Acórdão nº 8734/2008-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelCRISTINA COELHO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO.

Em 24.03.08, Mário ...intentou o presente procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais (Assembleia de Comproprietários), contra Maria...., pedindo que se suspenda a execução das deliberações da Assembleia de Comproprietários de 13 de Março de 2008.

A fundamentar o peticionado, alegou, em síntese, que: No dia 23.07.07 realizou-se uma Assembleia de Comproprietários do prédio urbano sito no..., nºs ...e..., freguesia de...., concelho de...., do qual eram, à data, comproprietários o requerente, a requerida e João..., sendo o ponto único da ordem de trabalhos "deliberar sobre a restituição livre de pessoas e bens por parte do comproprietário Mário ... e da sociedade Mário Varela Gomes Unipessoal, Lda., de parte do prédio, que se encontra actualmente ocupada sem autorização".

Antes de serem encerrados os trabalhos da Assembleia foi deliberado, por unanimidade: dar sem efeito tudo o que se tinha passado até então na Assembleia; os comproprietários Maria ...e João ...comprometiam-se a permitir o acesso do requerente e da sua sociedade à parte do prédio que vinha utilizando; os comproprietários Maria ...e João ....comprometiam-se a providenciar a reposição da ligação da água e da electricidade, com os custos a cargo do requerente; proceder à suspensão dos trabalhos, para continuarem no dia 4 de Setembro de 2007, pelas 10h30, no mesmo local, tendo em vista a negociação, até lá, da venda em conjunto dos 3 prédios de que eles eram comproprietários e/ou a celebração de um acordo entre todos.

Os comproprietários Maria ...e João ....não providenciaram a ligação da água e luz, não foi concretizada a negociação de venda conjunta dos 3 prédios, nem a celebração de um acordo entre os comproprietários, e os trabalhos não continuaram no dia 4.09.07.

Através de carta de 22.02.08, a comproprietária Maria ...convocou o requerente para uma Assembleia de Comproprietários a realizar em 13.03.08, cuja ordem de trabalhos era: ponto um, "continuação dos trabalhos que foram suspensos na Assembleia de Comproprietários convocada no passado dia 13.07.07, em virtude dos comproprietários terem acordado a sua suspensão para celebração de um acordo que não se efectuou"; ponto dois, "deliberar sobre a restituição livre de pessoas e bens por parte do comproprietário Mário ....e da sociedade Mário Varela Gomes Unipessoal, Lda., de parte do prédio, que se encontra actualmente ocupada sem autorização".

Antes do início da Assembleia, a requerida, representada por advogada, comunicou que o antigo comproprietário João ...havia, entretanto, doado a quota parte que detinha no prédio à requerida, a qual passou a ser titular de 2/3 do prédio.

Iniciada a Assembleia, o requerente suscitou a ilegalidade da continuação da Assembleia, por ter sido iniciada por 3 comproprietários e estar a continuar com 2, e por não ter continuado na data deliberada, por unanimidade, o que a representante da requerida não aceitou, apresentou proposta de continuação da Assembleia e votou favoravelmente, contra o voto do requerente.

Passou-se à discussão do ponto dois da ordem de trabalhos, tendo a representante da requerida apresentado uma proposta no sentido de restituição da parte do prédio ocupada pelo requerente e a sua sociedade, livre de pessoas e bens no prazo de 10 dias, sob pena de uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 125 por cada dia de atraso, e não obstante o requerido reiterar a sua oposição, após votação, a representante da requerida considerou a proposta aprovada, com o voto contra do requerente, e encerrou a Assembleia.

O requerente considera as deliberações ilegais, por não poder a Assembleia suspensa ser retomada para além do prazo unanimemente deliberado, sendo nula a deliberação tomada no sentido da sua continuação, sete meses mais tarde, o que acarreta a anulação das demais deliberações subsequentes, que dela dependem.

Acresce que, em qualquer caso, a proposta apresentada não foi aprovada, uma vez que, nos termos do art. 1407º, nº 2 e 985º, nº 2 do CC, pretendendo a comproprietária Maria ....opor-se à administração que o requerente vem fazendo daquela parte do prédio, cabe à maioria (pessoal ou por cabeça) decidir sobre o mérito da oposição, o que não se verificou, pois a requerida votou favoravelmente e o requerente contra.

E mesmo que se entendesse que a oposição foi aprovada, sempre se teria de entender que a referida deliberação foi nula, por violar frontalmente o art. 1406º, nº1 do CC, que consubstancia disposição imperativa.

A não suspensão da deliberação aprovada na Assembleia de 13.03.08 acarreta graves prejuízos económicos ao requerente.

Ordenou-se a citação da requerida, que veio contestar, alegando, em síntese: ser inaplicável o procedimento cautelar especificado em causa; mesmo que assim não se entenda, atenta a data de realização da Assembleia, em que o requerente esteve presente, e a data de propositura da providência, verifica-se a caducidade de peticionar a suspensão das deliberações; em todo o caso, não se verificam os requisitos cumulativos para que a providência seja decretada.

O requerente pronunciou-se sobre os documentos juntos pela requerida, invocando a nulidade dos instrumentos de Acta de Reunião de Assembleia Geral juntos aos autos como documentos nºs 1 e 2 da oposição, bem como, subsidiariamente, a falta de autenticidade das mesmas.

Foi proferido despacho, em que se entendeu ser desnecessário produzir mais prova, e proferiu-se decisão, na qual se concluiu existir erro na forma de procedimento, e não estarem reunidos os requisitos legais previstos no art. 381º do CPC, pelo que julgou improcedente o presente procedimento, decidindo-se não suspender a deliberação da Assembleia de Comproprietários realizada em 13 de Março de 2008.

Não se conformando com o teor deste despacho, recorreu o requerente, formulando, a final, as seguintes conclusões: 1. No requerimento em que exerceu o contraditório sobre os documentos juntos aos autos com a douta Oposição, o ora recorrente invocou a nulidade das Actas elaboradas pela Sr.ª Notária, Dr.ª Júlia Silva, e, subsidiariamente, a falta da sua autenticidade, nos termos previstos no n.º 1 do art.º 546º do CPC.

  1. Apesar de ter considerado que as mesmas não eram nulas e de, em bom rigor, a requerida não ter respondido à questão da falta de autenticidade das Actas, a verdade é que o Meritíssimo Juiz "a quo" não se pronunciou expressamente sobre essa questão, invocada pelo ora recorrente, e sobre as respectivas consequências no procedimento, o que, obviamente, devia ter feito. Por outro lado, 3. No seu requerimento inicial (art.ºs 57º a 61º), o ora recorrente invocou também que, a considerar-se ter sido aprovada a proposta apresentada pela ora recorrida a propósito do ponto dois da Assembleia de Comproprietários, realizada em 13 de Março de 2008, a respectiva deliberação é nula, por violar o disposto no n.º 1 do art.º 1406º do CC.

  2. O Meritíssimo Juiz "a quo", tendo considerado aprovada aquela proposta, também não se pronunciou sobre a nulidade invocada pelo ora recorrente, o que devia ter feito, até porque se trata de uma questão essencial à decisão de mérito da providência cautelar requerida.

  3. Essas duas omissões de pronúncia geram a nulidade da douta sentença, de acordo com o disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 668º do CPC, a arguir apenas em sede de recurso, por força do n.º 4 do mesmo artigo, o que o ora recorrente vem fazer, requerendo que seja reconhecida e decretada a nulidade da douta sentença, com as legais consequências (apreciação das questões oportunamente suscitadas pelo ora recorrente, produzindo-se previamente, se assim for considerado necessário, prova sobre os factos alegados a esse respeito, baixando os autos à 1ª Instância para o efeito). Caso assim se não entenda, 6. Diferentemente do que o Meritíssimo Juiz "a quo" considerou, nem a letra, nem o espírito do art.º 396º do CPC impedem que o procedimento cautelar especificado de suspensão de deliberações sociais se aplique à deliberação "sub údice", tomada no âmbito de uma Assembleia de Comproprietários.

  4. Pelo contrário, a razão de ser deste regime especial de procedimento cautelar tem perfeito cabimento no caso de deliberações de Assembleias de Comproprietários, a propósito de administração de coisas comuns, já que estão em causa vontades...

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