Acórdão nº 08906/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 05 de Junho de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.
RELATÓRIO O………….., SA - …………….
, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 14/02/2012 que, no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma ordinária, instaurada contra a V............ - Valorização ............., SA, julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido de declaração ilegal da interpretação do regime jurídico da revisão de preços, ínsito no D.L. nº 6/2004, de 06/01 e no D.L. nº 59/99, de 02/03, no sentido de a Autora dever assumir e pagar à Ré o valor negativo que resultar do cálculo de revisão de preços que for aplicado ao contrato de empreitada de obra pública celebrado entre ambas, a condenação da Ré a restituir à Autora o valor que recebeu dos Bancos, por execução ilegal das garantias bancárias destinadas ao bom cumprimento da prestação de execução da obra, acrescido de juros de mora, desde a entrada da acção e ainda, a condenação ao pagamento dos prejuízos com que com tal execução ilícita das garantias, a Ré causou à Autora, a liquidar em execução de sentença, nos termos do artº 471º do CPC.
Formula a aqui Recorrente nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem (cfr. fls. 131 e segs. do processo físico, assim como as demais referências feitas): “A) Prestadas as garantias bancárias na linha do que resulta do contrato de empreitada, vide cláusula 9.ª, n.º 1, “Para garantir o exacto e pontual cumprimento das suas obrigações...”, deveria ter sido ter sido dado como assente que “dos textos de tais garantias bancárias resulta que as mesmas se destinam à boa execução dos trabalhos da empreitada adjudicada pela recorrida à Recorrente”, no ponto l.º dos factos assentes: B) Nessa medida é errada a decisão proferida, e ora colocada em crise, na medida em que, não sindica legalmente, o que configura um claro abuso de direito da Recorrida, enquanto Dono de Obra, a saber, o accionamento das garantias bancárias prestadas para boa execução dos trabalhos da obra, fazendo-o para se cobrar de um valor a que se entende com direito a titulo de revisão negativa de preços.
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As situações trazidas aos autos pela Recorrente, nada têm a ver com o facto das garantias em causa serem ou não “on first demand”, mas antes com o facto de o motivo do accionamento pelo beneficiário se situar fora do que foi contratado pelas partes, no contrato de empreitada e consta do texto da própria garantia bancária.
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Quanto ao regime da revisão de preços é claro o intuito do legislador de proteger o Empreiteiro, do aumento de preços, decorrente da inflação, atenta a delonga temporal existente entre o momento do fornecimento desses preços na sua proposta e o momento da execução dos trabalhos e respectivo pagamento pelo Dono de Obra.
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Atento esse facto, claramente não entendeu o legislador obter uma correcção efectiva de valores, decorrente de uma situação de deflação, à custa da devolução de dinheiro por parte do Empreiteiro ao Dono de Obra, ou de dedução de valores no pagamento a fazer pelo Dono de Obra ao Empreiteiro nos trabalhos seguintes a realizar por este.
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Essa situação de não intenção do legislador no regime actual de revisão de preços, pretender que o Dono de Obra, viesse a cobrar do Empreiteiro valores encontrados por aplicação das formulas definidas para calcular os preços dos meios empregues em obra, advém também do facto de tais formulas serem abstractas e não ser seguro que correspondam a um ganho efectivo para o Empreiteiro, em situação de deflação.
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Permitir que o Dono de Obra exija do Empreiteiro a entrega de valores, resultantes de um cálculo adveniente da aplicação de fórmulas abstractas aos preços dos meios empregues na execução dos trabalhos da empreitada, pelo Empreiteiro, é correr um enorme risco de injustiça.
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Pois se é certo que em situação de inflação o cálculo da revisão de preços, é feito dessa forma, com recurso a formulas abstractas de calculo do índices de preços, e sua transposição para os meios empregues em obra, já na situação inversa, a saber de deflação, o mesmo não é possível (pelo menos sem o crivo do dado concreto de demonstração caso a caso por factura do negócio empreendido) sob pena do cometimento de injustiça grave, patente no risco de permitir ao Dono de Obra, receber do Empreiteiro, o que ele não ganhou entre o negócio de compra que fez junto dos seus fornecedores e o preço pelo qual se comprometeu a vender ao Dono de Obra tais meios de trabalho.
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Para mais vejamos desde logo que entre os factores ou meios de trabalho a fornecer à obra, está o da mão-de-obra. Ora vejamos que a mão-de-obra, embora se possa conseguir mais barata em situação de deflação, não é transaccionável ou de desvinculação fácil num sistema laboral como o Português em que se protege o vinculo laboral do trabalhador com a entidade patronal, e em que o trabalho precário é proibido levando a que os vínculos laborais sejam duradouros, logo os valores da mão-de-obra, não descem com a deflação, porque o mesmo é proibido por lei, a saber, baixar salários.
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Daí que defenda a Recorrente que o instituto da revisão de preços, tendo sido criado para protecção da posição do Empreiteiro, no contrato de empreitada de obra pública - sendo este a parte com estrutura financeira mais frágil no contrato de empreitada de obra pública - e por via do mesmo, não obstante preveja a situação de diferenças para mais ou para...
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