Acórdão nº 8342/2008-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1.

[H] intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra [A], pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 48.001,93, acrescida de € 25.975 a título de IVA e de juros de mora, à taxa de 12% ao ano, a contar desde a data de citação e até efectivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto, ter celebrado com o réu um contrato de empreitada, tendo este encomendado outros trabalhos, para além dos previstos inicialmente, os quais foram executados, se bem que, a pedido do réu, tenha havido trabalhos que não foram executados e cujo montante deve ser deduzido aos trabalhos a mais realizados.

Acrescenta que, à data do pagamento efectuado em Dezembro de 2001, a obra encontrava-se praticamente concluída, faltando apenas alguns trabalhos. A partir daí, o réu nada mais pagou, razão por que os legais representantes da autora e o réu se reuniram, tendo acordado que a autora acabaria os trabalhos ainda em falta, após o que o réu lhe liquidaria a quantia em dívida.

No seguimento do acordado, a autora, em Março de 2002, procedeu à colocação dos portões de acesso à moradia, mas o réu, apanhando-se servido, colocou cadeados nos ditos portões, impedindo o acesso da autora à obra e enviou-lhe uma carta, através da qual lhe comunicava que procedia à resolução do contrato por incumprimento contratual, não obstante lhe dever a quantia de € 48.001,93.

O réu contestou e deduziu reconvenção. Impugnando parte dos factos alegados pela autora, invocou, em síntese, que, em meados de Setembro de 2001, quando visitou a obra, detectou vários defeitos, que comunicou de imediato à autora, tendo-lhe esta garantido que ia "dar um jeito" e que no final tudo ficaria bem, garantindo ainda que a obra terminaria em Dezembro de 2001.

Em Novembro de 2001, constatou que a obra não terminaria na data aprazada e que os defeitos ainda não haviam sido eliminados. Efectuada uma reunião com a autora, foi acordado que esta terminaria a obra até ao 14 de Fevereiro de 2002, data em que ocorria o termo da licença de construção. No entanto, nem a obra foi concluída, nem os defeitos eliminados, no prazo acordado, razão por que, no dia 14 de Março de 2002, constatando que a situação se mantinha, enviou a carta a proceder à resolução do contrato.

Acrescenta ter terminado os trabalhos em falta, que, no seu entender, são superiores aos alegados pela autora, importando em € 12.573.

Reconvindo, peticiona o réu que o Tribunal declare válida a resolução do contrato de empreitada e condene a autora/reconvinda a restituir-lhe a quantia de € 96.766,79, ou que, subsidiariamente, se proceda à redução do preço com recurso a avaliação.

A Autora respondeu ao pedido reconvencional.

Elaborado o despacho saneador e organizada a base instrutória, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido dada a resposta aos "quesitos" e proferida a sentença, julgando-se a acção e a reconvenção improcedentes por não provadas, e, consequentemente, (i) absolvido o réu do pedido contra ele formulado pela autora e (ii) esta absolvida de todos os pedidos reconvencionais contra ela formulados pelo réu/reconvinte.

Inconformada, recorreu a autora, formulando as seguintes conclusões: 1ª - A sentença é insanavelmente contraditória quando, por um lado, entende que o contrato de empreitada sub judice não foi validamente revogado e, por outro lado, recusa o pedido da autora a receber a diferença entre o preço da empreitada e trabalhos a mais, descontada dos trabalhos suprimidos e o valor já recebido.

  1. - Acolhendo o facto de, na segunda quinzena de Março de 2002, o réu ter aplicado cadeados no portão de acesso à moradia, impedindo o acesso dos representantes e trabalhadores da autora à obra, deveria ter condenado o mesmo réu a pagar à autora, o que faltava do preço acordado, porquanto, se a obra não foi integralmente concluída, tanto se deve a esta atitude do réu, ora recorrido.

  2. - Não o tendo feito, desconsiderou o princípio de que pacta sunt servanda, acolhido no artigo 406º do Código Civil e bem assim a obrigação de pagamento do preço que decorre da noção de contrato de empreitada vertida no artigo 1207º do Código Civil.

  3. - Ao considerar que a carta enviada pelo réu à autora, datada de 1 de Abril de 2002, e na qual aquele declara revogado o contrato de empreitada sub judice, e bem assim o impedimento do acesso à obra por parte dos representantes da empreiteira e seus trabalhadores, através da colocação de cadeados no portão de acesso à obra, consubstanciam a extinção do contrato por desistência por parte do dono da mesma, ora recorrido, interpreta erradamente o artigo 1229º do Código Civil.

  4. - Aliás, a desistência do contrato por parte do dono da obra nunca poderia considerar-se válida, sem o preenchimento da condição ali consignada de indemnização da empreiteira relativamente aos seus gastos, trabalho e proveito que poderia retirar da obra.

  5. - E estes são perfeitamente definíveis e mesmo quantificáveis, face à matéria alegada e provada, ao contrário do que consta da sentença apelada. Os trabalhos realizados são os que vêm descriminados no orçamento apresentado e aceite, acrescidos dos trabalhos a mais levados a cabo por valores igualmente acordados.

  6. - Ao somatório assim obtido haveria que deduzir, na hipótese de proceder o entendimento de que houve desistência da empreitada, o montante dos trabalhos suprimidos ou a menos e bem assim o dos trabalhos realizados pelo dono da obra e apelado, após a desistência e que estivessem incluídos no orçamento aceite, reservando-se para a apelante os proveitos (lucros) esperados de tais trabalhos.

  7. - Ainda, porém, que do processo não constassem todos os elementos necessários a uma decisão, sempre o Tribunal a quo deveria, em obediência ao estatuído no n.º 2 do artigo 661º do CPC...

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