Acórdão nº 0852/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelANGELINA DOMINGUES
Data da Resolução28 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na secção do contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. D... (id. a fls. 2) interpôs, no TAC de Coimbra, acção de responsabilidade civil extracontratual, contra o Hospital de B..., pedindo a respectiva condenação na indemnização de quarenta milhões e quatrocentos e cinquenta e dois mil e noventa e um escudos (40.452.091$00), a título de reparação por danos materiais e morais sofridos, em consequência de acto/s ilícito/s e culposo/s da Instituição Ré e dos respectivos agentes.

1.2. Por sentença do T. Administrativo de Círculo de Coimbra, proferida a fls. 545 e segs, foi julgada parcialmente procedente a acção e condenado o Hospital Réu no pagamento de uma indemnização ao Autor, no montante de 110.756,66 €.

1.3. O médico C..., chamado nos autos após incidente de intervenção provocada deduzido pelo Réu Hospital de B..., interpôs recurso da decisão do TAC de Coimbra, o mesmo sucedendo com o Hospital de B... e com o Autor.

1.4. O Hospital de B... apresentou as alegações de fls. 602 e segs, que concluiu do seguinte modo: "1. A sentença não teve qualquer tipo de preocupação em julgar de acordo com juízos de equidade.

  1. Ao condenar da forma como condenou, sem atender a juízos de equidade, violou a sentença os comandos legais dos artigos 494.°, 496.° e 566.° do Código Civil.

  2. É manifestamente exagerada a quantia de € 100.000 fixada a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais.

  3. Deverá assim a referida sentença ser substituída por outra que obedecendo aos juízos de equidade julgue em conformidade." 1.5. O médico C... alegou pela forma constante de fls. 620 e segs, concluindo: "1. O MM° Juiz ao considerar para efeitos de indemnização por danos não patrimoniais as "dores intensas" sofridas pelo A., desconsiderou o facto provado, de o A. ter também sofrido dores físicas em consequência de 7 intervenções cirúrgicas efectuadas pelo alegante.

  4. No "pretium doloris", ressarcimento tendencial da dor física, o tribunal a quo deveria ter ponderado essa circunstância, o que, não tendo sido feito, acaba por traduzir uma condenação por danos morais que não foram causados em concreto pela intervenção cirúrgica concretizada pelo alegante no Hospital de B....

  5. Verifica-se uma clara violação dos pressupostos da responsabilidade extra contratual: facto, ilicitude do facto, culpa, dano e nexo de causalidade.

  6. Nem o Réu pode ser condenado a título de danos morais no que diz respeito ao ressarcimento da dor física global sofrida pelo Autor, nem o alegante poderá ver exercido eventual direito de regresso por parte do Hospital de B... no que diz respeito ao ressarcimento dessa dor global 5. O julgador aplicou de forma incorrecta o disposto nos artigos 2° n° 1 e 4° do DL 48 051, e 483°, 494°, 496° e 563° do CC, atenta a factualidade provada, (artigo 690° n° 2 a) e b) do CPC) e a sentença pode mesmo padecer de nulidade. (artigo 668° n° 1 c) do CPC) 6. A indemnização fixada pelo tribunal a quo, para ressarcimento dos danos morais alegados pelo A., parece-nos, salvo elevado respeito, atendendo às circunstâncias obrigatoriamente ponderáveis para uma fixação equitativa, manifestamente excessiva, considerando os factos provados e a actuação do alegante que em nenhum momento traduziu dolo.

  7. A sentença padece de uma incorrecta aplicação do disposto nos artigos 496º n° 3 e 494° do CC.

  8. O presente deve proceder, e, em consequência, deve a sentença ser revogada e substituída por outra que reduza, pelos motivos expostos, a indemnização fixada para os danos morais, e relativamente à qual o Réu poderá vir a exercer eventual direito de regresso sobre o ora alegante, assim se fazendo JUSTIÇA." 1.6. O Autor apresentou as alegações de fls. 627 e segs, que concluiu do seguinte modo: "1 - Na douta sentença ora recorrida deu-se como provado que o A. exercia a actividade profissional de técnico de máquinas de costura, por conta própria, em estabelecimento comercial que possuía, e, consequentemente, que o fazia de forma lucrativa, gerando com essa actividade proveitos e rendimentos.

    2 - O facto de não ter sido dado como provado que tais proveitos e rendimentos ascendiam ao montante peticionado pelo A. na p.i., significa que, do exercício de tal actividade profissional, não provinham quaisquer rendimentos, significando apenas que o montante destes não foi apurado.

    3 - Na douta sentença de que ora se recorre não foram apurados elementos que permitam, efectivamente, fixar o quantitativo desta parte do pedido efectuado pelo A. na p.i.

    4 - De acordo com a jurisprudência existente na matéria, a aplicabilidade do disposto no art. 661 n° 2 do C.P.C. não depende da formulação de um pedido genérico.

    5- De acordo com o referido art., não dispondo o Meritíssimo Juiz "a quo" de elementos que lhe permitissem apurar o montante dos rendimentos que o A. deixou de auferir desde a data do internamento até à decisão final, deveria ter relegado para a execução de sentença o apuramento do mesmo.

    6 - O A. não teria de ter feito um pedido genérico para que o Meritíssimo Juiz "a quo" pudesse recorrer a tal mecanismo legal.

    7 - Decidindo como decidiu, a douta sentença recorrida violou o disposto no art. 661 n° 2 do C.P.C." 1.7. O Autor apresentou ainda as contra-alegações de fls. 649 e segs, que concluiu de forma seguinte: "1-As dores físicas sofridas pelo A. em consequência das 7 intervenções cirúrgicas subsequentes à efectuada pelo R., ainda que não tenham sido realizadas por este, foram consequência directa e necessária da sua conduta negligente.

    2-Assim, tais dores devem ser consideradas para efeito do "pretium doloris", e imputadas ao R. a título de danos não patrimoniais, globalmente consideramos.

    3-Apesar de a conduta do alegante não consubstanciar dolo, mas somente mera culpa, a verdade é que, face à gravidade da sua conduta, à sua situação económica, à situação económica do lesado e, sobretudo, às consequências gravíssimas que a conduta negligente do alegante teve na saúde e na própria vida futura do lesado, o quantitativo indemnizatório fixado não é de modo nenhum excessivo 4-e nem viola nem as regras da equidade, nem qualquer disposição legal na matéria.

    5-Não padecendo a douta sentença de qualquer nulidade." 1.8. A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o parecer de fls. 665, de seguinte teor: "Recursos interpostos pelo Hospital de B.... E.P.E. e C... Somos de parecer que a fixação de € 100.000 como ressarcimento dos danos não patrimoniais não se afigura exagerada.

    A sentença teve em consideração o grau e culpa verificado, a intensidade das dores sofridas pelo A. em consequência quer da cirurgia inicial quer das cirurgias subsequentes a que teve que se submeter, o desgosto e a depressão por se ter visto «de um momento para o outro completamente incapacitado e dependente, devido à degradação do seu estado de saúde», bem como as restantes circunstâncias, havendo ainda que ter presente que o R. é uma Entidade Pública Empresarial cuja totalidade do capital estatutário é detida pelo Estado.

    Pelo que, não se encontram violadas as regras da equidade.

    Devendo ser negado provimento ao recurso.

    Recurso interposto pelo Autor Somos de parecer que o mesmo deverá merecer provimento pelos fundamentos que se encontrava aduzidos e que acompanhamos, sento certo que a atribuição da indemnização de € 10.000 pela «perda do exercício da sua profissão», é merecedora de alguma critica pela sua exiguidade, devendo esta matéria considerar-se abrangida pela amplitude da conclusão n° 2." 1.9. Por acórdão proferido a fls. 669 e segs, foram ouvidas as partes sob a plausibilidade de não se tomar conhecimento do recurso interposto pelo Réu C..., por ser de admitir a possibilidade de o mesmo ser considerado parte ilegítima.

    1.10. O Hospital de B... e o médico C..., pronunciaram-se no sentido da legitimidade deste Recorrente.

  9. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    2.1. A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos (que, para comodidade de remissões, ora se subsumem a números): 1)"O Autor, D..., nasceu no dia 19 de Dezembro de 1933 - cfr. teor da certidão de nascimento que constitui fls. 11 dos autos - Alínea A) dos Factos Assentes.

    2) O A. exercia as funções de técnico de máquinas de costura, desde há mais de 30 anos, por conta própria, em estabelecimento comercial, sito na Rua do ..., ..., Leiria - Alínea B) dos Factos Assentes.

    3) No dia 29-01-98, o A. deu entrada na urgência do Hospital de B..., em Leiria, queixando-se de dores intensas ao nível da...

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