Acórdão nº 08A2653 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução02 de Dezembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

RelatórioNo Tribunal judicial da comarca de Sintra AA, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB alegando em fundamento:-1- Por contrato de 7/1/2002 a Ré prometeu vender à A. e esta prometeu comprar, a fracção autónoma designada pelas letras "CT", corres.......Rua de Timor, n.º ....... Queluz; -2- O preço convencionado foi de 18.500.000$00, tendo a A. entregue a título de sinal a quantia de 10.474,76 €, devendo o resto do preço ser pago na data da escritura, a celebrar no prazo de 120 dias, com possibilidade de prorrogação por mais 30 dias; -3- Em 8 de Março de 2002, por aditamento ao citado contrato, foi admitida a prorrogação do prazo por mais 30 dias e foi entregue pela A., como reforço do sinal e princípio de pagamento, a quantia de 24.940,00 €, tendo sido acordado que, caso não fosse possível à ora A. marcar a escritura naquele prazo, ficaria a mesma obrigada a pagar juros de 2% sobre o capital em dívida; -4- Competia à A. marcar a respectiva escritura e avisar a Ré, com a antecedência mínima de 15 dias da data, hora e cartório notarial onde seria outorgada; -5- A Ré comprometeu-se a entregar toda a documentação necessária à efectivação da escritura e registos provisórios, se houver lugar, de imediato.

-6- Em Junho de 2002 a A. tomou conhecimento da existência de uma hipoteca e de uma penhora incidentes sobre a fracção em causa, tendo então acordado verbalmente com a Ré que a escritura apenas seria marcada quando fosse efectuado a distrate da hipoteca e o levantamento da penhora, o que a Ré não fez; -7- De resto a Ré não entregou a documentação necessária à celebração da escritura, declarando, através da carta de 21/11/2002, além do mais, ter perdido o interesse na celebração do contrato prometido.

-8- A A. tinha recebido uma carta da Ré, datada de 15/10/2002, onde esta lhe comunicava que tendo expirado o prazo para marcar a escritura, lhe concedia o prazo suplementar de 5 dias para o efeito, findo o qual, sem que seja marcada a escritura, deixaria de estar interessada na celebração do negócio, considerando-o definitivamente incumprido por culpa única da A.

-9- Todavia, não enviou os documentos necessários, e nada disse em relação à penhora existente sobre a fracção.

Termina formulando os seguintes pedidos a- que seja emitida sentença que substitua a declaração negocial em falta, isto é, que declare ter a A. adquirido por compra e venda e pelo preço de 92.277,61€ a fracção autónoma em casa; b- que, nos termos do disposto no n.º 4 do Art. 830 do C.C. seja a Ré condenada a entregar a importância necessária para expurgar a hipoteca e penhora que recaem sobre a fracção prometida vender ...

c- Em alternativa, que seja a Ré condenada a restituir à A. as quantias recebidas a título de sinal, em dobro (70.829,52) em consequência do incumprimento ... + juros desde a citação.

Citada a Ré contestou.

No essencial e resumidamente alega: - nunca se comprometeu a proceder ao distrate da hipoteca e ao levantamento da penhora em data anterior à da celebração da escritura; - Entregou na agência de imediação imobiliária, logo em Fevereiro de 2002, a documentação necessária à celebração da escritura; - Foi o A. quem desconsiderou os prazos contratualmente estabelecidos; - A dívida à C.G.D. foi atempadamente liquidada, além do que, no limite, podia fazê-lo no momento da escritura; - Assim, face ao incumprimento da A. assiste-lhe o direito de fazer suas as quantias entregues pela A. a título de sinal.

- Pede a condenação da A. como litigante de má-fé.

A A. replicou.

Proferiu-se despacho saneador, fixaram-se os factos assentes e organizou-se a base instrutória.

Instruídos os autos realizou-se a audiência de discussão e julgamento, e, lida a decisão sobre a matéria de facto, elaborou-se sentença final que decidiu: "... julgo improcedente o pedido de execução específica ... julgando parcialmente procedente o pedido de restituição das quantias entregues, condenando-se a Ré a pagar à A. a quantia de 11.804,92€ ..., acrescida dos juros de mora, à taxa legal, desde a presente data ...".

  1. e Ré intentaram recurso de apelação da referida sentença final.

A Relação apreciando os recursos, alterou diversos pontos de facto que tinham sido impugnados nas apelações e afinal, julgou improcedente a apelação da A.

julgou procedente a apelação da Ré e em consequência revogou a sentença recorrida, absolvendo a Ré dos pedidos.

Inconformada recorre a A. agora de revista e para este S.T.J..

Conclusões Oferecidas tempestivas alegações formulou a recorrente as seguintes conclusões:Nestes termos e em conclusão: 1. O presente recurso tem como fim reapreciar o Acórdão proferido pela Relação de Lisboa que julgou a acção improcedente, por considerar que ambas as partes se encontram em mora.

  1. Dos factos considerados assentes resulta em termos sumários que as partes outorgaram um contrato promessa de compra e venda, tendo resultado para a promitente compradora, ora recorrente a obrigação de marcar a escritura no prazo de 120 dias, 3. e para a promitente vendedora a obrigação de entregar a documentação necessária para essa marcação bem como a obrigação de vender a fracção prometida livre de ónus e encargos.

  2. Em 8 de Março de 2002 as partes celebram um aditamento ao referido contrato promessa, onde a Promitente compradora reforçou o sinal entregando a quantia de 24.940.00€, tendo também sido inserida uma cláusula que caso não fosse possível à promitente compradora marca a escritura naquele prazo, ficaria a mesma obrigada a pagar juros de 2% sobre o capital em divida.

  3. Ficou provado que a autora (promitente compradora) não marcou a escritura no prazo de 120 dias constante no contrato promessa.

  4. E a partir deste facto o Acórdão recorrido conclui erradamente que a autora incumpriu o contrato em causa entrando em mora a partir de então.

  5. È deste entendimento que a recorrente discorda, por entender que a autora não entrou em mora, isto é, apesar de não marcar a escritura dentro do prazo dos 120 dias, tal facto não implicaria o retardamento do cumprimento do seu dever de marcar o dia e hora da escritura no cartório Notarial, como vamos infra demonstrar.

  6. O único fundamento que a Relação aponta para colocar a Autora numa situação de mora é por ter entendido que a documentação para a marcação da escritura se encontrar disponível na agência imobiliária, não concretizando desde que data e até que data esses documentos ai se encontravam disponíveis para serem entregues à autora.

  7. Na verdade tal conclusão não encontra fundamento nem na matéria de facto assente nem resulta do texto escrito que as partes celebraram e aos quais nós temos que reportar, como bem salienta o Acórdão recorrido.

  8. Do texto dos documentos escritos apenas e tão só consta que à promitente vendedora competia facultar toda a documentação necessária à escritura e proceder ao levantamento dos ónus e encargos que incidiam sobre o prédio prometido vender, 11. Enquanto à promitente compradora competia diligenciar na marcação de dia e hora para a escritura pública.

  9. Em parte alguma dos documentos escritos resulta que a documentação seria levantada na imobiliária ou seria esta que facultava os mesmos à autora.

  10. Daí que seja incorrecto concluir que a documentação estava disponível na imobiliária e que a autora poderia lá ir buscá-los, como fez a Relação em manifesto contradição com a factualidade provada.

  11. Pois se aceitarmos, ao arrepio da prova, que o dever da Ré, de entregar a documentação foi cumprido, porque esses documentos estavam na imobiliária, teríamos que dizer também, 15. que o dever da autora de marcar dia e hora para a escritura também foi cumprido porque seria a mesma agência a diligenciar por essa marcação.

  12. Conclusão que não se aceita em virtude do contrato - promessa (que vincula ambas as partes) e que os deveres resultantes dos mesmos, sejam tratados de forma desigual quer se trata da Ré quer se trate da autora.

  13. O que na realidade existe é um contrato que vincula as partes sem intervenção de terceiros, 18. Mas a Relação entendeu que a obrigação da autora em marcar a escritura não foi cumprido, e que o dever de entregar a documentação pela R. o foi, simplesmente porque a autora teria de localizar (quer junto da Ré quer da imobiliária) esses documentos para assim marcar a escritura.

  14. Entendimento incorrecto face à prova assente que deverá ser revisto, porque aceitar essa conclusão equivaleria a dizer que sobre a autora incumbia, também, o dever de obter a documentação, ao arrepio do que foi clausulado 20. Ora para a autora poder marcar a escritura seria sempre necessário que, previamente, à marcação desse acto a Ré lhe entregasse toda a documentação, cumprido assim o seu dever.

  15. Houve mora por parte da R. em virtude desta não ter apresentado a documentação necessária à marcação da escritura, apesar de ultrapassado o prazo fixado no contrato.

  16. Pois para a realização e marcação da escritura que competia à autora era necessário a R. lhe entregar os documentos que não entregou.

  17. Sendo certo que o prazo previsto no contrato para a celebração do contrato prometido pode revestir um prazo absoluto, cujo decurso determina o imediato incumprimento definitivo ou um prazo fixo relativo, determinante da situação de mora.

  18. Em relação a esta questão entendeu a Relação e bem que estaríamos perante um prazo fixo relativo, na medida em que as partes estabelecerem um limite temporal para o cumprimento, tal limite não traduz uma imediata perde de interesse negocial, aceitando-se que a prestação será ainda possível - (situação de mero atraso).

  19. Não obstante a possibilidade de resolução convertida que seja a mora em incumprimento definitivo.

  20. Como já se disse a Relação conclui tratar-se de um prazo de natureza relativo, com o qual concordamos e por isso não impeditivo da realização da escritura após o seu decurso.

  21. Mas dir-se-á como foi acordado no contrato que competia à autora marcar a data da escritura, não tendo esta sido feita...

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