Acórdão nº 01017/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelANTÓNIO CALHAU
Data da Resolução21 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I - A..., SA, com os sinais dos autos, não se conformando com a decisão do Mmo. Juiz do TAF de Viseu que indeferiu a arguição da nulidade da contestação apresentada pela Fazenda Pública, em representação do IVV, e dispensou a produção de prova testemunhal, dela interpôs recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: 1) Na ausência de lei expressa nesse sentido, não cabe ao representante da Fazenda Pública representar em juízo os interesses do IVV no processo judicial tributário, designadamente apresentar uma contestação em sede de impugnação judicial.

2) Tal nulidade do processo foi arguida em tempo pela recorrente.

3) A decisão recorrida contraria o disposto nos artigos 15.º, n.º 1, alínea a) do CPPT e 201.º, n.º 1 do CPC.

4) Deverá, por conseguinte, ser a dita contestação ser considerada nula, e consequentemente ser a mesma desentranhada, com as devidas e legais consequências.

Sem prescindir 5) O princípio constitucional da divisão de poderes, na qualidade de princípio positivo, assegura uma justa e adequada ordenação das funções do Estado e, consequentemente, intervém como esquema relacional de competências, tarefas, funções e responsabilidades (Cfr. J.J.Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª Edição, pág. 250).

6) Ora, no caso concreto, dispõe o artigo 15.º do CPPT que compete ao representante da Fazenda Pública, nos termos da lei, representar quaisquer outras entidades públicas no processo tributário e no processo de execução fiscal.

7) Por outro lado, o presidente do IVV tem poderes para constituir mandatário e para o representar em juízo e fora dele.

8) Deste modo, a dimensão normativa explanada pelo douto despacho de 27/02/2008 viola o princípio constitucional da divisão de poderes, pelo que o mesmo deverá ser declarado nulo.

Ainda sem prescindir 9) Nos termos do artigo 13.º do CPPT, o juiz deve realizar ou ordenar todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade.

10) Por outro lado, o n.º 1 do artigo 115.º do CPPT dispõe que são admitidos os meios de prova geral.

11) É certo que a prova testemunhal pode ser afastada se o facto for susceptível de ser provado por documento, contudo tal afastamento não pode ter carácter prévio e absoluto, sob pena de conduzir a resultados iníquos.

12) Pois a força probatória de um documento, quer seja particular quer seja autêntico, diz apenas respeito à materialidade das declarações nele inscritas e não à exactidão das mesmas.

13) Por isso, ainda que um determinado facto seja susceptível de ser provado por prova documental, deve ser sempre permitida a prova por testemunhas - quanto mais não seja para interpretar o conteúdo dos documentos ou completar a prova documental - sob pena de não ser possível apurar a verdade material dos factos.

14) Ainda que a recorrente venha a juntar prova documental sobre os referidos factos, a verdade é que, ao rejeitar a inquirição de testemunhas, o Tribunal a quo não dá oportunidade à recorrente de fazer prova plena dos factos por si alegados, não assegurando a esta um estatuto de igualdade no exercício de faculdades e no uso dos seus meios de defesa processual.

15) Ao rejeitar previamente a prova testemunhal, o Tribunal a quo não está, com todo o respeito que merece, ainda que involuntariamente, a realizar ou ordenar todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade.

16) Não se tendo pronunciado sobre o pedido formulado pela recorrente, o Tribunal a quo não pode afastar o meio de prova testemunhal, presumindo a existência de documentos susceptíveis de provar os factos alegados pela recorrente.

17) Assim, o douto despacho recorrido viola o disposto nos artigos 13.º, 114.º e 115.º do CPPT, o artigo 3.º-A do CPC.

18) Atendendo a que a rejeição prévia da prova testemunhal apresentada pela recorrente influi decisivamente no exame e boa decisão da causa, o douto despacho recorrido é nulo, nos termos do artigo 201.º do CPC, pelo que mesmo deverá ser revogado, com as legais consequências.

Por despacho do Mmo. Juiz "a quo" foi o recurso admitido, a subir com o recurso interposto da decisão final.

Igualmente inconformado com esta, dela interpôs, então, também a reclamante recurso, desta vez para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: 1) A decisão recorrida louva-se em fundamentos que, na verdade e salvo o devido respeito, são contraditórios, pois o Meritíssimo Juiz a quo perfilha simultaneamente duas soluções opostas.

2) Por um lado, perfilha que são prejuízos irreparáveis aqueles que resultam da prática e execução da decisão reclamada.

3) Todavia, mais à frente, acaba por admitir que: «Na situação em análise o "prejuízo" que se verifica traduz-se tão só, usando as palavras do doutrinador supra referido, nos inconvenientes próprios de qualquer processo judicial executivo, pois eles são inerentes ao próprio funcionamento do regime judiciário global relativo à tutela de direitos. Termos em que temos de concluir não se estar perante uma situação de prejuízo irreparável alicerçador da subida e apreciação imediata da reclamação.».

4) Ou seja, no capítulo da motivação de direito da mesma decisão, o Meritíssimo Juiz perfilhou fundamentos e entendimentos absolutamente opostos e contraditórios sobre a mesma norma e a sua interpretação (o art.º 278.º, n.º 3 do CPPT), sendo certo que um deles, inevitavelmente, está em oposição com a decisão tomada.

5) Daqui resulta que a decisão proferida (de subida deferida da reclamação) está em oposição com este concreto fundamento de direito (o de não são prejuízos irreparáveis aqueles que resultam da prática e execução da decisão reclamada), o que determina a sua nulidade de acordo com o previsto no art.º 668.º, n.º 1, al. c) do CPC, nulidade que expressamente aqui se alega para todos os devidos e legais efeitos.

Sem prescindir 6) A sentença proferida pelo Tribunal a quo considerou não haver lugar a conhecimento imediato da reclamação por concluir: "não se estar perante uma situação de prejuízo irreparável alicerçador da subida e apreciação imediata da reclamação" (cf. pág. 8 da douta sentença a quo).

7) Compulsada a fundamentação da douta sentença ora recorrida, constatamos que o Tribunal a quo deu como provado, no ponto E1), que a ora recorrente tem: "um activo bruto de 84.577.450,349 € e um passivo exigível de 78.377.778,89 €".

8) Constatamos ainda que o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT