Acórdão nº 1485/08-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelISABEL ROCHA
Data da Resolução11 de Dezembro de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes que constituem a secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

I - RELATÓRIO A... Almeida e esposa, M... Antunes residentes no Campo das H... , Braga, instauraram, no Tribunal Judicial de Braga, a presente acção com processo sumário contra “I... & Filhos LDA”, pessoa colectiva número 5....., com sede no Campo das H... , freguesia da Sé Braga.

Para tanto alegam, em síntese, que: Por escritura pública foi constituída propriedade horizontal no prédio sito no Campo das H... da freguesia da Sé, em Braga, condicionada à venda de algumas das fracções autónomas que o compõem, venda essa que se veio a verificar.

Foram então constituídas quatro fracções autónomas, sendo partes comuns, para além do mais, um saguão sito no lado sul/poente do dito prédio, sobre o qual deitam directamente os compartimentos e janelas existentes nas fracções autónomas, destinados ao recebimento de luz natural e arejamento com ar puro; Os AA são donos de uma das fracções autónomas do dito prédio, mais concretamente a Fracção C. sita no segundo andar; As demais fracções são propriedade da Ré que arrendou uma delas, a fracção A, a M... Ataíde, que aí instalou um estabelecimento de restauração.

Foi instalada uma conduta de exaustão de fumos e vapores da cozinha do dito estabelecimento no saguão do prédio, que teve como consequência a diminuição, nesse local, de luz e ar e a emissão de ruídos, mau cheiro, vapores e fumos.

Tal situação torna inabitável a fracção dos AA, afectando o direito á integridade física e moral bem como o direito ao repouso e saúde das pessoas que ali vivem; Em Assembleia de condóminos foi aprovada apenas pela Ré, a convalidação da instalação do referido tubo de exaustão, realizada sem autorização dos condóminos, o que mereceu o voto contra do A marido; Tal deliberação é nula, porquanto afecta os identificados direitos e por se tratar de uma alteração do destino daquela parte comum do prédio, em benefício exclusivo de um condómino; Pedem, assim, que seja declarada nula ou anulada tal deliberação.

A Ré contestou, defendendo que a deliberação em causa é válida, porque salvaguardou o respeito pelos bens jurídicos invocados pelo autor, ao condiciona-la ao cumprimento de disposições legais e regulamentares, designadamente no que diz respeito à emissão de fumos, calor, cheiros e ruídos, devidamente isolados. Impugna ainda os factos alegados pelos AA, referindo que o saguão nunca serviu para entrada de ar por se encontrar coberto com uma clarabóia. Alega ainda que os AA actuaram com abuso de direito, uma vez que a dita instalação não prejudica os seus direitos de condómino e a sua pretensão limita as utilidades da fracção A.

Os AA apresentaram resposta, mantendo o alegado na petição inicial e impugnando os factos invocados na contestação.

Realizada tentativa de conciliação sem que tenha sido possível obter o acordo das partes, foi proferido despacho saneador tabelar e fixada a base instrutória, seleccionando-se a matéria de facto relevante para a decisão da causa, que mereceu reclamação por parte da Ré, que foi indeferida.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo. Foi proferida decisão sobre a matéria de facto, após o que se elaborou sentença que julgou procedente por provada a acção, declarando a nulidade da deliberação em causa nos autos ou, caso assim não se entenda, a anulação.

Inconformada, a Ré apelou da sentença, apresentando alegações que terminou com as seguintes conclusões: Deu a douta sentença como provado o seguinte facto: "A conduta causou uma redução de entrada de luz em percentagem não concretamente determinada mas não inferior a 4%, nem superior a 7% (resposta aos quesitos 9° e 100) ".

Ora, o único meio de prova produzido a este respeito foi a junção de uma peritagem respeitante a outro processo, cujo relatório pericial aponta para os 4%, não mencionando, de todo em todo, os 7%.

Por outro lado nenhuma prova testemunhal se referiu, sequer, á questão da quantificação da diminuição de luz e arejamento. Pelo que o Tribunal decidiu contra a única prova produzida.

Desta forma, a resposta aos quesitos em causa deveria merecer, antes, a seguinte resposta: "A conduta causou uma redução de entrada de luz em percentagem não concretamente determinada mas não inferior a 4%".

Deu a douta sentença como provado o seguinte facto: Na fracção situada no 2° andar, ouve-se algum ruído proveniente do equipamento instalado pela Ré, no estabelecimento de restaurante (resposta ao quesito 20°).

O equipamento não foi instalado pela Ré, mas pela arrendatária da fracção "A". Não foi produzida QUALQUER PROVA que apontasse no sentido de ter sido a Ré a instalar o equipamento. Alias, tal circunstância apresenta-se em contradição com as als. H), I) e J) da MFA, dos quais resulta expressamente ter o equipamento sido instalado pela arrendatária M... Ataíde.

Desta forma, o facto deverá dar-se como provado, antes, com a seguinte redacção: "Na fracção situada no 2° andar, ouve-se algum ruído proveniente do equipamento instalado pela arrendatária da Ré, no estabelecimento de restaurante".

De Direito: No essencial, a douta sentença recorrida declarou nula a deliberação da assembleia de condóminos que constitui o objecto do processo, por se ter alterado o fim do saguão, fundamentando, de forma lapidar, que "a sua execução altera o fim para o qual foi concebido o saguão - circulação de ar e entrada de luz. A introdução de uma tubagem transforma o espaço em chaminé" (II).

Segundo a matéria dada como provada, a afectação originária não foi suprimida tendo, apenas, sido instalado um tubo com um diâmetro de 315 mm (resposta ao quesito 7°), com uma redução de entrada de luz em percentagem não concretamente determinada, mas não inferior a 4%, nem superior a 7% (resposta ao quesito 9° e 10°). Mais se provou que o saguão referido na al. F) da MFA, tem uma área de 2,00 m2 (resposta ao quesito 5°) Tal matéria de facto nunca legitimaria a conclusão a que chegou a douta sentença recorrida, já que o saguão não viu suprimidas, nem séria, ou sensivelmente, diminuídas as suas utilidades de iluminação e arejamento. Pois, mesmo aceitando a quantificação dada como provada, sobra, na pior das hipóteses 93% de iluminação e do arejamento (100%- 7%).

Donde decorre, a saciedade, que não foi alterado o fim do saguão, mas, apenas, consentida uma inovação que, muito embora limite - de forma abstracta e pouco expressiva - aquelas utilidades, ainda assim elas subsistem de forma predominante, sendo, ainda, a afectação principal dos mesmos.

Mais a mais, o título constitutivo é omisso quanto à afectação do saguão.

Tal decisão viola o disposto nos arts. 1422° n.° 2 al. c) do CC e art. 1430° n.° 1 do mesmo diploma, já que não se verifica qualquer alteração da afectação do espaço em causa, que nem tampouco é definida no título constitutivo, além de limitar, de forma ilegal, os poderes de administração da assembleia de condóminos, a qual compete regular o uso das partes comuns e as inovações respectivas.

Sustenta a douta sentença recorrida, de forma subsidiária que, ainda que tal não se entenda (nulidade por alteração da afectação do espaço), é anulável, pois a deliberação não foi tomada por unanimidade.

Justifica tal posição, da seguinte forma: "Por outro lado, a execução do obra vai interferir na utilização que o Autor faz da fracção que lhe pertence, pois a construção já existente (a deliberação pretendia convalidar a obra executada) causa ruídos e liberta cheiros associados à preparação de refeições que se sentem num dos compartimentos da fracção, diminuindo a qualidade do ar e interfere com o sossego e tranquilidade".

Não há qualquer matéria provada nesse sentido: provou-se que "na fracção situada no 2° andar, ouve-se algum ruído proveniente do equipamento instalado pela Ré, no estabelecimento de restaurante (resposta ao quesito 20°). O termo "algum ruído" é vago e impreciso, não podendo servir de fundamentação à decisão (subsidiária) de anulação.

O ruído não chegou a ser quantificado, tendo a peritagem junto aos autos sido inconclusiva ("nota-se algum ruído"), por os Senhores Peritos terem declarado não possui os meios para a...

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