Acórdão nº 08A3513 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelMOREIRA CAMILO
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Em acção com processo ordinário, intentada no Tribunal Judicial de Gondomar e depois remetida para as Varas Cíveis da Comarca do Porto, contra BB Portugal - Companhia de Seguros, S.A., BB, Lda, pediu a condenação da Ré no pagamento da quantia de 29.883,92 euros, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros legais até integral pagamento.

Fundamenta o seu pedido, em síntese, no facto de ter celebrado com a Ré um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional e de ter causado prejuízos a um cliente no âmbito da sua actividade, prejuízos de que o ressarciu em montante que a Ré, incumprindo o contratado, não lhe pagou até à data, não obstante ter sido interpelada para tal.

A Ré contestou, alegando, resumidamente, não ser responsável pelo pagamento à Autora da quantia por esta eventualmente paga ao seu cliente, por, a haver responsabilidade civil perante o cliente, esta responsabilidade não ser imputável à segurada, mas sim a um técnico oficial de contas, nos termos do art.º 6º dos Estatutos destes.

Conclui defendendo a total improcedência da acção.

Houve réplica.

A final, foi proferida sentença, segundo a qual a acção foi julgada parcialmente procedente, por provada, e, consequentemente, se condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 29.634,52, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Após recurso da Ré, foi, no Tribunal da Relação do Porto, proferido acórdão a julgar improcedente a apelação, confirmando-se, consequentemente, a sentença recorrida.

Ainda inconformada, veio a Ré interpor o presente recurso de revista, o qual foi admitido.

A recorrente apresentou alegações, formulando as seguintes conclusões: 1ª - As funções dos Técnicos de Contas são de natureza pessoal, não delegáveis na sociedade recorrida, nem susceptíveis de exercício legal por esta.

  1. - O Técnico Oficial de Contas responde «pessoal e directamente» (nº 2 do art. 7º do ECTOC) pelos seus actos e respectivas consequências.

  2. - Por convenção validamente celebrada entre a recorrida e a sua cliente DD «a responsabilidade pela contabilidade é assumida pelo Sr.CC, Técnico Oficial de Contas, inscrito na Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, sob o nº 40238».

  3. - A lei exige ao TOC um seguro, de carácter obrigatório (ao invés do seguro da recorrida que é meramente facultativo), destinado a responder em caso de responsabilidade do TOC no exercício das suas funções específicas, actividades essas que o TOC obrigatoriamente faz acompanhar da respectiva - e legal - vinheta, cujo uso está vedado à recorrida.

  4. - Ao mencionar «trabalhadores no exercício da sua actividade profissional», a apólice em causa remete para a disciplina jurídica das relações laborais, bem como para o art. 500º do Cód. Civil, sendo que tais «trabalhadores» podem ser entendidos como «auxiliares» da entidade tomadora do seguro, enquanto dependentes dela e na medida em que a actividade económica da entidade aqui recorrida «é inseparável da do seu pessoal auxiliar - o qual não representa mais do que simples instrumento para a realização daquela actividade».

  5. - Nenhum TOC - Técnico Oficial de Contas - consta do contrato de seguro invocado ou foi indicado à recorrente pela entidade tomadora do seguro, aqui recorrida.

  6. - A recorrente não pode segurar por uma apólice de responsabilidade civil (geral e de carácter facultativo) a responsabilidade civil profissional do TOC, sujeita a seguro obrigatório, por força do disposto nos artigos 123º, 13), e 129º do Dec-Lei nº 94-B/98, de 17 de Abril.

  7. - «O espírito do disposto no artº 800º, nº 1, do Cód. Civil, é o de manter a responsabilidade civil do devedor para com o seu credor pelos actos praticados, seja de forma negligente, seja dolosa ou mesmo de carácter criminal, pelo seu auxiliar, aquando do cumprimento da obrigação do mesmo devedor, desde que consistentes no próprio exercício de funções destinadas a esse cumprimento ou com ele intimamente relacionados, em consequência sujeitos a orientação, fiscalização ou vigilância deste".

  8. - «Para tal responsabilidade existir, terá de se tratar de actos que o devedor auxiliado tivesse possibilidade de dirigir ou fiscalizar e que, mediante adequada vigilância sobre a actuação do auxiliar, poderia evitar».

  9. - Ainda que se pudesse conceber que o TOC agiu como «auxiliar» da recorrida - o que não se concede -, resultando responsabilidade da recorrida, tal responsabilidade deve considerar-se excluída pelo contrato celebrado entre a recorrida e a DD, do qual consta uma convenção de exclusão de responsabilidade da recorrida por actos do TOC em causa, convenção esta validamente celebrada e que cabe na previsão dos artigos 800º, nº 2, e 809º in fine, ambos do Código Civil, uma vez que o TOC agiu, como legalmente exigido, com autonomia e independência relativamente à recorrida.

  10. - Tendo o TOC agido com total autonomia e independência sob o ponto de vista técnico, legal e profissional, sem subordinação à recorrida, esta não é responsável pelos actos daquele.

  11. - Ainda que assim se não entenda, não agindo o TOC de forma subordinada face à recorrida, não sendo «trabalhador» da mesma, a eventual responsabilidade emergente da acção do TOC não se mostra transferida para a recorrente pelo contrato de seguro invocado.

  12. - O acórdão objecto do presente recurso violou, nomeadamente, as normas dos arts. 405º, 800º, nºs 1 e 2, 809º in fine, do Cód. Civil, bem como o disposto no Decreto-Lei nº 452/99, de 05/11, no nº 4 do art. 52º (ECTOC), nº 1, al. b), e nº 2 do art. 7º (ECTOC), dos arts. 123º, 13), e 129º do Dec.Lei nº 94-B/98, de 17 de Abril, do art. 53º, nºs 1,7 e 8, do Código do IRC, bem como o disposto...

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