Acórdão nº 315/05.1TCGMR.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | ABRANTES GERALDES |
Data da Resolução | 18 de Junho de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
I - AA e BB, Ldª, instauraram a presente acção declarativa contra 1ºs - CC e DD, 2º - EE, 3ºs - FF e GG, e 4ºs - HH e II pedindo, relativamente aos 1ºs e 2º RR.,que se reconheça a validade da aquisição pelo A. de imóveis que lhe foram transmitidos por dação em cumprimento outorgada ao abrigo de uma procuração subscrita pelo 2º R., que se reconheça o direito de propriedade e se condenem os referidos RR. na entrega desses prédios que ocupam.
Subsidiariamente, contra todos os RR., pediram a declaração de nulidade, por simulação, fraude à lei ou ofensa aos bons costumes, dos contratos de compra e venda que efectuaram entre si, bem como a condenação dos 1ºs e 2º RR. no pagamento de uma indemnização equivalente ao actual valor dos prédios, mercê do incumprimento da promessa que outorgaram.
Alegaram que a sociedade A. prestou serviços à sociedade JJ, Ldª, para pagamento dos quais esta, representada pelos sócios-gerentes, CC e LL, sacou diversos cheques no valor de € 133.344,78, os quais vieram a ser devolvidos por falta de provisão.
Instaurado o processo criminal contra tais gerentes, o mesmo findou com desistência da queixa depois da subscrição de um acordo de pagamento da dívida que foi fixada em € 139.663,41, através da entrega de um cheque visado de 10.000.000$00 e de mais 60 cheques de 300.000$00.
Ficou ainda acordada a entrega aos AA. de uma procuração com poderes irrevogáveis a favor do advogado da A. subscrita pelo 2º R. conferindo ao procurador designado poderes para efectuar a qualquer dos AA. a dação em pagamento de dois imóveis, caso a dívida não fosse paga.
Uma vez que foi interrompido o cumprimento escalonado da dívida, o procurador designado pelo 2º R. outorgou escritura de assunção de dívida e de dação em cumprimento dos prédios a favor do A.
Numa primeira acção que foi intentada pelo A. contra o 2º R. foi julgada procedente a reconvenção pela qual este pedira a declaração de ineficácia da transmissão da propriedade dos imóveis, com fundamento em que o mesmo abusara dos poderes de representação.
Os RR. contestaram e pugnaram pela improcedência da acção, tendo os AA. replicado.
Depois de uma primeira decisão em que foi considerada procedente a excepção de caso julgado relativamente aos pedidos principais, decisão essa que foi revogada, foi proferida sentença que julgou improcedente os pedidos principais e procedente o pedido subsidiário de declaração de nulidade dos contratos de compra e venda de imóveis, por simulação.
Os AA. e os RR. apelaram e a Relação julgou improcedente a apelação dos AA. e parcialmente procedente a apelação dos RR. apenas quanto a matéria de custas.
Recorreram ambas as partes para este Supremo.
No seu recurso de revista os AA. suscitam essencialmente as seguintes questões: a) O A. é credor dos valores titulados pelos cheques, sendo devedores os 1º e 2º RR., sendo que o 1º R. é devedor porque assumiu a dívida, que confessou no contrato por si subscrito, enquanto o 2° R. é devedor por ter avalizado cheques tornando-se co-responsável pelo seu pagamento, concedendo poderes ao Dr. MM para transmitir a propriedade dos imóveis a qualquer dos AA.
b) O acórdão recorrido manteve erradamente as respostas aos indicados pontos 1º a 6°, ao invés do estava provada por documentos, designadamente um extraído da contabilidade da A., o que significa que era ónus de prova dos RR. contrariar a sua veracidade, nos termos do art. 44°, nºs 1 e 2, do Cod. Com.
c) Para efeitos de procedência do pedido subsidiário da al. g), deve considerar-se provada a celebração de um contrato-promessa de assunção de dívida e de dação em pagamento celebrado entre o 2° R. e o A, reconhecendo-se aos AA. um direito de indemnização que equivalha, pelo menos, ao valor dos cheques que não foram pagos.
d) Deve ser modificada a decisão sobre custas na proporção do decaimento.
Houve contra-alegações.
No seu recurso de revista os 1ºs e 2º RR.
concluem essencialmente que o comportamento dos AA. revela a existência de abuso de direito quanto à invocação da simulação contratual.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II – Matéria de facto (devidamente ordenada, de forma lógica e cronológica): 1. A A. Sociedade BB, Ldª, dedica-se à indústria de tinturaria de fios e bobinagens com intuito lucrativo, no exercício da qual, sob prévia encomenda, prestou serviços de tingimento de fios à Sociedade JJ, Ldª, a qual, depois o negociou e vendeu, recebendo o respectivo preço.
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Para pagamento do preço desses serviços, a Sociedade JJ, Ldª, representada pelos seus sócios-gerentes, CC, aqui 1º R., e LL, emitiu, sacou e entregou à sociedade A. diversos cheques que totalizavam 26.733.288$50 (€ 133.344,78).
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Apresentados a pagamento nas datas neles apostas, esses cheques foram devolvidos por falta de provisão porque a Sociedade JJ, Ldª, representada pelos referidos sócios-gerentes, não provisionara, nem eles próprios, a conta.
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Em consequência, em 14-12-94, a sociedade A. participou criminalmente contra os CC e LL por lhe terem passado e entregue cheques no montante total de 26.733.228$50 que foram devolvidos pelo banco sacado por falta de provisão.
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Tal participação deu origem a um processo-crime, no âmbito do qual foi apresentado pedido de indemnização cível no valor de 28.542.683$00 e no qual foi ordenada a prisão preventiva de LL, sendo o R. CC sujeito a prestação de TIR, apresentação semanal no posto policial e proibição de se ausentar para o estrangeiro.
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O A. tem o domínio e o controle absolutos sobre a A.
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Não tendo sido paga à sociedade A. a quantia referida em 2., o R. CC diligenciou junto da mesma no sentido de desistir da queixa referida em 4.
, tendo a sociedade A. respondido que estava disposta a negociar.
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Após contactos e negociação, os respectivos advogados chegaram ao desfecho negociado do dissídio.
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Nesse processo, a sociedade A. foi representada pelo Dr. MM e o R. CC pelo Dr. NN.
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Entre a sociedade A. e os 1º e 2º RR., CC e EE, ficou assente que estes assumiriam como sua e para todos os efeitos a dívida à A.
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O R. CC aceitou e assumiu a responsabilidade pessoal pela dívida à sociedade A.
e foi nesse âmbito que os 1º e 2º RR.
celebraram o Protocolo referido em 12.
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Em 27-1-97 foi realizada uma transacção na qual a sociedade A. (representada pelo seu gerente, o 1º A. AA) e o1º R. CC subscreveram o Protocolo junto a fls. 43 e segs., no qual ficou acordado consolidar em 28.000.000$00 a dívida titulada pelos cheques e respectivos juros.
Diz-se no referido Protocolo, além do mais, que: “Para pagamento dos montantes titulados pelos cheques e respectivos juros, o que tudo acordam consolidar em 28.000.000$00, o segundo outorgante entrega ao gerente da primeira, AA, os seguintes valores ...”.
… “O segundo outorgante entrega também uma procuração com poderes necessários, bastantes e irrevogáveis passada por EE ao advogado Dr. MM para este, em nome do dito mandante e no interesse deste e do aqui 2º outorgante, assumir todas e quaisquer dívidas, actuais ou futuras, até ao montante em capital de 18.000.000$00, que o 2º outorgante, seu pai, tenha ou venha a ter para com AA ou para com BB, e para que, em extinção destas dívidas, efectue dação em pagamento a qualquer uma das referidas entidades dos seguintes prédios …” (“Campo d …” e “Campo d …”).
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A sociedade A. e o R. EE convencionaram que este subscreveria os cheques referidos no Protocolo mencionado em 12.
na qualidade de avalista, como subscreveu, e que passaria ao então advogado da A. uma procuração irrevogável.
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Para pagamento do valor referido em 12.
, o R. CC fez entrega ao A. BB, na indicada qualidade (de gerente da Sociedade BB, Ldª), da quantia de 10.000.000$00, em cheque visado, e de 60 cheques de 300.000$00 cada um (18.000.000$00 no total), o 1º datado para 28-2-97 e os restantes para o último dia dos meses subsequentes (sendo de notar que nos cheques se indica como beneficiário o A. BB e que, como referido, deles consta uma declaração de aval ao sacador aposta pelo R. EE).
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Por instrumento notarial lavrado no 1º Cart. Not. de Guimarães, em 28-1-97, o R. EE declarou que, no interesse dele e do R. CC, seu pai, constituía seu procurador o Dr. MM, a quem conferia os poderes necessários, bastantes e irrevogáveis para assumir todas e quaisquer dívidas, actuais ou futuras, até ao montante em capital de 18.000.000$00, que o referido CC tenha ou venha a ter para com BB ou para com a Sociedade BB, Ldª, e para que, em extinção das dívidas referidas em 12.
, qualquer que seja o montante e até ao dito limite, efectue transmissão, a título de dação em pagamento, a qualquer uma das duas referidas entidades, do prédio rústico denominado Campo d …, sito no Lugar de …, Lordelo, Guimarães, inscrito na respectiva matriz sob o art. …, com o valor patrimonial de 24.117$00, e do prédio rústico denominado Campo d …, sito no Lugar de …, Lordelo, inscrito na matriz respectiva sob o art. …, com o valor patrimonial de 13.180$00, ambos formando o descrito na CRP de Guimarães, sob o nº 341.
Diz-se textualmente na referida procuração que, “no interesse dele mandante e de CC, seu pai, constitui seu procurador o Dr. MM … a quem confere os necessários, bastantes e irrevogáveis poderes para assumir todas e quaisquer dívidas, actuais ou futuras, até ao montante em capital de 18.000.000$00, que o referido interessado CC tenha ou venha a ter para com AA ou para com BB, e para que, em extinção destas dívidas, qualquer que seja o montante e até ao dito limite, efectue transmissão, a título de dação em pagamento a qualquer uma das referidas entidades, dos prédios que seguir se descrevem …”.
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O Dr. MM foi constituído mandatário do R. EE para os actos descritos porque ficou combinado que o faria, e tudo faria, para, desse modo, assegurar que esse R. EE não violaria os compromissos assumidos perante os seus verdadeiros constituintes.
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Em face da entrega referida em 14.
, a sociedade A. apresentou requerimento para desistência de queixa no processo-crime, declarando-se paga dos...
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Acórdão nº 1556/20.7T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Fevereiro de 2023
...Alves Duarte, e Ac. RP de 19-04-2021, Proc. 7945/18.0T8VNG.P1, Rui Penha, ambos em www.dgsi.pt [9] 1 – Ac. STJ de 18-06-2014, Proc. 315/05.1TCGMR.G2.S1, Abrantes Geraldes, in www.dgsi.pt [10] Para além do acórdão desta Relação citado no douto parecer do Ministério Público, neste sentido por......
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