Acórdão nº 10961/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | CRISTINA DOS SANTOS |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
O Ministério da Educação e Ciência, com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Um dos momentos mais relevantes na administração da justiça, no exercício do poder jurisdicional, ocorre com a produção da sentença pelo Tribunal de 1.
a instância, emitida por aquele singular magistrado que nela apõe a sua assinatura.
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É na sentença da sua autoria que o juiz não pode abster-se de julgar, devendo emitir pronúncia sobre toda as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.
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A administração de justiça através da pronúncia quanto às questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, deve ser pessoal, individualizada, emitida pelo autor da respetiva sentença, com a aposição da sua assinatura.
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Na sentença ora recorrida não foi emitida pronúncia sobre as questões que as partes submeteram à apreciação do Tribunal a quo, pela Meritíssima Juíza que apõe a sua assinatura na sentença, ou seja, o conteúdo desta não é da sua autoria.
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A Meritíssima Juíza do Tribunal a quo não é a autora da sentença que ela própria assinou, limitando-se a reproduzir um julgamento produzido por outra Magistrada, ou seja, absteve-se de julgar e, com isso, não administrou a justiça, conforme lhe competia.
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Sendo assim, não existe uma pronúncia daquela, mas um julgamento produzido por outro, o que certamente não seria querido pelo legislador ao estabelecer o comando contido no primeiro segmento do n° 2 do art. 608.° do NCPC, e bem assim do art. 95º, n° 2 do CPTA, o que acarreta a consequência prevista na alínea d) do n.° 1 do art. 615.° do NCPC.
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A douta sentença ora recorrida fez uma incorreta interpretação e aplicação do disposto na alínea b) do n° 1 e n° 2 do art. 120.° do CPTA, que constituem a sua ratio decidendi.
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Incumbia ao recorrido, o ónus de alegação e prova (ainda que indiciaria) de factos concretos bastantes, concretos e susceptíveis de demonstrar, mesmo que perfunctoriamente, o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que pretende ver reconhecidos no processo principal.
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Sendo assim, é evidente a insuficiência da matéria de facto trazida ao processo pelo recorrido para demonstrar a verificação do requisito do periculum in mora.
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O receio de produção de prejuízos de difícil reparação ou da criação de uma situação de facto alegado pelo recorrido é hipotético e dependente de factos futuros e incertos, como sejam, a reprovação na prova e a colocação no concurso de professores.
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Não se compreende que se admita a reprovação na prova como causadora do periculum in mora, sem pôr em causa a premissa de que parte o recorrido: estarem todos os candidatos à realização da prova habilitados para o exercício da função docente, ou seja, serem detentores dos conhecimentos e capacidades que a prova visa avaliar.
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Mesmo a admitir-se tal eventual reprovação nunca representaria um prejuízo ou facto consumado comum a todos os associados do SPM.
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As referidas alegações da verificação do periculum in mora careceriam de específica individualização, com a demonstração dos prejuízos e a prova de fundado receio de ocorrência do efeito de facto consumado, em cada caso concreto.
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Mesmo para aqueles associados do SPM que obtenham aprovação na prova e com isso sejam admitidos ao concurso de professores, mesmo para esses, não está assegurada a sua colocação naquele concurso e, consequente, empregabilidade.
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Quanto à impossibilidade de sustento próprio e das respectivas famílias dos associados do recorrido, nada nos autos permite concluir, porque o recorrido nada alega a tal respeito, da situação económica e financeira dos agregados familiares dos associados do recorrido.
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Mesmo que se realizasse a prova, mesmo que houvesse candidatos reprovados que não seriam admitidos aos concursos a realizar em 2014, sempre seria possível reintegrar a sua esfera jurídica mediante a reconstituição do referido concurso para esses docentes, ressarcimento monetário dos valores que deixaram de auferir em virtude do ato ilegal, para além da respetiva contagem de tempo de serviço.
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Sem qualquer esforço argumentativo, num simples raciocínio silogístico, é possível demonstrar a manifesta falta de fundamento da pretensão principal: i) Premissa maior: a alínea a) do n.° 1 do art. 53.° da Lei n.° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, estabelece, como requisito de acesso à função pública, enquanto método de seleção, a realização de «provas de conhecimentos, destinadas a avaliar se, e em que medida, os candidatos dispõem das competências técnicas necessárias ao exercício da função».
ii) Premissa menor: os requisitos de acesso à função pública devem respeitar o princípio da igualdade constante do n.° 2 do art. 47.° da CRP.
iii) Conclusão: logo, a prova de conhecimentos deve ser exigida aos candidatos à docência no ensino público.
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Nos presentes autos, a relação que se estabelece entre o princípio contido no n.° 1 do art. 47.° da CRP e o previsto no n.° 2 do mesmo artigo é, sem dúvida, uma relação de especialidade, pelo que é esta última que aqui está em causa: o direito de acesso à função pública.
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Ora, o nº 2 do art. 47º da CRP mais não faz do que completar o quadro normativo constitucional, referente ao funcionalismo público,estabelecendo restrições à liberdade de escolha de profissão, em nome do interesse público que cabe à Administração Pública prosseguir.
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A exigência da regra do concurso público, sendo o meio mais adequado de assegurar a igualdade de acesso, vai mais além, assegurando o próprio direito à função pública, baseado numa cultura de meritocracia na Administração Pública.
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É que, o concurso, sendo a forma de recrutamento mais apta para garantir a igualdade de acesso, é ela própria limitadora desse mesmo acesso, já que a lei estabelece requisitos de mérito, aptidão e capacidade dos candidatos recrutáveis, visando as escolhas mais adequadas para as funções a desempenhar.
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Naquele preceito constitucional impõe-se recrutar pelo mérito, avaliar e premiar o desempenho, motivando e exigindo imparcialidade, dedicação e responsabilidade, por forma a constituir um corpo profissionalizado de trabalhadores que, com continuidade, promovam o interesse público.
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O estabelecimento de requisitos de admissão ou seleção para avaliar se, e em que medida, os candidatos têm as os conhecimentos e as capacidades necessárias ao exercício da função a desempenhar, nos termos previstos e exigidos pelo n.° 2 do art. 47.°, ao estabelecer a regra do concurso, não pode ser entendido como restrição a um direito, liberdade e garantia, para efeitos do n.° 2 do art. 18.° e alínea b) do n.° 1 do art. 165.°, ambos da CRP.
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O n.° 2 do art. 47.° da CRP impõe a prova aos candidatos à docência, nos termos da alínea a) do n.° 1 do art. 53.° da Lei n.° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que estabelece, como requisito de acesso à função pública, enquanto método de seleção, a realização de «provas de conhecimentos, destinadas a avaliar se, e em que medida, os candidatos dispõem das competências técnicas necessárias ao exercício da função».
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Assim, a solução normativa da alínea f) do n.° 1 do art. 22.° do Estatuto da Carreira Docente, na redação do Decreto-Lei nº146/2013, de 22 de outubro, agora questionada, deve ser contextuatizada no âmbito da Lei Geral aplicável a toda a função pública e emitida pela Assembleia da República, nos termos da alínea t) do n.° 1 do art. 165.° da CRP.
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Na falta de caráter inovatório de um diploma do Governo face a uma Lei emitida pela Assembleia da República, tem a jurisprudência entendido que não se verifica uma inconstitucionalidade orgânica por violação do art. 165º da CRP.
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Por outro lado, se o quadro legal consagrado no Estatuto da Carreira Docente em que o acto suspendendo se alicerça efectivamente, limita o exercício da profissão de professor do ensino público é questão que ultrapassa o âmbito da presente providência cautelar, na exata medida em que nela não são impugnadas normas tais normas legislativas, para cuja apreciação a jurisdição administrativa é absolutamente incompetente, mas sim um despacho que é manifestamente legal.
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Não se justifica da parte dos associados do...
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