Decisões Sumárias nº 34/09 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Mário Torres
Data da Resolução26 de Janeiro de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 34/2009

Processo n.º 24/09 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Mário Torres

1. A., SA, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), de 9 de Outubro de 2008, que indeferiu reclamação para a conferência contra despacho da Desembargadora Relatora, que indeferira um seu requerimento no sentido de se considerar a multa por ela devida por apresentação tardia de peça processual abrangida pelo apoio judiciário de que beneficiava.

No requerimento de interposição de recurso refere a recorrente:

“1. A requerente solicitou apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

2. Tendo os Serviços da Segurança Social indeferido a concessão de protecção jurídica à requerente, a mesma impugnou judicialmente a referida decisão.

3. O Tribunal onde o processo corre os seus termos ainda não se pronunciou acerca da referida impugnação judicial,

4. Pelo que a decisão dos Serviços da Segurança Social ainda não é definitiva.

5. Salvo melhor entendimento, tendo em linha de conta a prova efectuada de insuficiência económica da sociedade requerente (e que já se traduziu em anteriores decisões de deferimento de concessão de apoio judiciário à sociedade na mesma modalidade aqui requerida), o que obsta a que a mesma possa suportar as custas e as demais despesas do processo,

6. Considera a aqui requerente que o douto acórdão, ao interpretar de forma restritiva a Lei do Apoio Judiciário (Lei n.º 34/2004), mais concretamente o artigo 16.º, no sentido de que o mesmo não abrange o pagamento de multas, está a perpetrar uma interpretação inconstitucionalizante da referida Lei.

7. Ora, pela leitura do artigo não se pode retirar tal conclusão,

8. Antes pelo contrário: somos levados a crer que a interpretação do mencionado artigo 16.º, em conjugação com o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), não poderá ser outra que não a de que o apoio judiciário inclui o pagamento de todas as multas.

9. Acresce que onde o legislador não excepciona não cabe ao intérprete excepcionar, por mera extrapolação.

10. Mais, a nossa tese sai reforçada por apelo ao argumento teleológico e à ratio subjacente ao artigo 20.º da CRP.

11. Assim, ao fazer depender o acesso ao recurso para o tribunal superior do pagamento da referida multa, está o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, na nossa modesta opinião, a colocar em crise o artigo 20.º da CRP,

12. O qual garante o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos a quem sofre de carência económica.

13. Violando claramente o ali consagrado principio da tutela jurisdicional efectiva e, desta forma, denegando justiça!

14. Nos termos do artigo 75.º-A, n.º 2, da Lei n.º 28/82, deverá o requerente indicar as peças processuais onde foi levantada a questão, a saber:

a) Alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa apresentadas pela aqui recorrente em 17 de Dezembro de 2007;

b) Requerimento apresentado junto do Tribunal da Relação de Lisboa em 26 de Maio de 2008.”

O recurso foi admitido pela Desembargadora Relatora do TRL, decisão que, como é sabido, não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da LTC) e, de facto, entende-se que o recurso em causa, a ser admissível, é manifestamente infundado, o que possibilita a prolação de decisão sumária, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.

2. No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Constitucional cinge-se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade constitucional imputada a normas jurídicas (ou a interpretações normativas, hipótese em que o recorrente deve indicar, com clareza e precisão, qual o sentido da interpretação que reputa inconstitucional), e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas directamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas, ou a condutas ou omissões processuais.

Por outro lado, tratando-se de recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada “durante o processo”, “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente.

Acresce que, quando o recorrente questiona a conformidade constitucional de uma interpretação normativa, deve identificar essa interpretação com o mínimo de precisão, não sendo idóneo, para esse efeito, o uso de fórmulas como “na interpretação dada pela decisão recorrida” ou similares. Com efeito, constitui orientação pacífica deste Tribunal a de que (utilizando a formulação do Acórdão n.º 367/94) “ao suscitar-se a questão de inconstitucionalidade, pode questionar-se todo um preceito legal, apenas parte dele ou tão-só uma interpretação que do mesmo se faça. (...) [E]sse sentido (essa dimensão normativa) do preceito há-de ser enunciado de forma que, no caso de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, deste modo, violar a Constituição.”

3. No presente caso, a recorrente interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa contra a sentença de 26 de Junho de 2007 do 10.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, que, julgando procedente a acção que, com fundamento em incumprimento de contrato de prestação de serviços face ao não pagamento do preço, contra ela e contra B., L.da, fora intentada por C., SA, condenara as rés a pagar à autora a quantia de € 12 828,28, acrescida de juros moratórios à taxa supletiva aplicável aos créditos das empresas comerciais desde a data de vencimento das respectivas facturas, e a quantia de € 89,00, até integral e efectivo pagamento.

A aludida sentença foi notificada à ora recorrente por carta registada expedida em 28 de Junho de 2007, e o requerimento de interposição do recurso de apelação deu entrada no Tribunal em 18 de Julho de 2007.

Tendo o recurso sido admitido por despacho de 7 de Setembro de 2007, notificado por carta registada expedida em 11 de Setembro de 2007, a ora recorrente apresentou as respectivas alegações em 15 de Outubro de 2007.

Nas contra-alegações da apelada C. foi, além do...

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