Acórdão nº 01334/12.7BEPRT-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Março de 2014
Magistrado Responsável | Carlos Lu |
Data da Resolução | 14 de Março de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO “MUNICÍPIO DO PORTO”, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 02.10.2013, proferida no processo cautelar contra o mesmo movido e bem assim o contrainteressado ASV...
por DFFJ...
, ambos igualmente identificados nos autos, que determinou a suspensão de eficácia do “… Despacho do Senhor Vereador com o Pelouro da Proteção Civil, Fiscalização e Juventude, de 19.03.2012, pelo qual lhe foi ordenada a cessação da utilização do espaço sito à PR... , n.º 17, em que tem instalado o seu estabelecimento de bebidas e que lhe foi notificado pelo ofício da Divisão Municipal de Fiscalização de Obras Particulares do Departamento Municipal de Fiscalização de 20.03.2012 …”.
Formula o ente requerido, aqui recorrente, nas respetivas alegações [cfr. fls. 333 e segs. e fls. 405 e segs. na sequência de convite por despacho do Relator de fls. 399/400 - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário], as seguintes conclusões que se reproduzem: “...
A. A sentença do tribunal a quo enferma dos vícios de erro de julgamento e de errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, maxime do artigo 120.º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2 do CPTA.
B. A providência requerida é concedida sem mais sempre que resulte evidente a procedência da pretensão formulada, ou a formular, no processo principal, ou seja, quando se revele praticamente inquestionável a ilegalidade do ato em causa. Ora, o tribunal a quo entendeu, e bem a nosso ver, que estava afastada a aplicação da referida disposição legal.
C. Cumpre averiguar se na presente situação ocorrem os requisitos enunciados na alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, a que adicionam os previstos no n.º 2 mesmo artigo, a saber: fumus boni iuris, na sua formulação negativa; o periculum in mora; a superioridade dos danos resultantes da sua concessão, relativamente aos que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
D. E aqui se inicia a discordância do Recorrente com o entendimento do tribunal a quo.
E. A análise que deve ser feita pelo tribunal no âmbito do artigo 120.º do CPTA é naturalmente perfunctória, mas a lei exige que se analisem atentamente os argumentos que são apresentados pelas duas partes neste pleito.
F. No caso em apreço, os alegados prejuízos «absolutamente irreparáveis» e os vícios de falta de fundamentação (artigos 124.º e 125.º do CPA e do artigo 268.º, n.º 3 da CRP) invocados pela ora Recorrida não são suficientes para abalar a decisão da ação principal.
G. O Recorrido não afasta a falta de alvará de utilização específico para a atividade desenvolvida no local, e que motivou o ato administrativo cuja eficácia pretende suspender.
H. O Recorrido somente se escuda na pretensa falta de fundamentação para colocar em crise o ato administrativo em apreço, não cuidando sequer de o concretizar minimamente.
I. A notificação recebida é perfeitamente percetível, contendo os elementos de facto e de direito que motivaram a decisão administrativa, e é inclusivamente bem entendido pelo Recorrido, como se encontra aliás demonstrado na petição inicial.
J. A decisão de cessação da utilização deste estabelecimento comercial está relacionada com o desrespeito pela autoridade municipal e pelas exigências legais necessárias ao desenvolvimento da sua atividade comercial.
K. A falta de condições do estabelecimento comercial do Recorrido mobilizou não apenas a atuação do Requerido, mas também (num outro nível e em relação a outras questões) da ARS Norte.
L. Invocou ainda o Recorrido que o ato administrativo sub judice é «injusto e parcial», esquecendo por completo os princípios da legalidade e da igualdade (aliado até ao princípio da livre concorrência) que norteiam a ação da fiscalização municipal.
M. É manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular pelo Recorrido na ação principal, pelo que não se encontra verificado o requisito do fumus boni iuris, verificando-se um erro de julgamento e uma errónea interpretação e aplicação do artigo 120.º, n.º 1, alínea b) do CPTA.
N. Entendeu ainda o tribunal a quo que existe um risco fundado de constituição de uma situação de facto consumado («periculum in mora»).
O. Mas, no seguimento do raciocínio acima desenvolvido, a constituição do facto consumado é uma falsa questão, uma vez que se entende que os alegados vícios que colocam em crise o ato administrativo em apreço não o irão anular na ação principal.
P. Assim, observa-se novamente um erro de julgamento e uma errónea interpretação e aplicação do artigo 120.º, n.º 1, alínea b) do CPTA.
Q. No que tange ao disposto no n.º 2 do artigo 120.º do CPTA, entende o Recorrente que a gravidade da situação consubstanciada na cessação de utilização cuja eficácia se pretende suspender é superior ao interesse do Recorrido, uma vez que criaria uma imagem de impunidade que se deseja evitar e colocaria em causa os efeitos do respeito pela legalidade urbanística que se pretendem acautelar.
R. Assim, verifica-se um erro de julgamento e uma errónea interpretação e aplicação do artigo 120.º, n.º 2 do CPTA.
S. Por todo o exposto, deverá o tribunal ad quem revogar a sentença recorrida, por tal estar ferido de errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, bem como de erro de julgamento, julgando improcedente o pedido de suspensão da eficácia do ato administrativo sub judice....
”.
O requerente, ora recorrido, apresentou contra-alegações [cfr. fls. 365 e segs. e 439] nas quais pugna pela total manutenção do julgado sem haver formulado qualquer síntese conclusiva.
A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio apresentar parecer onde sustenta o improvimento do recurso [cfr. fls. 378/381 v.
], posicionamento esse que objeto de contraditório apenas mereceu resposta discordante do recorrente [cfr. fls. 396].
Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
-
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente sendo certo que se, pese embora por um lado, o objeto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do CPC [na redação decorrente do DL n.º 303/07, de 24.08 - cfr. arts. 05.º e 07.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 41/2013 -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC] [atuais arts. 05.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 e 639.º do CPC/2013] “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.
As questões suscitadas e de que cumpre decidir resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao proceder a pretensão cautelar formulada pelo aqui recorrido incorreu em erro no julgamento de direito dada a infração, mormente, do disposto nos arts. 120.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CPTA [cfr. respetivas alegações e conclusões supra reproduzidas].
-
FUNDAMENTOS 3.1.
DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente o seguinte quadro factual: I) O requerente tem instalado no prédio sito na PR..., n.º 17, Porto, um estabelecimento comercial de bebidas - facto que resulta admitido face ao posicionamento das partes nos respetivos articulados, e, bem...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO