Acórdão nº 54/09 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelCons. José Borges Soeiro
Data da Resolução28 de Janeiro de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 54/2009

Processo n.º 343/08

  1. Secção

Relator: Conselheiro José Borges Soeiro

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I − Relatório

  1. Pelo Acórdão de fls. 176 e seguintes, de 1 de Julho de 2008, foi delimitado o objecto do presente recurso de constitucionalidade, incidindo o mesmo no artigo 1.º, n.º 1 da Lei 1/2004, de 15 de Janeiro, na parte em que conferiu nova redacção aos artigos 51.º, n.º 3 e 53.º, n.º 1 do Estatuto da Aposentação.

    Notificado o recorrente para apresentar alegações, concluiu no sentido de considerar violado o disposto no artigo 56.º, n.º 3 da Constituição, porquanto, na sua perspectiva, não foi cumprido o exercício do direito de contratação colectiva, através das associações sindicais, o qual é garantido nos termos da lei.

    Decidindo.

    II – Fundamentos

  2. O objecto do recurso em análise restringe-se à apreciação da questão de inconstitucionalidade, por violação do direito fundamental à contratação colectiva, do artigo 1.º, n.º 1, da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, na parte em que conferiu nova redacção aos artigos 51.º, n.º 3, e 53.º, n.º 1, do Estatuto da Aposentação. Esta delimitação do objecto resulta do que havia sido decidido já na decisão sumária a qual, tendo procedido à definição do objecto do recurso e à apreciação de todas as questões de constitucionalidade suscitadas, apenas foi objecto de reclamação no que toca a esta matéria. Assim, o que então se firmou a propósito da não verificação de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado e da não existência de desconformidade constitucional por ofensa aos princípios do estado de direito, da confiança, da protecção contra o arbítrio, e da segurança e certeza jurídicas, encontra-se já devidamente transitado em julgado.

    No que toca ao mérito do recurso:

  3. A questão levantada nos autos foi já enunciada por este Tribunal Constitucional em duas ocasiões diferentes: no Acórdão n.º 360/2003, publicado no Diário da República, I Série – A, de 7 de Outubro de 2003, pelo qual o Plenário declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes do artigo 9.º, n.ºs 1 a 8, da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, por violação do direito das associações sindicais à participação na elaboração da legislação do trabalho; e no Acórdão n.º 374/2004, publicado no Diário da República, II Série, de 30 de Junho de 2004, pelo qual o Plenário não declarou a ilegalidade das normas contidas no artigo 1.º, n.ºs 1 a 5, da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro.

    3.1. No primeiro aresto mencionado, proferido na sequência de processo de fiscalização abstracta da constitucionalidade por iniciativa do Presidente da República, e versando o mesmo normas que introduziam modificações no método de cálculo (e, consequentemente, no montante) das pensões de aposentação, bem como no regime da aposentação antecipada dos trabalhadores da Administração Pública, suscitou-se a hipótese de desconformidade constitucional das referidas normas com fundamento em violação, por um lado, ao direito fundamental de contratação colectiva das associações sindicais e, por outro, ao direito das mesmas entidades a participarem na elaboração da legislação do trabalho. Este Tribunal, tendo então dado por verificada a segunda ofensa enunciada, absteve-se de apreciar a primeira questão suscitada e que dizia respeito à eventual ofensa ao direito à contratação colectiva.

    3.2. Já o Acórdão n.º 374/2004, respeitante a processo de fiscalização abstracta desencadeado por um grupo de deputados, debruçou-se precisamente sobre as alterações ao Estatuto da Aposentação introduzidas pela Lei n.º 1/2004. No entanto, à data, a questão suscitada relacionava-se em exclusivo com a eventual existência de violação de lei com valor reforçado (por referência à Lei n.º 23/98, de 26 de Maio), não tendo sido aflorado o problema que constitui o objecto dos presentes autos e que se relaciona com a existência ou não de violação do direito à contratação colectiva. Daí que o Tribunal, embora tenha procedido à enunciação da questão, não lhe tenha dado resposta na medida em que a mesma não integrava o objecto do processo.

  4. A consagração do direito à contratação colectiva, enquanto direito fundamental titulado pelos trabalhadores e exercido pelas associações sindicais, resultou do reconhecimento de um pluralismo normativo no sentido de que o Estado deixou de deter o monopólio de criação dos preceitos juridicamente vinculantes. Assim se deu a afirmação do princípio da autonomia normativa social, “através do qual se reconhece a determinadas ‘formações sociais intermédias’ designadamente aos trabalhadores enquanto grupo ou camada social organizada e aos empregadores, uma verdadeira potestas normandi, ou seja, um poder de criação de autênticas regras de conduta, de atribuição de direitos e deveres relacionados com a sua situação de assalariados” (Jorge Leite, Direito do Trabalho, vol. I, Serviços de Acção Social da U.C., Coimbra, 1998, pp. 79-80).

    Trata-se de um direito de todos os trabalhadores, abrangendo-se, naturalmente, tanto aqueles que se encontram ao serviço de entidades patronais privadas como os trabalhadores da Administração Pública. Não significa isto, no entanto, que o direito em análise possua exactamente o mesmo conteúdo relativamente às diferentes categorias de trabalhadores. Como assinala Ana Neves,a liberdade de negociação das condições...

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