Acórdão nº 0522/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 2ª Subsecção da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A..., com os sinais dos autos, interpõe recurso do saneador/sentença, proferido pelo Mmo juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, que julgou procedente a excepção de prescrição do direito que a Autora, ora recorrente, pretendia fazer valer com a presente acção declarativa ordinária e absolveu do pedido a Ré B....

Termina as suas alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A. O pedido indemnizatório formulado pela A. encontra-se expressamente fundado nos termos do artº18º do Código das Expropriações aprovado pela Lei nº168/99, de 18-09 e do artº25º do Dec. Lei nº59/99, de 02.03, enquanto todas as demais normas invocadas nos artº31º a 33º da P.I. - às quais não é feita menção no petitório - claramente se destinam apenas a reforçar ( caso do artº62º, nº2 da CRP, do artº1310º do CC e do artº9º do Dec. Lei nº 48051 de 21.11.1967) o sentido da prescrição emergente das disposições normativas sobre as quais a A erigiu a sua causa de pedir, bem como a explicitar o modo como deverá operar tal prescrição indemnizatória ( caso dos artº562º e 564º do CC).

B. O princípio que todas essas normas afirmam é o da responsabilidade do Estado e demais pessoas colectivas públicas ou as que ajam para colaborar na prossecução do interesse público (caso dos empreiteiros ou concessionários de obras públicas) pela indemnização dos prejuízos causados pela ocupação temporária de prédios particulares, em benefício desse mesmo interesse público, independentemente do carácter ilícito dos factos geradores desse dever indemnizatório.

C. Desde há muito que é ponto assente na doutrina e jurisprudência que a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas é a obrigação indemnizatória emergente da verificação cumulativa dos pressupostos: facto ilícito, culpa, dano e causalidade entre o facto e o dano. Outra realidade, a que o legislador dispensou um regime distinto, é a da responsabilidade civil do Estado e demais pessoas colectivas públicas pelos encargos ou prejuízos especiais e anormais, causados mediante a prática de actos administrativos legais ou actos materiais lícitos. Ora, em nenhum momento o Autor mencionou qualquer espécie de acto ilícito, perpetrado pela R., de que resultasse o crédito indemnizatório que peticiona.

D. Tanto o artº71º, nº2 da LPTA, como o artº 498º, nº1 do CC não devem ser considerados aplicáveis ao caso de responsabilidade civil por acto lícito suscitado nestes autos, ao qual deve antes ser aplicado o mesmo regime prescricional vigente para o direito indemnizatório emergente da expropriação por utilidade pública, por ser o próprio do condicionalismo específico em que se desenvolveram as relações entre as partes.

E. O mesmo regime legal a que recorreu o douto Despacho recorrido (o do Código das Expropriações) para determinar a competência do Mmo. Tribunal a quo para conhecer da relação controvertida, não pode deixar de ser o que se aplicará para a determinação do regime aplicável a essa mesma relação, designadamente quanto à prescrição dos direitos dela emergentes, que deverá ocorrer no prazo geral de 20 anos.

F. A origem fáctica do direito indemnizatório da A. não ocorreu durante todo o ano de 1998, durante o qual a execução dos trabalhos a cargo da R esteve inviabilizada, em função da realização da Expo'98, vindo a despontar entre os anos de 1999 e 2000, ao longo dos quais se estenderam as conversações das Partes, com vista à solução do diferendo e que acabaram por cessar sem sucesso. Por isso, em Setembro de 2002, data em que foi interposta a presente acção, não tinha expirado um prazo de 3 anos sobre o ano de 2000, em que definitivamente se constatou a indisponibilidade da R. para proceder às medidas compensatórias que haviam sido acordadas.

Nestes termos e nos demais de direito cujo douto suprimento de V.Eª se espera e invoca, requer-se que seja revogado o douto despacho saneador/sentença recorrido, por violação do disposto no artº18º do CE aprovado pela Lei nº168/99 de 18.09 e do artº 25º do DL 59/99, de 02.03 e erro de aplicação do artº71º, nº2 da LPTA e artº498º, nº1 do CC, ordenando-se a prossecução dos autos até final, para conhecimento da causa.

*Contra-alegou a recorrida B..., CONCLUINDO assim: A. A responsabilidade indemnizatória, no nosso ordenamento jurídico apenas poderá ser extracontratual ou contratual, consoante a fonte jurídica de onde essa responsabilidade dimana.

B. Tendo em conta que a Recorrente peticiona indemnização por prejuízos derivados da ocupação temporária de terrenos da sua propriedade - nos termos do artigo 18º do Código das Expropriações - resulta evidente que a fonte do direito a que a Recorrente se arroga, não assenta em nenhum negócio jurídico.

C. O artigo 18º do Código das Expropriações não cria qualquer regime distinto de responsabilidade civil, antes remetendo expressamente para os " termos gerais do direito" a regulamentação eventualmente devida, o mesmo sucedendo com o artº25º do Decreto-Lei nº59/99, de 02.03 que, igualmente, remete para os "termos da lei" a regulação de eventuais indemnizações devidas pela ocupação temporária de prédios particulares.

D. Pelo que, e como bem decidido pelo tribunal a quo, o caso dos autos tem que ser analisado e decidido à luz do regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual.

E. Sendo aplicável o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, consagrado no Decreto nº48051, de 21 de Novembro de 1967, o prazo de prescrição do direito invocado pela Recorrente será o prazo constante do artº498º do Código Civil, mercê da remissão imposta pelo nº2 do artº71º da LPTA.

F. O prazo de prescrição constante do artº498º do Código Civil é extensível a todas as formas de responsabilidade extracontratual do Estado e das pessoas colectivas públicas, pela aplicação do nº2 do artº71º da LPTA.

G. A Recorrida não celebrou qualquer acordo no qual estivesse obrigada a quaisquer trabalhos de modulação e de relocalização e ampliação do Colector Principal de Drenagem da Plataforma de Beirolas, tendo cumprido todas as obrigações assumidas, designadamente a de devolução dos terrenos em condições de serem utilizados para os fins da Expo'98.

H. Para efeitos de aplicação do artº 498º, nº1 do Código Civil, entende-se que existe conhecimento do direito à indemnização a partir do momento em que o lesado esteja ciente dos pressupostos que se encontram reunidos e que justificam o seu direito.

  1. Foi em finais de 1997 e início de 1998, aquando da devolução dos terrenos ocupados pela Recorrida que se iniciou a contagem do prazo de prescrição de 3 anos previsto no citado artº 498º, nº1 do Código Civil.

J. Nenhuma inviabilidade existiu, decorrente da realização da EXPO'98, para a realização de trabalhos nos terrenos em causa, uma vez que as instalações da exposição distavam mais de 1000 metros e as pretensas conversações invocadas pela Recorrente são insusceptíveis de diferir o início da contagem de tal prazo de prescrição de 3 anos.

K. Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis que o Tribunal doutamente suprirá, deve negar-se provimento ao presente recurso e manter-se a decisão recorrida, com as necessárias consequências legais.

*O Digno Magistrado do MP emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, face ao alegado na Conclusão C das respectivas alegações, uma vez que a Autora assentou a acção em responsabilidade fundada em acto lícito - nº2 do artº9º do DL 48.051 e artº18º do Cód. das Expropriações, devendo os autos baixar à 1ª Instância a fim de prosseguirem.

Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

*II- FUNDAMENTAÇÃO No saneador/sentença, ora sob recurso, o Mmo. Juiz identificou três questões prévias suscitadas pela Ré, na contestação, a incompetência material do tribunal (i) a prescrição do direito invocado pela autora (ii) e o abuso de direito (iii), tendo julgado improcedente a primeira, procedente a segunda e prejudicada a terceira.

Só a Autora veio interpor recurso do saneador/sentença, circunscrito à questão da prescrição do seu direito.

Portanto, é essa a única questão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT