Acórdão nº 112/04.1TAFND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelESTEVES MARQUES
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Rec. nº 112/04.1TAFND.C1 Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Coimbra.

RELATÓRIO Em processo comum singular do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca do Fundão, por sentença de 01.11.07, foi, no que para a apreciação do presente recurso, decidido: - condenar o arguido J... pela prática de um crime de contrafacção, p. e p. pelo art.º 196.º do Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo D.L. 63/85, de 14 de Março, a uma pena de três meses de prisão, substituída por igual tempo de multa, e 120 dias de multa, à taxa diária de €9,00.

- condenar o arguido R..., pela prática de um crime de usurpação, p. e p. pelo art.º 195.º do Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo D.L. 63/85, de 14 de Março a uma pena de três meses de prisão, substituída por igual tempo de multa, e 120 dias de multa, à taxa diária de €10,00.

- condenar os referidos arguidos a pagar solidariamente à assistente C..., Lda., uma indemnização no valor de €4.000,00.

Inconformados, os arguidos interpuseram recurso da sentença, em cuja motivação produziram as seguintes conclusões: “1ª - A planta da assistente não é, pelas suas características concretas, subsumível à disciplina dos direitos de autor.

  1. - Na verdade, a planta não é original nem criativa, sendo, isso sim, um obra utilitária ou de destinação prática, sem qualquer componente estética referida, específica e concretamente, pelo Sr. Juiz (Vide acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 6 de Dezembro de 2002).

  2. - A planta é, por isso, uma obra de carácter exclusivamente técnico, "esquemas para a acção" (como é designada pelo Dr. Luiz Francisco Rebello), que se limitou a aplicar métodos e sistemas de natureza técnica, comuns a qualquer projecto arquitectónico respeitante à mesma tipologia de construção, por isso sem qualquer individualidade própria.

  3. - A haver ofendido no processo, o mesmo só podia ser o "A...", autor da planta da assistente.

  4. - De igual modo, o autor da planta da empresa do arguido R... é o gabinete “G...”, pelo que o arguido J... não podia ser condenado.

  5. - Face ao que antecede, devem os arguidos ser absolvidos porque a planta da assistente não é, em concreto, obra protegida, sendo certo que os crimes por que foram pronunciados pressupõem a existência de obras daquele tipo.

  6. - Independentemente das conclusões antecedentes, os pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28 e 30 da matéria de facto dada como provada foram erradamente julgados.

  7. - Devem, por isso, ser modificados no sentido de serem considerados não provados, com base na prova testemunhal transcrita e nos doc.s de fls. 484, 485, 492, 493, 494, 495, 496, 570 e 571 principalmente.

  8. - Com a alteração propugnada resulta que os pressupostos factuais que conduziram à condenação dos arguidos deixam de se verificar, o que conduz, de igual modo, à absolvição dos arguidos dos crimes por que foram pronunciados.

  9. - Tal modificação sempre seria imposta pela aplicação do princípio do ~in dúbio pro reo".

  10. - A sentença recorrida violou, designadamente, o artº 1°, nº 1 do Código dos Direitos de Autor, na medida em que considerou protegida uma obra que não reveste a característica de criação intelectual do domínio artístico, não passando de obra de carácter exclusivamente técnico, sem qualquer especificidade estética, portanto, fora do campo de acção da disciplina do direito de autor.

  11. - Violou, outrossim, o disposto no artº 196°, nº 1 do citado Diploma Legal, ao imputar à planta da assistente individualidade própria, que não possui e ao considerar que o arguido J... utilizou como sendo criação sua uma obra alheia, quando, na verdade, a ter existido qualquer cópia, o que não se concede, a mesma seria realizada pela “G...".

  12. - violou o disposto no artº 195º do mesmo diploma, porquanto, além do que já se disse mormente na conclusão 1ª, o arguido R... não utilizou a planta do assistente.

  13. - Violou, por último, o princípio do “ in dubio pro reo”.

    Juntaram dois pareceres, sendo um da autoria de Dr. Luiz Francisco Rebello e outro do Dr. Guerra da Mota.

    Igualmente a assistente interpôs recurso, concluindo pela seguinte forma: “ lª - A douta sentença recorrida faz correcta selecção e qualificação da matéria factual atinente à prática dos crimes por que os arguidos vinham acusados e foram condenados; e igualmente está isenta de censura a apreciação e condensação dos factos colhidos dos depoimentos de testemunhas na audiência; 2ª - Já, porém, na apreciação dos danos patrimoniais sofridos pela assistente em directo resultado dos factos criminosos dos arguidos, a douta sentença recorrida não extraiu as conclusões imperiosamente determinadas pelos factos que ela própria acolheu e seleccionou - porque considerou ocorrer "ausência de demonstração dos danos patrimoniais sentidos", apesar de estar em presença da prova de que a assistente teve de vender os seus andares abaixo dos preços que praticava no mercado e o mercado aceitara, precisamente porque os arguidos colocaram em venda andares aparentemente iguais aos dela mas conseguidos por eles mercê da usurpadora utilização do projecto concebido, elaborado e pago pela assistente; 3ª - A prova carreada para os autos e que a própria sentença recorrida valoriza e consagra, evidencia que as fracções do empreendimento da assistente construído a partir do projecto genuíno que desenvolveu e pagou a arquitectos foram vendidas ao preço unitário (valor aceite no mercado) de € 115.000,00 até ao período em que foi anunciada a venda de fracções aparentemente iguais pelos arguidos, em cima do projecto plagiador que assentou na cópia daquele; e ao valor depreciado de referência de € 100.000,00 após o anúncio do projecto copiado e usurpador; 4ª - Das quatro vendas, demonstradas pelas respectivas escrituras, que fez com sujeição a depreciação recebeu a assistente, não o preço espectável de € 460.000,00 (4 vezes € 115.000,00), mas o somatório real de € 405.000,00 - ou seja, sofreu o prejuízo global de € 55.000,00.

  14. - Assim, tal valor de € 55.000,00 traduz exactamente o montante dos danos patrimoniais efectivamente sofridos (e provados) pela depreciação das 4 fracções cujas vendas estão certificadas nos autos e que a assistente fez por preços que teve de reduzir em virtude de os arguidos terem logrado colocar no mercado andares aparentemente iguais mas conseguidos à custa da usurpação do projecto dela assistente e, por isso, com supressão dos custos de concepção e elaboração que eles arguidos ilicitamente pouparam à custa do dispêndio da assistente.

  15. - O facto criminoso da usurpação (culposo, portanto, para os efeitos da previsão do artigo 483º do Código Civil) foi causa directa e adequada do prejuízo que a assistente sofreu por ter de vender as fracções do seu empreendimento a preços abaixo do valor de mercado resultante do seu projecto genuíno, porque tal valor de mercado sofreu abaixamento de estalão pelo uso de projecto conseguido por mera cópia e, portanto, mercê de supressão dos custos normais que a assistente teve de suportar para desenvolver o projecto e de que os arguidos ilicitamente beneficiaram com a usurpação 7ª - A factualidade que a própria sentença recorrida considerou provada preenche, deste modo, a previsão do artigo 483º do Código Civil e os pressupostos e ditames dos artigos 562º e seguintes do mesmo código, impondo a declaração da obrigação de indemnizar nos arguidos - e a douta sentença recorrida, ao abster-se de fazer tal declaração e consequentemente condenar os arguidos a cumprirem tal obrigação na medida em que os indicados factos e contabilização a traduzem, fez errada interpretação e aplicação daqueles preceitos normativos, que assim ficaram violados.”.

    O Ministério Público interpôs também recurso, concluindo: “ 1. O direito de autor das plantas de arquitectura cabe às firmas, atelier A... e G..., uma vez que se está em presença de uma obra colectiva (art. 16°, nº 1, al. b) e 19°, nº 1, ambos do CDADC; 2. Por isso, não poderia o arguido J... arrogar-se o autor de tal obra, limitando-se o mesmo a assinar a planta de arquitectura na qualidade de técnico (quando muito...

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