ocorrência (doc. 2 junto com a p.i.) onde se lê que ".... A senhora B.......... (aqui recorrente) referiu à força desta Guarda que não acatou o pedido que lhe havia sido feito pela sua entidade patronal, em virtude de, com indicação da sua Advogada, ter solicitado à entidade patronal documento formal que expressasse o motivo pelo qual lhe pediam o afastamento do seu local de trabalho e a mesma não lhe passar o documento pretendido", e tendo a causídica em questão prestado o seu depoimento em julgamento e confirmado o dito aconselhamento à A., não se pode entender a omissão da sentença ou dos factos provados sobre tal matéria, com excepção da referência ao depoimento da Advogada em questão, onde se escreveu "no que respeita ao depoimento testemunhal prestado por D.........., advogada, não foi o mesmo considerado relevante, porquanto, não tendo a ilustre causídica assistido aos factos, directamente, baseou praticamente todo o seu depoimento no que lhe foi relatado pela A. e pela mãe desta".

  4. A factualidade atinente ao eventual (e indiciado!) aconselhamento técnico da A. por advogado, no sentido de agir como agiu, é matéria de particular relevância para apreciação da culpa da A, nomeadamente para se poder aferir se se tratou de desobediência gratuita, leviana, grosseira e meramente provocatória, ou se resultou de aconselhamento técnico de advogado, discutível que seja, mas que foi determinante no seu comportamento subsequente! 7. Resulta com evidência da apreciação cruzada do relatório da GNR (doc. 2 junto com a p.i.) e do depoimento da advogada consultada pela A., prestado em audiência de julgamento, que a desobediência desta se ficou a dever única e exclusivamente à convicção de que lhe assistia o direito a exigir, como exigiu, uma comunicação por escrito para abandonar o seu posto de trabalho, sem o que se poderia recusar a obedecer, como recusou! 8. De harmonia com o exposto, face à carta com a.r. enviada pela R. à A. no dia 27 de Abril de 2006, em que a primeira comunica à segunda a "cessação da dispensa temporária" e a convoca a retomar as suas funções, (doc. 3 junto com a p.i.) e perante o indiciado aconselhamento da A. por advogada, que a determinou a agir como agiu (cfr. relatório da GNR - doc. 2, e depoimento daquela, em audiência), resulta evidente: a) quer a ausência de culpa (ou culpa reduzida) por parte da A., na desobediência que praticou, entendida esta como consciência da ilicitude do seu comportamento; b) quer a não verificação da "imediata e praticamente impossível" subsistência da relação de trabalho.

  5. A desobediência em...

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