Acórdão nº 0997/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Fevereiro de 2009

Data19 Fevereiro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A..., veio interpor recurso jurisdicional do acórdão da 1.ª Subsecção, de fls. 1.205 e ss., que negou provimento ao recurso contencioso que deduzira do despacho de 27/2/2003, em que o Secretário de Estado das Obras Públicas (SEOP), na sequência do inquérito ao acidente ocorrido durante a construção de um certo viaduto, aplicou à recorrente multas contratuais no montante global de 85.361,70 euros.

O recorrente terminou a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões (consigna-se que se corrige o erro de numeração das três últimas): 1 - O acórdão recorrido carece de fundamentação de facto, na medida em que não se encontram descritos quaisquer factos que permitam fundamentar a decisão de aplicação de multas contratuais ao abrigo do disposto na cláusula 78ª do contrato de concessão.

2 - O que se encontra no acórdão recorrido é a descrição de factos que fundamentariam uma eventual responsabilidade por prejuízos causados, pelos quais a recorrente (eventualmente) responderia nos termos da lei geral, ex vi cláusulas 76ª e 77ª do referido contrato de concessão.

3 - A verdade é que o tribunal a quo labora numa confusão entre o que, por um lado, seria a responsabilidade pelos prejuízos causados pelo exercício das actividades que constituem a concessão ou pelo desenvolvimento de tais actividades por entidades por si contratadas, e, por outro lado, o que poderia configurar responsabilidade pelo incumprimento ou cumprimento defeituoso dos deveres e obrigações emergentes do contrato de concessão.

4 - Sem prescindir, falta de fundamentação do acórdão recorrido está patente ainda num outro aspecto: o tribunal a quo limita-se a concluir que a recorrente não logrou infirmar o conteúdo e conclusões do relatório, sem, contudo, especificar em que medida ficou a recorrente aquém de tal infirmação com os factos por si alegados.

5 - Mais, não se encontra apontada uma causa para o acidente cientificamente verificada e demonstrada, apenas se enunciando no acórdão de que se recorre inúmeras causas para aquele acidente (provavelmente tantas quantas o instrutor se lembraria, desde que fisicamente possíveis).

6 - Por tudo o exposto, a decisão do tribunal a quo carece de especificação dos respectivos fundamentos de facto e de direito, sendo por isso nula, nos termos do artigo 668°, n°1, alínea b) do CPC.

7 - No que respeita ao disposto nas cláusulas 33.2 e 95.2, cumpre sublinhar que se trata de obrigações e deveres contratuais, cuja violação não se encontra demonstrada pelos factos especificados pelo acórdão recorrido.

8 - Tanto uma como outra cláusula estabelecem obrigações da concessionária e não um dever de fiscalização do respeito de tais obrigações relativamente a terceiro.

9 - Deste modo, dever-se-á, em primeiro lugar, concluir que não cabe na previsão das cláusulas alegadamente violadas a obrigação da concessionária fiscalizar "a verticalidade das torres do cimbre, da qualidade do aço utilizado, da colocação dos tubos de ligação longitudinal das torres e dos projectos de implementação de métodos construtivos".

10 - Pelo que a aplicação de multas contratuais com aquele fundamento e ao abrigo da cláusula 78ª com base em tal violação é ilegal.

11 - Por outro lado (e sempre sem prescindir), se porventura se admitisse que o teor daquelas cláusulas se reconduzisse a um dever de fiscalização, como pretende fazer crer o tribunal a quo, o seu cumprimento verificou-se, desde logo, com a celebração do contrato de fiscalização identificado no ponto 4 dos factos considerados provados e com interesse para a decisão da causa (fls. 4 do acórdão recorrido).

12 - A "falta, insuficiência ou deficiência de fiscalização por parte da empresa ..." seria, nesse caso, fundamento para assacar a responsabilidade da aqui recorrente ao abrigo das já referidas cláusulas 76ª e 77ª, e nunca da cláusula 78ª, o que equivale a dizer para assacar a responsabilidade nos termos da lei geral e não através da aplicação de multas contratuais.

13 - Ainda sem prescindir, se se admitir que o teor daquelas cláusulas envolve um dever de fiscalização relativamente ao cumprimento das obrigações que decorrem das cláusulas contratuais 33.2 e 95.2, sempre se deveriam ter as mesmas por cumpridas.

14 - Não restam dúvidas de que, na medida em que promoveu e exigiu de todas as entidades contratadas para o desenvolvimento de actividades integradas na concessão o cumprimento das normas legais e contratuais aplicáveis, a recorrente cumpriu o dever previsto na cláusula 95.2 do contrato de concessão.

15 - Do relatório em causa, que fundamenta o acto recorrido (e agora o acórdão de que recorre), não resulta esclarecida qualquer relação directa entre uma causa do acidente e a violação de um dever contratual por parte da recorrente.

16 - Do relatório do IEP e dos restantes relatórios que lhe serviram de base, não decorrem fundamentos directos ou indirectos para a aplicação da multa contratual por alegado incumprimento da cláusula 95.2, pois que não foram realizados quaisquer ensaios de campo para avaliar o grau de compactação do material de fundação das torres e a rigidez do conjunto do material de fundação das torres com o solo de fundação.

17 - Ou seja, as conclusões do relatório final, também no que respeita à compressibilidade do material, à sensibilidade ao teor de humidade e aos assentamentos (matéria que integraria a cláusula 95.2), carecem de fundamentação de facto, dada a falta de rigor analítico.

18 - De tudo quanto exposto, a aplicação da multa contratual por violação da cláusula 95.2. do contrato de concessão é ilegal, na medida em que a...

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