Acórdão nº 02791/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelLUCAS MARTINS
Data da Resolução18 de Março de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

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, com os sinais dos autos, inconformado com a decisão proferida pelo Mm.º juiz do TAF de Lisboa que lhe julgou improcedentes estes embargos de terceiro que deduziu contra a penhora realizada no âmbito de execução fiscal e incidente sobre fracção autónoma, identificada na sentença recorrida, dela veio interpor o presente recurso apresentando, para o efeito, as seguintes conclusões: IO art. 286.º, n.º 2, do CPPT estatui que "Os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos".

IIAfigura-se que, in casu, o efeito meramente devolutivo é de molde a afectar o efeito útil deste recurso.

IIIO efeito meramente devolutivo permite que a execução fiscal prossiga os seus termos até final, independentemente da pendência deste recurso.

IVAssim, se o Recorrente vier a obter vencimento no presente Recurso, com o consequente levantamento e cancelamento da penhora em apreço, o efeito útil deste recurso ter-se-á, então, esvaído por completo.

VPelo que, deverá ser determinado que o presente recurso tenha efeito suspensivo, com todas as legais consequências.

VINestes autos de Embargos de Terceiro, como bem afirma o M.mo Juiz a quo, «a questão a decidir consiste em apurar se o Embargante é possuidor do imóvel identificado em 11. do probatório, e penhorado nos autos de execução de que os presentes embargos constituem incidente, e em caso afirmativo, se tal posse, prevalece sobre a penhora que onera a fracção, e se o direito de retenção, enquanto direito real de garantia, é susceptível de defesa através de embargos de terceiro.».

VIIÉ perfeita e totalmente legítima a posição do Embargante no sentido de afirmar que é possuidor do imóvel em apreço desde meados de 1987, altura em que ali passou a residir com o seu agregado familiar (cfr. ponto 4 dos factos provados), o que fez de forma pública, pacífica e de boa-fé.

VIIISendo certo que as chaves daquele imóvel foram entregues ao Recorrente pelo Executado e na sequência da celebração do Contrato-Promessa de Compra e Venda a que se alude no ponto 1. dos factos provados, para que o Recorrente e respectiva família ali passassem a residir, o que estes fizeram, de modo estável e ininterrupto, desde então.

IXMais, o Recorrente fez as necessárias reparações no imóvel e suportou o pagamento das respectivas despesas de condomínio.

XAfirma-se na douta sentença recorrida que, «o pagamento de despesas com o condomínio e o exercício do cargo de administrador do mesmo, não são suficientes para conferir o animus possidendi, já que, é facto público e notório que qualquer mero detentor pode suportar tais despesas e exercer tal cargo».

XIEsta afirmação ignora, por completo, o disposto no n.º 1 do art. 1424.º do CC, onde se diz que "..., as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos ...", sendo que "cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício" (art. 142.º, n.º 1, do CC).

XIIAssim, só os condóminos são responsáveis pelo pagamento das despesas do respectivo condomínio, sendo que o condómino é proprietário de uma (ou mais) fracção autónoma que compõe um determinado edifício (cfr. art. 1414.º do CC).

XIIIMotivo pelo qual não pode o administrador de um condomínio exigir de outras pessoas que não dos proprietários das respectivas fracções autónomas, maxime de meros detentores dessas mesmas fracções autónomas, o pagamento das despesas de condomínio.

XIVDiferentemente do que se passa quanto a este aspecto, no tocante ao exercício do cargo de administrador do condomínio, o regime legal vigente já possibilita a intervenção de terceiros, uma vez que permite que esse cargo seja desempenhado tanto por um dos condóminos, como por terceiro (cfr. art. 1435.º, n.º 4, 1ª parte, do CC).

XVNão se alcança que a celebração do propalado Contrato de Arrendamento tenha tido a virtualidade de destruir os efeitos do referenciado Contrato-Promessa de Compra e Venda.

XVIPois, não ficou provado que aquele Contrato-Promessa de Compra e Venda haja sido objecto de revogação, tácita ou expressa, pelas partes contratantes.

XVIINem, tão pouco, ficou demonstrado que, com a subsequente celebração do dito Contrato de Arrendamento, essas mesmas partes hajam pretendido modificar as suas reais posições quer de facto, quer judiciais.

XVIIIAliás, não faria sentido que fosse de outra forma, pois quem subscreve um Contrato- -Promessa de Compra e Venda de um imóvel, paga 80% do preço estipulado, obtém a tradição desse imóvel, aí passa a residir com a sua família, efectua e paga obras de reparação e paga as despesas do respectivo condomínio, não se vai, posteriormente, confinar à posição de mero arrendatário.

XIXE, muito menos, se compreenderia que essa mesma pessoa instaurasse acção judicial fundada em incumprimento daquele Contrato-Promessa de Compra e Venda, como fez o Recorrente, e nela obtivesse vencimento.

XXPelo que a realidade e as regras da experiência comum impõem que se olhe para a celebração daquele Contrato de Arrendamento como uma forma que as partes encontraram para acautelar ainda mais a posição do promitente- comprador naquele Contrato-Promessa de Compra e Venda, ou seja, do Recorrente.

XXIA não se entender dessa forma, sempre a realidade e as regras da experiência comum, aliadas à existência da dita acção judicial, obrigariam a que, nesta sede, tivessem sido apuradas as concretas e reais razões e motivações que estiveram subjacentes à celebração daquele Contrato de Arrendamento.

XXIIFoi por efeito directo da celebração daquele Contrato-Promessa de Compra e Venda que o Executado entregou ao Recorrente as chaves da referida fracção autónoma e que, consequentemente, o Recorrente ali passou a residir, de forma estável e ininterrupta, com o seu agregado familiar, ali fazendo o centro da sua vida económica e social, desde meados de 1987.

XXIII Mais, por douta sentença transitada em julgado - proferida no âmbito do processo que, sob o n.º 3220/1991, correu termos pela 1.ª Secção do 3.º Juízo Cível (actualmente 3.ª Vara Cível) do Porto (cfr. doc. n.º 1 junto com a Reclamação de Créditos apresentada no processo de Execução Fiscal de que estes Embargos de Terceiro constituem incidente) -, ao Recorrente foi reconhecido o direito de retenção sobre o imóvel em apreço nestes autos, pelo crédito resultante do não cumprimento do aludido Contrato-Promessa de Compra e Venda imputável ao Executado, a coberto do disposto no art. 755.º, n.º 1. al. f), do CC.

XXIVAssim, não se aceita que o Recorrente não haja provado que usou «o imóvel em nome próprio, como se de verdadeiro proprietário se tratasse, isto é, que tenha praticado actos correspondentes ao exercício do direito de propriedade.».

XXVNão se aceitando, igualmente, quer que o Recorrente haja deixado de ter a posição de promitente-comprador da fracção autónoma em referência, passando a ter a posição de locatário da mesma, quer que a celebração do dito Contrato de Arrendamento, nestas concretas circunstâncias, haja feito «claudicar qualquer interesse de [o Recorrente] agir como se de verdadeiro proprietário se tratasse.».

XXVIPerante o quadro factual apurado, é inequívoco que o Recorrente tem agido, não como um mero detentor, um possuidor precário, mas, sim, como um verdadeiro possuidor, usando a fracção autónoma em apreço como coisa sua propriedade, o que faz desde meados de 1987.

XXVIIPelo que a posse invocada pelo Recorrente radica em momento anterior à penhora - que, in casu, ocorreu em 22.03.1991 (ponto 1. dos factos...

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