Acórdão nº 0867/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Março de 2009
Magistrado Responsável | RUI BOTELHO |
Data da Resolução | 19 de Março de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A...
, com melhor identificação nos autos, veio interpor recurso do acórdão da 1.ª Subsecção desta Secção, de 12.3.08, que julgou improcedente a acção administrativa especial que apresentou neste Tribunal contra o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) visando a impugnação da sua deliberação de 14.3.07 (tirada no seguimento de impugnação administrativa), que converteu em processo disciplinar o inquérito que contra ele tinha sido instaurado.
Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: 1. O autor propôs acção administrativa especial para obtenção de nulidade ou anulação da decisão de converter em processo disciplinar o inquérito relativo ao magistrado investigado; 2. Apresentou reclamação dessa decisão, alegando prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar; 3. Todavia a deliberação, de 19/07/2006, do CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, reunido em plenário, foi a de converter o inquérito em processo disciplinar; 4. Reclamou hierarquicamente dessa deliberação, invocando prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar fundando-se na jurisprudência firmada pelo STA, nomeadamente nos seus Acórdãos 033172, de 21/09/2000, 0633/02, de 03/12/2003; 5. Ao que acresce, agora, o Acórdão de 01/03/2007, proferido no Processo 0205/06 do STA; 6. A prescrição pode ser declarada ex oficio, é invocável por qualquer interessado e é insanável pelo decurso do tempo (cfr. Cód. Civil, artºs 298°, 303°, 304°); 7. Todavia, o CSMP, reunido em plenário, deliberou negar provimento à reclamação apresentada, quanto à prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar; 8. E fê-lo com data de 14 de Março de 2007 (data do Acórdão); 9. Porém, o despacho do STA foi proferido posteriormente, a 29 de Março de 2007; 10. Então, a Reclamação, sempre deu origem à última palavra da Administração Pública, antes de o STA sentenciar finalmente sobre a prescrição do procedimento disciplinar; 11. Logo o indispensável pressuposto processual da inimpugnabilidade do acto impugnado deixou de verificar-se e o processo pôde prosseguir seus trâmites de harmonia com o dispositivo do n.° 2 do art.º 89°, do CPTA; 12. A teoria da recepção é uma regra de ouro especialmente no que respeita a expediente endereçado a tribunal, a entidades públicas ou privadas. E está consagrada no artigo 224° do CC, quanto ao negócio jurídico, bastando que a declaração seja colocada ao alcance do destinatário; 13. O Supremo Tribunal Administrativo jurisprudência que "quando a notícia da infracção contenha elementos suficientes para conhecer a significação anti-jurídico disciplinar dos factos o prazo de três meses conta-se a partir do recebimento da denúncia pelo dirigente máximo do serviço"; 14. Independentemente da duplicidade de dirigente máximo do serviço para os termos do artigo 4°, n.° 2, do DL n.° 24/84, de 16/1, a Lei n.° 60/98, de 27/08 comina ao Procurador-Geral da República, entre outros, os poderes de presidir à Procuradoria Geral da República, instaurar processos disciplinares aos seus magistrados, exercer acção disciplinar, pois é ele o órgão superior do Ministério Público que exerce a sua competência disciplinar (...) por intermédio do CSMP ao qual preside [cfr. Lei n.° 60/98, de 27/08, art.ºs 12°, n.° 1, al.ª a), 9°, n.ºs 1, 2 e al.ª b), 12.º, n.° 1, al.ªs c), f), 15, n.º 1]; 15. Vem sucessivamente o CSMP por intermédio do qual o Procurador-Geral da República exerce a sua competência disciplinar, CSMP este que pode deliberar a conversão dum processo de inquérito em processo disciplinar, como consta do artigo 214.° da Lei n.° 60/98, de 27/08; 16. Contudo, nunca o autor demandou Procurador-Geral da República ou sequer o chamou à lide. Outrossim, sempre impugnou a deliberação CSMP que só veio a ser proferida a 19/07/2006, mais de três meses depois de os autos de inquérito terem dado entrada nos serviços da PGR (o que ocorreu em 6/3/2006)].
17. O que ocorreu foi tão só o seguinte: o autor citou na sua peça um acórdão do STA onde a matéria da competência disciplinar está muito bem exposta. E fê-lo por facilidade de raciocínio e exposição, bem como por ser um acórdão emitido e conhecido por esse STA. Mas sempre quis formular uma proposta direccionada ao CSMP, pois é a entidade demandada; 18. Por outro lado, é possível afirmar que o CSMP, enquanto órgão colegial, tomou conhecimento da falta antes do fim dos três meses [previstos do artigo 4°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 24/84, de 16/1, aplicável subsidiariamente aos Magistrados do M.P., ex vi do EMP (Lei n.° 60/98, de 27/08)], e, por isso mesmo, antes da data em que sobre ela se debruçou; 19. Efectivamente, após a conclusão do inquérito, a sua recepção nos serviços do CSMP, deu-se em 6/03/2006. Logo, foi a partir de 6 de Março, que esse Conselho conheceu, ou tinha obrigação de conhecer a falta (veja-se, vg., art.º 66.°, n.º 2 do EDFAACRL), sendo a partir dessa data que começou a correr o prazo de prescrição em causa; 20. Todavia o CSMP, reunido em Plenário, só tomou a deliberação de converter o inquérito, em processo disciplinar, em 19 de Julho de 2006, decorridos mais de 3 meses; 21. Acresce que, "as reuniões do Conselho Superior do Ministério Público têm lugar, ordinariamente, de dois em dois meses e, extraordinariamente, sempre que convocadas" (...), tal como comanda o artigo 28.°, n.° 1, do EMP (Lei n.° 60/98, de 27/08); 22. Ora, consta do BOLETIM INFORMATIVO N° 82 do CSMP que: "O Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) reuniu no dia 15 de Março em Plenário e em secções: Secção Disciplinar e com as 1.ª e 2.ª Secções de Classificação." Na Acta deste BOLETIM INFORMATIVO consta "Na Secção Disciplinar foram adiados 5 pontos" (cfr. A SESSÃO EM RETROSPECTIVA, 4); 23. Poucos dias após a recepção do inquérito. E, apesar desta reunião não atribuiu qualquer relevância ao inquérito já recebido, deixando mesmo a partir daqui transcorrer mais de 4 meses; 24. Logo, após a conclusão do inquérito e a sua recepção nos serviços concernentes ao CSMP, em 6 de Março de 2006, este órgão reuniu em SESSÃO PLENÁRIA pelo menos quatro vezes (dentro do prazo de três meses): 15 de Março de 2006, 3 de Maio de 2006, 17 de Maio de 2006, 6 de Junho de 2006, "presidida pelo Conselheiro Procurador-Geral da República" [cfr. Lei n.° 60/98, de 27/08, art.º 12° n.° 1, al. c)].
25. Basta verificar os BOLETINS INFORMATIVOS n.ºs 82, 83, 84, 85 in http://www.pgr.pt/ para saber que assim é; 26. Todavia, só decorrido mais de 3 meses, pela deliberação de 19/07/2006, o CSMP, converteu o inquérito, em processo disciplinar, ficando a constituir a sua parte instrutória (cfr. Bol. Inf. n.° 87); 27. Torna-se, assim evidente que a inércia do CSMP durante esses mais de três radicou num juízo atributivo de irrelevância disciplinar aos factos participados; 28. Já que, à data em que veio a ser proferida aquela deliberação (19 de Julho de 2006), se mostra transcrito o prazo abreviado de prescrição estabelecido no art.º 4.°, n.° 2 do EDFAACRL; 29. Pois, foi, na verdade, a partir da referida data de 6 de Março, em que o CSMP conheceu, ou tinha obrigação de conhecer a falta que começou a correr o prazo de prescrição em causa; 30. Ou, no mínimo, a partir da reunião referida na conclusão 22.ª.
31. Com efeito, por violação das normas contidas, pelo menos, nos artigos 29.°, n.° 4, da CRP, 4°, n.° 2, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Pública (DL n.° 24/84, de 16/01), 216° do Estatuto do Ministério Público (Lei n.° 60/98, de 27/08), 224°, 298°, 303°, 304° do CC, deve ser declarada a nulidade ou anulação da deliberação de converter em processo disciplinar o inquérito relativo ao magistrado investigado, por PRESCRICÃO DO DIREITO DE INSTAURAR PROCEDIMENTO DISCIPLINAR. E revogado o acórdão ora em recurso por estar em desarmonia com Acórdão de 01/03/2007, proferido no rec. 0205/06, por esse STA.
O CSMP contra-alegou, concluindo que: 1. Impõe o artigo 144.º do CPTA A ENUNCIAÇÃO, no requerimento de interposição do recurso jurisdicional, dos VÍCIOS IMPUTADOS À DECISÃO RECORRIDA.
2. A ÚNICA REFERÊNCIA que lhe é feita consta das três últimas linhas do requerimento de recurso onde vem pedida A SUA REVOGAÇÃO por "...
estar em desarmonia com o Acórdão de 13 de Março de 2007 proferido no processo 205/06". Por isso, 3. Deve ser ordenado o cumprimento do disposto no artigo 146.º n.º 4 do CPTA. Por outro lado, 4. O pedido expresso de REVOGAÇÃO do douto Acórdão que julgou improcedente a Acção fundado na sua desarmonia com pronúncia anterior que enfrentou questão idêntica com oposta decisão configura o RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA previsto nos artigos 152° e seguintes do CPTA, para cuja admissão não se encontram reunidos os respectivos pressupostos. SEM PRESCINDIR 5. SÓ O CSMP PODE TRANSFORMAR INQUÉRITOS EM PROCESSOS DISCIPLINARES: artigo 214° do EMP. Assim 6. É irrelevante a intervenção do Sr. Procurador Geral da República entre a data da recepção do inquérito nos serviços da Procuradoria Geral da República e a data da sua conversão em processo disciplinar para os efeitos do artigo 4º nº 2 do ED.
7. O termo inicial do prazo de três meses contemplado na norma em causa é contemporâneo da aquisição, pelo CSMP, do conhecimento da falta, EM REUNIÃO PARA CUJA SESSÃO HAJA SIDO INCLUÍDO EM TABELA A APRECIAÇÃO DA PROPOSTA QUE ULTIMOU O INQUÉRITO.
8. Na situação em presença o CSMP terá tomado conhecimento da falta na reunião de 11/07/2006 e converteu o inquérito em processo disciplinar em 19 de Julho de 2006. Por isso, 9. Não se mostra transcrito o prazo de três meses previsto no artigo 4° nº 2 do ED. Consequentemente, 10. NÃO PRESCREVEU O DIREITO DE INSTAURAR PROCEDIMENTO DISCIPLINAR. Por isso 11. O JULGAMENTO operado pela douta decisão recorrida NÃO MERECE CENSURA.
Cumpre decidir.
II Factos O acórdão recorrido deu por assente a seguinte matéria de facto:
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O autor, que é...
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