Acórdão nº 03667/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelRui Pereira
Data da Resolução13 de Março de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO Inês ...

, com os sinais dos autos, interpôs no TAF de Ponta Delgada uma acção administrativa especial contra o Município de Vila do ...

, pedindo a declaração de nulidade de deliberação da Câmara do réu que indeferiu licenciamento de obra de reconstrução de prédio que requereu ou, sem prescindir, a sua anulação, bem como a condenação do réu a deferir aquela sua pretensão.

Por sentença datada de 14-12-2007 foi a referida acção julgada procedente e, em consequência, anulada a deliberação e ordenada a sua substituição "por outra na qual se considere que a obra requerida respeita o disposto no artigo 68º do PDM de Vila do ...

".

Inconformada com tal decisão, veio o Município de Vila do ... recorrer jurisdicionalmente para este TCA Sul, tendo na respectiva alegação formulado as seguintes conclusões: "

  1. A matéria de facto considerada assente no que respeita ao estado da edificação, tendo por base a prova documental existente no processo administrativo deve ser corrigida nos seguintes termos: "à data da entrada em vigor do PDM de Vila do ... a edificação anteriormente existente no prédio estava em ruínas, apenas se mantendo uns pequenos muros cobertos de vegetação".

  2. A interpretação segundo a qual a "os trabalhos de manutenção de muros e edificações existentes" referida no nº 1 do artigo 68º do regulamento do PDM de Vila do ... não comporta a reconstrução é a única possível sem forçar a letra da lei atento o imperativo do artigo 9º, nº 2 do Código Civil, nos termos do qual não é legítima a interpretação que não tenha um mínimo de correspondência no texto.

  3. Tratando-se de norma secundária deve ser interpretado conforme a lei verificando-se se tal não for possível a ilegalidade do regulamento.

  4. Os artigos 60º do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro, e 117º, nº 4 do DL nº 380/99, de 22 de Setembro, que estabelecem a garantia de existência apenas abrange as edificações existentes à data da sua entrada em vigor.

  5. A edificação em causa nos autos já não existia à data da entrada em vigor do Regulamento do PDM de Vila do ... e por isso não é abrangida pela referida garantia de existência.

  6. Aliás, sendo hoje unanimemente admitido que o direito de propriedade não engloba o direito a construir e tendo o princípio da garantia da existência por base o direito de propriedade constitucionalmente reconhecido bem se compreende que aquela garantia apenas proteja as construções existentes à data da vigência das novas regras.

  7. O artigo 68º, nº 1 do regulamento do PDM, no que respeita às edificações que não existiam à data da sua entrada em vigor está conforme os diplomas legais citados, não sofrendo de qualquer ilegalidade.

  8. Por isso, a deliberação impugnada não padece de qualquer vício, designadamente o de violação de lei.

  9. Decidindo em contrário violou a douta decisão recorrida o mencionado artigo 68º, nº 1 do regulamento do PDM de Vila do ..., e o artigo 60º do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro, os quais devem ser interpretados conforme se pugna nas presentes alegações".

A recorrida contra-alegou, pugnando pelo improvimento do recurso [cfr. fls. 162/170 dos autos].

Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para julgamento.

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida deu como assente a seguinte factualidade: i.

    A autora é proprietária de um prédio urbano sito no ..., concelho de Vila do ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº .....

    ii.

    Em 2-11-2006, a autora entregou na Câmara do réu um projecto de conservação e restauro de habitação no referido prédio.

    iii.

    Em reunião desta de 30-3-2007, foi deliberado indeferir tal "pedido de licenciamento para as obras de reconstrução de uma moradia, sita no lugar denominado São Lourenço, freguesia de Santa Bárbara, concelho de Vila do ..., uma vez que a zona onde se situa o pedido de licenciamento é definida no Plano Director Municipal como Espaço Natural e, em conformidade com as disposições do artigo 68º do Regulamento do PDM, apenas são permitidas, naquele espaço, obras de manutenção de muros e edificações e pinturas exteriores das edificações existentes, desde que não introduzam alterações cromáticas ou de textura.

    A edificação que consta dos documentos registrais e fiscais está reduzida a ruínas e, por isso, a obra cujo licenciamento se requer não se enquadra no conceito de manutenção, antes configurando uma reconstrução.

    Dadas as restrições previstas no artigo 68º do regulamento do PDM, a reconstrução não pode ser licenciada, quer por não estar incluída entre as actividades urbanísticas permitidas para o local, quer por contender com as proibições constantes das alíneas a) e c) do nº 3 do artigo 68º do Regulamento do PDM".

    iv.

    Actualmente, da construção originária existente no prédio, apenas se mantêm parte das paredes.

    v.

    O projecto em causa visa a construção de edificação idêntica à que nele existia, antes da sua ruína.

  2. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Vejamos, pois, se assiste razão à entidade recorrente nas críticas que aponta à sentença recorrida, começando pela questão da [aparente] desconformidade entre a matéria de facto que foi dada como assente na sentença e a que resulta da prova documental existente no processo administrativo, não sem antes deixar expresso que o dito processo administrativo não acompanhou os presentes autos quando estes subiram em recurso.

    Parece-nos, porém, não se afigurar necessária a confrontação entre os documentos constantes do processo administrativo para concluir que a matéria de facto dada como assente na sentença recorrida carece de correcção.

    Com efeito, a sentença recorrida considerou assente que "actualmente, da construção originária existente no prédio, apenas se mantêm parte das paredes [...] e que o projecto em causa visa a construção de edificação idêntica à que nele existia, antes da sua ruína", sendo que, ao invés, a entidade recorrente defende a respectiva correcção, de forma a ficar consignado que "à data da entrada em vigor do PDM de Vila do ... a edificação anteriormente existente no prédio estava em ruínas, apenas se mantendo uns pequenos muros cobertos de vegetação".

    Em nosso entender, a matéria de facto dada como assente não carece ser corrigida, já que a realidade que se pretendeu ter por demonstrada é, no essencial, a mesma, para além de não ser susceptível de influir na determinação do regime jurídico aplicável ao caso.

    Procuremos demonstrá-lo.

    A sentença recorrida claramente reconheceu que o prédio relativamente ao qual a entidade recorrente indeferiu um projecto de conservação e restauro de habitação apresentado pela autora [e aqui recorrida] se encontra em ruínas, e que actualmente, da construção originária existente no prédio, apenas se mantêm parte das paredes [cfr. pontos iv. e v. da matéria de facto dada como assente].

    Por seu turno, sustenta a entidade recorrente que o que deveria ter sido dado como assente - porque resultante da prova documental existente no processo administrativo - é...

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