Acórdão nº 01186/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução22 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.

Relatório C..., devidamente identificada nos autos, recorreu do acórdão proferido na 1ª Subsecção deste Supremo Tribunal Administrativo, na ACÇÃO ORDINÁRIA que moveu contra o MUNICÍPIO DE OEIRAS, com fundamento em oposição de julgados.

Terminou (em síntese) as alegações com as seguintes conclusões: - no acórdão recorrido, completado pelo acórdão de 6-3-2008, que indeferiu a sua aclaração, veio a dar-se razão ao Município de Oeiras, revogando-se a sentença do TAF de Lisboa e decidindo-se que "dado o seu silêncio quanto às circunstâncias que envolveram o acidente, a factualidade provada não esclarece se o passeio ou caminho por onde a recorrida transitava e a caixa ou buraco onde ela caiu ofereciam perigos detectáveis - de modo que agora se pudesse concluir que o então recorrente violara a sua obrigação de os remover ou sinalizar ou, pelo menos, que sobre ele impendia a presunção de culpa contemplada no art. 493º do Código Civil, tendo o referido acórdão de 6-3-2008 especificado que o acórdão de 4-10-2007 é expresso e claríssimo no sentido de que o exacto local onde a autora caiu podia ser indiferentemente designado "in genere" como "buraco" (de manilha), ou "in specie" como "caixa de saneamento".

Ao decidir como decidiu o acórdão recorrido encontra-se em oposição com o decidido nos acórdãos fundamento do STA de 6-10-1993/recurso 32217; de 1-2-2000/recurso 45250 e de 14-3-2002/recurso 48115, já transitados em julgado.

(1ª oposição) Com efeito, o acórdão recorrido considerou que a recorrida transitava por um passeio e que caiu numa caixa ou buraco, podendo o exacto local ser indiferentemente designado "in genere" como "buraco" (de manilha), ou "in specie" como "caixa de saneamento".

Por seu lado, no acórdão fundamento de 6-10-1993/recurso 32217 discutiu-se uma queda ocasionada pela existência de um buraco no passeio, que não se encontrava sinalizado, tendo a autora enfiado um dos pés no aludido buraco e caído.

Tendo este acórdão fundamento decidido que, provado que a autora deu uma queda ocasionada por um buraco existente no passeio, onde ela enfiou um pé, esta factualidade é suficiente para permitir ao julgador decidir, como decidiu, que o acidente se ficou a dever ao mau estado do passeio e ao buraco aí existente, sem o que a autora, na ocasião, não teria sofrido o desequilíbrio e a consequente queda causadora dos danos físicos, não se tornando necessário provar dimensões e configuração desse buraco para o considerar adequado à produção daquele evento e concluir pela existência de responsabilidade civil extracontratual.

Ora, sendo que a berma da estrada faz parte da via, a situação fáctica de ambos os acórdãos é idêntica, pois, assim sendo, em ambos os casos está em causa a queda de um peão num buraco existente no passeio, que não se encontrava sinalizado, tendo ambos os acórdãos sido proferidos no domínio da mesma legislação, ou seja, na vigência das leis indicadas quanto ao dever de os entes públicos manterem em segurança e bom estado de conservação os passeios sob sua jurisdição e de vigiar e de sinalizar as obras e obstáculos de modo a evitar acidentes e dos artigos 493º, n.º 1 e 563º do C. Civil.

No entanto, enquanto que o acórdão fundamento decidiu favoravelmente o pedido de indemnização, considerando que não se torna necessário provar as dimensões e configuração desse buraco para o considerar adequado à produção do dano, o acórdão recorrido perfilhou solução oposta, indeferindo tal pedido por considerar que a factualidade provada não permite a atribuição de perigosidade ao buraco/caixa de saneamento onde a recorrida caiu, não tendo por isso a Câmara Municipal o dever objectivo de cuidado, diligência ou vigilância.

(2ª oposição) O acórdão recorrido está ainda em oposição com o acórdão fundamento de 1-2-2000/recurso 45250, no segmento em que este acórdão decidiu que o auto de notícia relativo a um acidente de viação, faz fê sobre os factos presenciados pelo autuante, admitindo prova em contrário, porque o acórdão recorrido não considerou o auto de notícia levantado pelo, que presenciou os factos e descreve detalhadamente o local do acidente e a situação e configurações da caixa de saneamento em que a recorrente caiu, e devia tê-lo considerado, se necessário.

(3ª oposição) O acórdão recorrido está em oposição com o acórdão fundamento de 14-3-2002/recurso 48115, no qual se decidiu que a JAE (actualmente EP - Estradas de Portugal) agiu ilicitamente e com culpa, ao conceber e executar, juntamente com os trabalhos de reconstrução de uma estrada e junto a ela uma caixa de saneamento de águas pluviais, feita em cimento e sem qualquer protecção, resguardo ou sinalização, dando origem a que uma pessoa que caminhava de regresso a casa lá fosse cair, vindo a morrer, estribando-se este acórdão, nomeadamente, em que "em circunstâncias normais (...) não existem locais específicos onde o cidadão tenha de andar, e sobre toda a comunidade incide o dever geral de respeito por essa liberdade de deslocação, assim, como o de respeitar a sua integridade física".

Respondeu o Município de Oeiras, sublinhando que as alegações de recurso não continham conclusões e que não se encontram verificados os pressupostos para admissão do recurso de oposição, devendo o mesmo ser indeferido.

O Ex.mo Procurador Geral Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de não se verificar a alegada oposição de acórdãos.

A recorrente foi convidada a apresentar conclusões, o que fez.

Colhidos os vistos legais foi o acórdão submetido ao Pleno da Secção para julgamento da questão preliminar a que alude o art. 766º, 1 do C. P. Civil, na redacção anterior à reforma de 1995.

  1. Fundamentação 2.1.

    Matéria de facto A matéria de facto dada como assente em cada um dos acórdãos foi a seguinte: 2.1.1.

    Acórdão recorrido "Da Especificação: 1 - A A. foi tratada a uma ferida interna tíbio-társica da perna esquerda e região infra-rotuliana, na urgência do Hospital de S. Francisco Xavier, no dia 24.08.1998.

    2 - A A. sofreu ainda escoriações várias nos membros inferiores e superiores e um hematoma no braço esquerdo de cerca de 14 cm por 10 cm.

    3 - A A esteve incapacitada de comparecer ao serviço, desde o dia 24.08.1998.

    4 - No dia 25 de Agosto de 1998 já a zona (passeio da estrada que liga o ... à Rua ... , sentido .../Estação de ...) estava sinalizada e interdita.

    5 - A ... - empresa concessionária do Sistema Multimunicipal de Saneamento da Costa do Estoril, efectuou obras de saneamento no fundo de uma rampa, na estrada que liga o ..., em Paço d'Arcos.

    Da Base instrutória: 6 - No dia 24.08.98, pelas 19,00 horas, a A. seguia a pé, pelo lado direito da estrada que liga o ... à Rua ..., no sentido ..., sendo que o passeio desse lado, a partir de certo ponto passava a caminho de terra batida.

    7 - A A. escorregou no talude e caiu num buraco de "manilha", perto da ribeira (ao lado da estrada).

    8 - Tendo procurado agarrar-se a terra, pedras e raízes, nos bordos do buraco.

    9 - A Câmara Municipal de Oeiras procedia, na zona, a obras de regularização do leito da ribeira, com máquinas pesadas.

    10 - Pelo local (referido passeio e caminho de terra batida), transitavam outras pessoas, sem haver restrições a tal circulação.

    11 - Sem quaisquer trabalhos sinalizados ou indicação...

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