Acórdão nº 0413/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução05 de Junho de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NO PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: A……….

inconformada com o Acórdão da Secção deste Supremo Tribunal, que julgou improcedente a acção administrativa especial que dirigiu contra o Conselho Superior do Ministério Público (doravante CSMP) dele vem interpor o presente recurso que finaliza do seguinte modo: A.

Os factos considerados no Acórdão são manifestamente insuficientes para a decisão de direito.

B.

Este Venerando Tribunal pode conhecer e julgar os factos através de uma reponderação ou reexame da decisão (art.ºs 712° n.º 1, al. a) e b) do CPC e art.º 712°, n.º 1 al.ª c) do CPC) ou pode usar de poderes de rescisão ou cassatórios em que anula a decisão da primeira instância por deficiência, obscuridade ou contradição desta decisão por se considerar indispensável a ampliação dessa matéria de facto (art. 712.° n.°4 CPC).

C.

O uso de poderes cassatórios e a anulação do julgamento da primeira instância tem como fundamento uma omissão do julgamento de determinado facto relevante para a decisão da causa.

D.

Estes poderes podem ser exercidos pelo tribunal “ad quem”, mesmo oficiosamente, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre determinados pontos da matéria de facto (art.º 712°/4 CPC).

E.

O tribunal “ad quem” pode também determinar que o tribunal de 1.ª instância, fundamente a decisão proferida sobre os pontos da matéria de facto (art. 712°/5).

F.

Estas deficiências da matéria de facto seleccionada, por omissão de factos com interesse para a decisão da causa, impõem uma anulação da sentença por deficiência quanto a pontos determinantes da matéria de facto.

G.

Nomeadamente os factos invocados pela Recorrente nos art.ºs 62° a 74° da petição inicial deveriam ser seleccionados. Estes factos permitiram à Recorrente demonstrar o vício de erro sobre os pressupostos de facto: se a Autora, ora Recorrente, foi acusada e punida pela prática de determinados factos (furto de 2.190,32€ e desaparecimento de processo) o tribunal só poderá manter esta punição se considerar estes factos provados e fundamentar esta convicção.

H.

O douto Acórdão em apreço rejeitou a pretensão da Autora, ora Recorrente, de selecção destes factos e posterior sujeição à prova, com fundamento no seguinte entendimento: “Por via do princípio da separação de poderes, o STA afere da legalidade do acto punitivo, mas não lhe compete fazer ou refazer processos disciplinares ou aplicar penas.” I.

Este entendimento, claramente viola o disposto nos arts. 2° e 3º do CPTA que consagram o princípio da tutela jurisdicional efectiva dos particulares e o princípio da plena jurisdição dos Tribunais Administrativos.

J.

Com efeito, só é admissível garantir a protecção dos direitos dos administrados, através da dedução em juízo de todo o tipo de pretensões, se se reconhecer aos juízes administrativos o poder de emitirem todo o tipo de pronúncia: quer sobre os factos quer sobre o direito.

K.

A interpretação dos art.ºs 2° e 3° do CPTA no sentido de que o tribunal afere da legalidade do acto mas não da correcção dos factos que foram pressupostos deste acto, viola o art. 20º/1 da CRP; viola também o art. 6° da CEDH, pelos motivos supra expostos.

L.

O Dec. Lei n.º 343/99, de 26 de Agosto, é inconstitucional.

M.

Acórdão em apreço viola as normas constitucionais supra referidas, ao considerar que as normas atributivas de competência disciplinar ao CSMP não sofrem das inconstitucionalidades apontadas.

N.

O Acórdão em apreço viola o art. 6°/1 e 3 do ED.

O.

A interpretação do art. 6°/3 do ED no sentido de que a prescrição equivale ao prazo previsto para o crime em questão, mesmo que o trabalhador/arguido não tenha sido condenado pela prática de um crime, viola o princípio de presunção da inocência do arguido. Ao trabalhador/arguido são, desde logo, atribuídos efeitos desfavoráveis pela imputação de factos pelos quais não foi condenado criminalmente.

P.

O acórdão viola também art. 6°/2 do ED dispõe que a infracção prescreve quando conhecida a infracção pelo superior hierárquico, não seja instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de 30 dias.

POR OUTRO LADO Q.

O processo disciplinar prescreveu em razão da duração do procedimento.

R.

A interpretação do Acórdão em apreço de que o prazo de 18 meses não se conta desde o início do inquérito (que constituiu a fase instrutória do processo disciplinar) só pode significar que o processo disciplinar movido à Autora padece de nulidade insuprível por não ter fase instrutória.

S.

Também não faz sentido o entendimento de que o inquérito não conta para efeitos do prazo de prescrição, quando este constitui a fase instrutória do processo disciplinar, porque nesta fase ainda não surgiu o “sacrifício e desconforto” inerentes à qualidade de arguido.

T.

A própria lei reconhece a existência desta posição de “sacrifício e desconforto” dos trabalhadores visados, pois o art. 68°/5 do E.D. admite que os trabalhadores visados no processo de inquérito podem constituir advogado.

U.

A interpretação do Acórdão do art.º 6°/6 do ED no sentido de que o prazo de prescrição (18 meses) não se conta desde o início do inquérito, quando este constitui a fase instrutória do processo disciplinar viola o princípio da legalidade (arts. 27° e 29° da CRP).

V.

O processo interpretativo seguido pelo tribunal “a quo” traduziu-se na criação de uma verdadeira “norma” com recurso à analogia para resolver a questão da prescrição do processo disciplinar.

W.

O preceito com a literalidade do art.º 6°/6, que impõe a contagem do prazo de prescrição desde o início do processo disciplinar, não pode sofrer uma verdadeira interpretação analógica no sentido de não revelar para efeitos de contagem de prazo de prescrição o início do processo disciplinar, quando este afinal coincida com o processo de inquérito.

X.

A ACUSAÇÃO deduzida contra a Autora padece de nulidade, pois: - sem factos concretos, - sem indicação das circunstâncias de tempo, modo e lugar, - utilizando expressões “conclusivas” e “vagas” VEIO PERMITIR uma decisão punitiva alicerçada em VIOLAÇÕES GRAVES DA LEI: a - Por um lado, na invocação de factos e circunstâncias não constantes da acusação, b - inventando novos factos não constantes da mesma acusação e colmatando, abusivamente, as lacunas desta c - Fazendo o invocado “exame crítico das provas” (3.3), o autor do RELATÓRIO FINAL não fez mais do que INVENTAR factos novos, - não constantes da acusação.

Y.

Os factos constantes dos arts. 4º, 7°, 12°, 13°, 15°, 17°, 18°, 19° da decisão punitiva padecem de erro de apreciação, pois não foram demonstrados no processo disciplinar: -Não existe qualquer documento que comprove a entrega desta quantia em dinheiro à Autora. Existe um documento que comprova a entrega desta quantia à Testemunha B……. por parte das entidades policiais (aliás, a própria testemunha não nega este facto, dado existir uma guia de recepção do dinheiro assinada pelo mesmo). Ou seja, estando demonstrado que o mesmo recebeu dinheiro que posteriormente desapareceu, nada melhor que empurrar a responsabilidade para a Autora, sob pena de eventualmente lhe serem imputadas responsabilidades.

Segundo esta testemunha, na data em que entregou os objectos e o dinheiro à Autora, elaborou uma guia de entrega de objectos, guia esta que terá sido guardada num armário da Secção Central. Curiosamente, esta guia que alegadamente teria sido emitida pela testemunha e comprovava a entrega da quantia em dinheiro à Autora também desapareceu.

E não se diga, como é dito no relatório final, que o facto de a Autora ter elaborado uma guia de entrega dos objectos que haviam sido apreendidos juntamente com a quantia em dinheiro, ter tomado conhecimento que nesse processo havia sido apreendida aquela quantia e não ter reagido contra a falta da entrega do dinheiro significam ou sequer indiciam que a Autora se apropriou do dinheiro. A Autora só poderia reagir contra a falta da entrega deste dinheiro se não fosse procedimento normal o dinheiro ficar depositado no cofre da secção central e se tivesse sido emitida uma guia em que se confirmasse a entrega a si deste dinheiro. Como já referimos estes pressupostos são falsos, pelo são também falsos as considerações a este propósito do relatório final.

- NENHUM ELEMENTO DE PROVA demonstra que a Autora fez desaparecer estes processos. À Autora apenas são atribuídos estes factos porque se PRESUME que quem se apropriou da quantia é que teria interesse em fazer desaparecer todos os processos.

Z.

Não existe prova documental que suporte os factos constantes no acto impugnado, já que os documentos juntos ao processo disciplinar não corporizam minimamente qualquer prova da actuação da Autora nos termos em que lhe são imputados.

AA. Depois temos que a prova testemunhal, com e na qual a decisão disciplinar punitiva se funda, assenta tão somente nas declarações da testemunha B……. segundo a qual teria entregue uma quantia em dinheiro à Autora. Pelas razões referidas supra, o depoimento desta testemunha não pode ter NENHUMA CREDIBILIDADE.

BB. Apenas subjectivamente podemos optar por dar credibilidade ao depoimento desta testemunha, como foi feito pelo Senhor Instrutor e na decisão punitiva. Mas tal constitui uma mera conjectura ou suposição que não está assente em elementos objectivos ou objectiváveis e que, por isso, não se mostra como suficiente e bastante para dela e nela se poder extrair ou fundar um juízo de certeza, uma convicção segura, da materialidade dos factos imputados à arguida, ora Autora.

CC.

O juízo efectuado na decisão punitiva deve ser fundado em elementos probatórios que de per si sejam suficientes para afastar toda a DÚVIDA RAZOÁVEL. O que não sucede no caso em apreço. Sob pena de violação dos princípios da presunção da inocência e do in dubio pro reo.

O CSMP contra alegou para formular as seguintes conclusões: 1.

O douto acórdão recorrido, tendo julgado a acção improcedente e absolvido o CSMP dos pedidos, decidiu em conformidade com a lei aplicável e não incorreu em nenhum...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT