Acórdão nº 10965/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução02 de Abril de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Recorrente: Ana …………………… Recorrido: Município de Almada e Outra Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAF de Almada que julgou improcedente o pedido de suspensão de eficácia do acto que procedeu à notificação da Requerente para, em 15 dias, proceder à retirada dos artigos de vestuário, edredons, roupa de cama, toalhas e adereços de casa de banho, da montra da loja que explora e para fazer cessar a sua comercialização. É também recorrido o despacho antecedente, que indeferiu a produção de prova.

Em alegações são formuladas pela Recorrente as seguintes conclusões: «a. A douta decisão que incorpora o indeferimento da produção de prova testemunhal requerida pela Recorrente deve ser declarada nula e de nenhum efeito.

  1. Não pode concordar-se com tal decisão, na medida em que a discricionariedade conferida pelo legislador ao julgador não pode alhear-se dos princípios legais e constitucionais da tutela jurisdicional efetiva e da real promoção de acesso à justiça, da verdade material e do inquisitório e da já mencionada tutela jurisdicional efetiva.

  2. O legislador não refere a total ausência de prova, ainda que meramente indiciária, em sede cautelar.

    d, o conhecimento perfuntório exigível em processo de natureza urgente não impede a produção de prova, nem com esta se incompatibiliza, sendo certo que nos presentes autos, e em especial no que tange ao periculum in mora, a produção de prova testemunhal se afigura por demais indispensável à boa decisão da causa.

  3. A Recorrente não se limitou a alegar generalidades e a proferir juízos eminentemente conclusivos sobre a situação de facto consumado por certo gerada com o não decretamento da providência de suspensão de eficácia do ato administrativo sobre que versam os autos e os prejuízos de impossível ou difícil reparação, densificando essa asserção com factos que se propunha provar. Entre outros, para esse efeito referiu que se perspetiva uma situação de impossibilidade de reintegração específica da esfera jurídica da Recorrente no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, por não poder depois recuperar a sua capacidade de subsistência, para si e para o seu agregado familiar, e a obtenção de lucros emergentes da sua ativídade, amortizando e rentabilizando o investimento já realizado na aquisição da mercadoria cuja comercialização a Entidade Recorrida pretende ver cessada, mais referindo que a não suspensão do ato administrativo origina, inevitavelmente, lucros cessantes de montante substancial, e em parte indeterminável com rigor, desencadeando outras consequências de difícil, senão impossível, quantificação porque caso a Recorrente seja compelida a retirar da loja, cuja ocupação lhe foi confiada, os artigos indicados na notificação que lhe foi dirigida, não podendo proceder à sua comercialização, a sua atividade económica jamais permitirá auferir receitas que lhe concedam um grau mínimo de subsistência (pois que é dessa atividade que, em exclusivo, retira meios para o seu sustento e de seu marido), por certo eclodindo na sua irremediável insolvência. Mais alegou a Recorrente que tem um investimento de cerca de € 40.000,00 (quarenta mil euros) de mercadoria, em loja e em stock, tendo, também por isso, imperativa necessidade de a comercializar a fim de garantir a amortização desse investimento e a obtenção da margem de lucro que lhe está associada, corresponde a generalidade dessa mercadoria aos lavores que agora foi intimada a retirar da montra da loja e impedida de comercializar.

  4. A Recorrente arrolou, em primeiro lugar, o técnico oficial de contas, que tem sob sua confiança a documentação contabilística necessária ao apuramento dos factos alegados pela Recorrente no seu requerimento, sendo que o depoimento desta testemunha seria mais do que hábil e eficiente á comprovação da situação de facto consumado, à existência inequívoca de prejuízos de muito dificil ou impossível reparação, ou seja, para prova de uma concreta e insofismável impossibilidade objetiva de reintegração na situação jurídica anterior à execução em caso de deferimento da pretensão impugnatória a sindicar no processo principal, provando os factos materializados pela Recorrente e explanando percentagens, valores, ratios e as inexistentes perspetivas económico-financeiras sem a comercialização em causa, assim como os rendimentos da Recorrente e a sua inevitável incapacidade para prover a compromissos básicos de subsistência em caso de execução do ato administrativo.

  5. Do mesmo modo, as demais testemunhas dispõem de conhecimento direto sobre todos os factos alegados no requerimento inicial para prova do requisito periculum in mora.

  6. A descoberta da verdade material e a boa decisão da causa cautelar, ainda que em moldes indiciários e com nota de prova sumária, não pode deixar de exigir a produção de prova testemunhal sobre os factos constitutivos do direito e pedido veiculados pela Recorrente no seu requerimento inicial.

  7. Ao inviabilizar a produção de prova testemunhal, o Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e aplicação do artigo 118.°, n." 3, do CPTA, devendo ser anulada a sentença sindicada.

  8. Em simultâneo, a conclusão pela desnecessidade da prova testemunhal, porque efetivamente impede a Recorrente de comprovar o que alega no que concerne aos prejuízos e à situação de facto consumado, como um dos pressupostos de que depende o decretamento da providência requerida, incorre na preterição dos principios tutela jurisdicional efetiva, da real promoção de acesso à justiça, da verdade material e do inquisitório, preconizados pelos artigos 2.°, n." 1, e 7.° do CPTA, e pelos artigos 2.°, 20.° e 268.°, n," 4, da CRP.

  9. Sem prescindir, e por mera cautela: k. Mesmo que se entendesse persistir no juízo quanto à desnecessidade da prova testemunhal (o que se admite por mera e exclusiva cautela, sem nisso se conceder), ainda assim seria de prefigurar uma inequívoca, e notória, situação de existência de prejuízos de dificil, senão ímpossível, reparação e numa situação de facto consumado que implicaria a impossibilidade de reintegração da Recorrente na situação anterior à execução do ato administrativo.

  10. O perigo de inutilidade da lide principal afigura-se translúcido, face ao sumariamente alegado pela Recorrente.

  11. Ao juízo sumário exigível ao Tribunal corresponde uma alegação sumária dos prejuízos, não se podendo exigir que o requerente em lide cautelar produza uma prova especificada e minuciosa dos factos que alega.

  12. A mera enunciação dos factos essenciais à ponderação dos prejuízos tem que considerar-se como suficiente e apta para a verificação perfuntória dos pressupostos de que depende o decretamento da providência.

  13. A Recorrente alegou, e propôs-se provar por testemunhas (em complemento da prova documental existente), a existência do requisito do periculum in mora.

  14. Os factos alegados pela Recorrente não se subsumem a juízos conclusivos, antes se compartimentando em questões práticas passíveis de prova por testemunhas, mas que, na sua essência, e até independentemente de qualquer prova, não deixam de ser factos que resultam de juízos de verosimilhança e da experiência...

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