Acórdão nº 1346/2008-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelMÁRCIA PORTELA
Data da Resolução20 de Novembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1. Relatório J intentou, na 1ª secção da 8ª Vara Cível de Lisboa, acção declarativa, com processo ordinário, contra J e mulher, I, tendo sido admitido como interveniente principal provocado, ao abrigo disposto no artigo 31° B CPC, o Condomínio do prédio com os n.°s 29, 31 e 33 da Rua , em Lisboa, pedindo a sua condenação a pagarem--lhe a quantia de Esc. 5 100 000$00, referente a 51 meses de renda, à razão de Esc. 100 000$00 mensais, e a proceder a obras que eliminem os factores que levam a que as águas do ralo escorram para o seu prédio e se infiltrem na parede da sua loja.

Alega para tanto, e em síntese, que é proprietário do prédio na Rua, em Lisboa, o qual integra uma loja, e que os RR. são proprietários de uma fracção autónoma no prédio contíguo ao seu, da qual faz parte integrante uma plataforma em cimento onde existe um ralo para escoamento de águas pluviais e de limpeza, parte das quais, por deficiência de construção ou entupimento do tubo, se infiltra na parede da sua loja.

Acrescenta que levou a cabo diversas obras que não lograram eliminar as infiltrações, que provocaram o aparecimento de salitre, queda de azulejos, deteriorações na pintura e manchas provenientes da humidade, e impediram o arrendamento da loja, que esteve devoluta desde Novembro de 1995 a Fevereiro de 2000 (inclusive), só a arrendando em princípios de 2000, por Esc. 100.000$00 mensais, depois de ter procedido por diversas vezes a diversas obras, designadamente a construção de uma parede falsa com um dreno. E que, não obstante, há cerca de um mês apareceram novamente sinais de infiltrações, manchas de humidade e os azulejos voltaram a cair, o que gerou reclamação da inquilina que no local instalou um cabeleireiro.

Contestaram os RR, excepcionando a sua ilegitimidade por preterição de litisconsórcio necessário passivo, por serem comproprietários da fracção, e que, além disso, a plataforma ou empena e o ralo instalado no saguão do prédio para escoamento das águas pluviais, constituem uma parte comum do prédio, pelo que deveria o A. ter demandado todos os condóminos. Impugnaram ainda os factos alegados pelo A., dizendo que, caso houvesse infiltrações, também a fracção "A" do prédio de que os RR. são condóminos teria problemas de infiltrações, o que não sucede; e que se a loja do A. sofre de infiltrações, tal facto tem origem nas obras defeituosas por si mandadas efectuar, na medida em que foi escavado o local junto à parede confinante com o prédio de que os RR. são condóminos, levando ao estreitamento das paredes.

Na sequência de requerimento do A., foi admitida a intervenção principal de J e mulher, A, comproprietários, e dos condóminos L, S. A., M, R, M e C.

A chamada L, S.A., contestou, invocando a sua ilegitimidade por ter cedido o gozo da fracção de que é proprietária, por contrato de locação financeira, a L, o único e exclusivo utilizador da referida fracção, por ser ele que, nos termos da lei, exerce os direitos do locador, comparecendo nas reuniões de condomínio e tratando directamente com a administração de todas as questões do condomínio A requerimento da chamada foi deferida a intervenção acessória provocada de L, que apresentou articulado dizendo que é o utilizador da fracção e que intervirá na qualidade de assistente.

Os chamados J e mulher, A, excepcionaram a sua ilegitimidade por terem entretanto vendido as suas quotas aos RR. J e mulher, I.

A chamada M disse ter adquirido a fracção, em 22 de Dezembro de 1999, a V e L, e que a 18 de Maio de 2001 a vendeu a F.

Foi admitida a intervenção principal provocada de V, L e F, a pedido do A..

A chamada F contestou invocando a prescrição.

O chamado R contestou alegando ter adquirido a fracção a 05 de Fevereiro de 2001 e desconhecer os factos alegados pelo A..

M, admitida a intervir na sequência de requerimento do A., por ser a anterior proprietária, invocou a prescrição.

Foi proferido despacho saneador (fls. 494-501) que julgou os RR. e o Condomínio do prédio com os n.°s 20, 31 e 33 da Rua , em Lisboa, devidamente representado pelos condóminos, partes legítimas, e improcedente a excepção de prescrição, fixando-se ainda factos matéria de facto relevante.

Requereu o A. a ampliação do pedido, pedindo que os RR. fossem condenados a realizar as obras de reparação na loja de que é proprietário, ampliação que não foi admitida por despacho de fls. 656-57.

Agravou o A. deste despacho, concluindo que, para que a ampliação do pedido seja possível, basta que a ampliação seja o desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, não sendo necessário qualquer outro requisito, designadamente que o pedido novo pedido não pudesse ter sido deduzido na petição inicial.

O despacho recorrido foi sustentado a fls. 772.

Após a realização de perícia, realizou-se o julgamento, com gravação da audiência, em que foi aditado um artigo à base instrutória, sob o nº 15.

Foi proferida sentença julgando improcedente a acção.

Inconformado, recorreu o A., apresentado alegações com as seguintes conclusões: « A. O A. pretende obter deste tribunal de recurso uma reapreciação da prova, alicerçada primeiramente na ponderação do próprio relatório pericial, na ponderação da prova testemunhal e no recurso a presunções judiciais.

B. Da prova pericial resulta que é possível e normal terem existido infiltrações no prédio do A. provindas deste terraço do prédios dos RR, que tais infiltrações podem muito bem ter ocorrido em virtude desse terraço ser a céu aberto (tipo saguão) com escorrência de águas pluviais através de um ralo.

C. Do relatório decorre que não foi possível detectar os vestígios das infiltrações por terem existido "obras de conservação no terraço", sendo que tais obras tiveram por efeito apagar os vestígios de quaisquer infiltrações havidas.

D. Resulta da experiência comum e do depoimento oral do perito que um terraço a céu aberto, que serve de cobertura a uma loja, onde existe um ralo de escoamento de águas e instalações sanitárias com respectiva canalização... por princípio, ao fim de algum tempo, provoca infiltrações no andar de baixo. É anormal que assim não seja.

E. Nos termos do artigo 349° do CC, o Tribunal recorrido deveria ter considerado a existência de um presunção: as águas infiltradas na propriedade do A. tiveram origem neste terraço.

F. Para o perito, as infiltrações de um terraço como este decorrem naturalmente. E de forma evidente.

G. Além disso ficou provado que na loja do A. foi realizada "uma parede, tipo pladur, que terá encoberto as eventuais anomalias que a parede meeira, entre os dois imóveis, do lado da loja 27, apresentava.", isto é, "a parede foi realizada para encobrir qualquer coisa": as infiltrações.

H. Resulta provado que o terraço dos RR foi reparado na sua função primeira de isolamento. Uma tela nova como revestimento, com rebordo a subir os muretes por forma a evitar infiltrações.

I. Do facto de terem existido obras de isolamento do terraço, decorre naturalmente, por presunção judicial, que antes dessas obras existiam infiltrações.

J. Parece por demais evidente ao A. que a matéria de facto daqueles quesitos 1 a 3° deveria poderia ser considerada provada, à luz do entendimento do que resulta da experiência comum.

L. Ainda que assim não fosse, a verdade é que os RR impediram, por sua acção, que hoje se verificasse a existência de infiltrações, o seu efeito, ou a sua cessação. Ao determinarem as acções dos RR uma dificuldade intransponível de prova pericial, naturalmente fazem inverter o ónus da prova.

M. Existe inversão do ónus da prova sempre que a contra-parte culposamente tenha tornado impossível a prova ao onerado, pelo que violou a sentença recorrida o disposto no artigo 344° do CC.

N. Existe, aliás, um relatório de 1998 que dá conta de infiltrações, com salitre, queda de azulejos, deteriorações diversas na pintura e azulejos. E que dá conta de que é o sistema de evacuação das águas do saguão que está na origem das referidas patologias.

O. A prova testemunhal confirma igualmente os factos que são fundamento do pedido. Em função da prova produzida, do recurso às presunções judiciais e, em qualquer caso, por cominação da inversão dos ónus da prova, a matéria dos artigos 1 a 6° da Base Instrutória deve ser considerada provada.

P. Por outro lado, também por recurso à mesma prova testemunhal, mormente o depoimento das três testemunhas referidas, por elas foi amplamente confirmado que a causa do encerramento da loja entre 1995 e 2000 eram as infiltrações provindas do terraço do prédio dos RR. Que o A. fez obras que incluíram a realização de uma parede falsa para tapar as infiltrações. Que incluíram também um dreno. Que o perito em 2006 diz que não pode ver por estar tapado com a tal parede, sendo necessário demolir a parede para verificar se o dreno lá está....Que o A. deu de arrendamento a loja após gastar dinheiro nestas obras de parede falsa + dreno. Se só então o A. arrendou o locado por só então o mesmo poder (fisicamente) se arrendado.

Q. A sentença recorrida desconsiderou a muita informação que o perito deu, o que as testemunhas disseram, aliás amplamente confirmado pela prova testemunhal, e recusou realizar presunções judiciais. Este tribunal de recurso, pode e deve fazê-las, tendo existido violação do disposto no artigo 349° e 351° do CC.

R. Segundo resulta da prova pericial seria anormal que este terraço não metesse água. Pela sua configuração antiga, hoje impensável. É conhecimento deste tribunal que os terraços a céu aberto... mormente os centenários (!) metem água.

S. Houve obras no terraço. O terraço, segundo o perito, "goza também da colocação de uma tela que por sinal até me pareceu bem implantada, formando meia cana, junto das paredes periféricas, facto que mostra um certo cuidado" T. Da posição assumida pelo tribunal a quo quanto à recusa de deitar mão das presunções judiciárias decorre um resultado injusto e não querido pela lei: como após a realização das obras no terraço passou a ser impossível provar que...

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