Acórdão nº 7985/2008-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Dezembro de 2008

Data16 Dezembro 2008
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I - Relatório 1. T..., Ldª, requereu procedimento cautelar comum contra C..., Ldª, alegando, em resumo, que : - Requerente e requerida têm por objecto social, respectivamente, "a indústria e comércio de artes gráficas e edições" e a "indústria de edição de livros ou outras publicações"; - A requerida, desde a sua constituição e até 2004, produziu e distri-buiu, regularmente, uma vez por ano, uma obra denominada Simposium Terapêutico, em forma de livro, que funcionava como um dicionário vulgar com entradas a partir dos nomes comerciais dos medicamentos, que enci-mavam e introduziam as correspondentes informações técnico-científicas; - No 2º semestre de 1978, a requerente publicou, pela primeira vez, a obra Índice Nacional Terapêutico, cujo direito de autor fez registar, e que passou a ser conhecida por Índice, a qual estava dotada de um "Índice Geral Remissivo" contendo os nomes de especialidades farmacêuticas, nomes químicos genéricos e de grupos fármaco-terapêuticos, com múltiplas entradas, que tornava a localização de qualquer fármaco rápida e simples, para a prática clínica, constituindo assim uma originalidade; - Todavia, desde 2004, a requerida tem vindo a introduzir alterações na sua obra, de modo a gradualmente se aproximar da estrutura do "Índice Geral Remissivo" existente na obra Índice Nacional Terapêutico da reque-rente, copiando-a, o que veio a suceder de forma completa na edição de 2007; - Tal comportamento viola os direitos de autor da requerente e confi-gura concorrência desleal, causando-lhe prejuízos pela diminuição de recei-tas provenientes da publicidade.

Conclui a requerente, pedindo que a requerida seja intimada a abster-se de inserir na sua obra Simposium Terapêutico, ou outra, um índice ou um sistema de indexação igual ou semelhante ao "Índice Geral Remissivo" da obra da requerente, bem como de utilizar a designação Índice, e que se ordene a apreensão dos exemplares da obra da requerida da edição de 2008 existentes.

2.

Citada, a requerida deduziu oposição, impugnando os fundamen-tos da providência e dizendo, no essencial, que : - Tem registada, a seu favor, a marca nacional Simposium Terapêutico, desde 2000, bem como as suas obras Simposium Terapêutico - Edição 2007 e Simposium Terapêutico - Interacções 2007 junto da Inspecção-Geral das Actividades Culturais; - A requerida não copiou qualquer parte do compêndio publicado pela requerente; - O Simposium Terapêutico já continha, na sua edição de 1977, um índice por especialidades farmacêuticas e foi progressivamente acompa-nhando a evolução do mercado, nomeadamente dando resposta à neces-sidade de identificar o princípio activo dos medicamentos genéricos; - Já a edição de 2003 incluía índices que englobavam o nome comercial, a molécula, o grupo homogéneo, as classificações ATC e CFT e a identificação do laboratório fabricante e detentor da licença do produto; - O registo dos direitos de autor invocado pela requerente refere-se à sua obra Índice Nacional Terapêutico e não ao "Índice Geral Remissivo", cujo conteúdo é totalmente fornecido pelos fabricantes dos medicamentos, nunca podendo ser registado como obra literária; - Desde 2005, existe no mercado uma obra, designada "Mapa Terapêutico", que contém um índice idêntico ao da requerente; - A mera indicação do nome e elementos adicionais do medicamento e laboratório fabricante constituem elementos de publicidade, como tal devidamente pagos.

Conclui pela improcedência da medida.

3.

Por fim, foi proferida decisão a julgar procedente a providência cautelar deduzida, salvo quanto ao pedido de abstenção de a ora agravante usar a designação "Índice", ordenando: - a intimação da requerida a abster-se de inserir na sua obra Sim-posium Terapêutico, em separata ou apenso, distribuída conjunta ou separadamente, um sistema de indexação igual ou semelhante ao "Índice Geral Remissivo" que a requerente tem na sua obra Índice Nacional Terapêutico; - e que se proceda, por via da autoridade policial, à apreensão dos exemplares do Simposium Terapêutico, ficando a requerida obrigada a indicar os locais onde, previsivelmente, os mesmos possam ser encontrados.

4.

Irresignada com tal decisão, a requerida agravou dela, formulando as seguintes conclusões : 1ª - O índice ou tabela de correspondência utilizado pela agravada não constitui sistema criativo e, consequentemente não é alvo de protecção em sede de direito de autor; 2ª - O índice ou tabela de correspondência utilizado pela agrava-da, por ser desprovido de criatividade não é susceptível de protec-ção ao abrigo da legislação de protecção de dados; 3ª - Não existiu cópia do IGR contido na obra "Índice Nacional Terapêutico" da agravada por parte da agravante; 4ª - A agravada é parte ilegítima para reclamar eventuais pre-juízos por perda de receitas de publicidade resultantes da alegada actuação ilícita da agravante; 5ª - O tribunal "a quo" interpretou erradamente as provas docu-mentais apresentadas pela própria Agravada; 6ª - O tribunal "a quo" interpretou erradamente o depoimento da testemunha arrolada pela Agravada, W; 7ª - O tribunal "a quo" errou ao não fornecer oficiosamente a excepção dilatória de ilegitimidade da agravada..

Conclui pedindo que se revogue a decisão recorrida.

5.

A agravada apresentou contra-alegações, sustentando o não provi-mento do agravo.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - Delimitação do objecto do recurso Em face das conclusões da recorrente, com base nas quais se delimita o objecto do recurso, nos termos dos artigos 684º, nº 2 e 3, e 690º, nº 1, do CPC, as questões a decidir consistem em ajuizar sobre : a) - a pretensa ilegitimidade da requerente (conclusões 4ª e 7ª); b) - o pretenso erro de julgamento quanto a provas documentais e a um depoimento testemunhal prestado (conclusão 5ª e 6ª); c) - a violação ou não, por parte da agravante, dos direitos de autor da agravada (conclusão 1ª ) e da legislação de protecção de dados (conclusão 1ª e 3ª).

III - Fundamentação 1. Factualidade dada como provada em 1ª instância Foi dada como indiciariamente provada, em 1ª instância, a seguinte factualidade : 1.1.

A requerente é uma sociedade comercial por quotas matriculada, desde 7 de Setembro de 1977, na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, então sob o número..., tendo por objecto a "indústria e comér-cio de artes gráficas e edições"; 1.2.

No 2º semestre de 1978, a ora requerente publicou, pela primeira vez, a obra Índice Nacional Terapêutico; 1.3.

Encontra-se inscrito, desde 1978, a favor da requerente, no Re-gisto da Propriedade Literária, Científica e Artística, o direito de autor so-bre uma obra literária intitulada Índice Nacional Terapêutico, obra literária de carácter técnico, de que juntou dois exemplares da obra; 1.4.

Esta obra continha um "Índice Geral Remissivo"; 1.5.

Na Apresentação da obra constante na página 4 do documento B (INT de 1978), consta o seguinte: (...) "Um original Índice Geral Remissivo dos nomes de especialidades farmacêuticas, nomes químicos genéricos e de grupos fármaco-tera-pêuticos" tornava a localização de qualquer fármaco rápida e sim-ples.

O Índice responderá directamente às necessidades da prática clínica. "O médico poderá fazer três tipos de consulta. Tanto poderá procurar o nome comercial do produto que lhe interessa, como o seu nome químico genérico ou ainda o nome de um grupo terapêutico geral. Qualquer dessas entradas encontrará no Índice Geral Remissivo (p.p. 30 a 180) alfabeticamente ordenadas.

Cada uma das entradas remeterá para a parte descritiva - Descrição das Especialidades Farmacêuticas do Mercado Português - (p.p. 191 a 534) que lhe dará as informações complementares necessárias, inclusive a literatura sobre os produtos mais impor-tantes.

No Índice Geral Remissivo faz-se a correspondência cruzada de cada entrada entre o nome comercial da especialidade e o nome químico genérico. Deste modo o médico tanto poderá procurar um nome comercial para saber o nome genérico correspondente, bem como o grupo terapêutico em que se integra, como poderá partir do nome genérico para saber quais as especialidades que tem à sua disposição. Poderá ainda seleccionar uma especialidade a partir do grupo fármaco-terapêutico que pretende utilizar no doente".

(...); 1.6.

No requerimento para registo a seu favor, conforme doc. de fls. 61, a requerente declarou o seguinte: (...) "A título supletivo, a requerente apresenta em anexo uma memo-ria descritiva da obra que se pretende ver protegida, com a finali-dade de assegurar os seus direitos contra uma possível eventuali-dade de vir a surgir qualquer outra idêntica que, embora de diversa contextura literária, contudo, ao fim e ao cabo, afecta os direitos de criatividade da requerente, nos elementos essencialmente caracterís-ticos da obra que idealizou".

(...); 1.7.

Na memória descritiva anexa ao requerimento de registo, junta a fls. 62, consta o seguinte: (...) "1. - Agrupamento da descrição dos produtos farmacêuticos pela sua finalidade (grupos fármaco-terapêuticos); 2. - Elaboração de um "Índice Geral Remissivo" que funciona co-mo esquema de consulta e localização imediata de qualquer fármaco na parte descritiva dos medicamentos, organizado alfabeticamente, que terá as seguintes entradas: a. - Nomes comerciais de produtos farmacêuticos no mercado; b. - Substâncias activas (nomes químicos) dos medicamentos; c. - Grupos fármaco-terapêuticos, através dos quais se torna pos-sível a localização imediata na parte descritiva dos medicamentos de qualquer fármaco para determinada finalidade; d. - Apresentação à frente da coluna alfabética da substância ou nome comercial do produto correspondente ao nome alfabéticamen-te ordenado, além do código de classificação e página respectiva onde se localiza a sua descrição; e. - Rectângulo em aberto na parte inferior de cada uma das páginas, destinada a quaisquer inscrições que interessem.

3. - Pretende-se, deste modo, apresentar à classe médica...

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