Acórdão nº 01394/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.

- A………………, LDA, melhor identificada nos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu de 28-03-2013, que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra o indeferimento do pedido de revisão oficiosa da autoliquidação da taxa de promoção devida ao Instituto da Vinha e do Vinho, no montante de € 17.494,69 € e relativa ao mês de Junho de 2009.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação judicial do acto tributário relativo à taxa de promoção alegadamente devida ao Instituto da Vinha e do Vinho com referência ao mês de Junho de 2009.

  1. Ao contrário do que foi defendido nos autos pelo IVV e acolhido pelo Tribunal a quo na sentença ora posta em crise, o processo de investigação à taxa de promoção que foi iniciado pela Comissão (processo C43/2004) não é «totalmente irrelevante para os presentes autos e para a fundamentação da pretensão da Impugnante» - cf. página 19 da sentença proferida nos autos -, sendo que neste entendimento radica a confusão e erro de julgamento que ocorreu em 1.ª instância.

  2. Independentemente da eventual compatibilidade com o mercado comunitário da totalidade ou da parte do auxílio em questão relacionada com os vinhos produzidos em Portugal ou independentemente dos aspectos da mesma taxa que estão em investigação pela Comissão por suscitarem dúvidas quanto à respectiva compatibilidade com o mercado comum, verifica-se, no caso da taxa em causa dos autos, uma ilegalidade manifesta, decorrente da falta de notificação da medida à Comissão, ao arrepio do disposto no n.º 3 do artigo 88.° do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE) e consequente proibição de execução de semelhante medida, prevista no mesmo artigo.

  3. Essa ilegalidade é manifesta e incontestável, encontrando-se plenamente invocada e provada nos autos — cf. alíneas D), E) e F) dos factos provados e teor da decisão da Comissão Europeia de iniciar o procedimento contraditório C43/2004, junto aos autos pela A……………… com a sua petição inicial dada por inteiramente reproduzida pelo tribunal a quo na al. E) dos factos provados —, pelo que o Tribunal a quo não podia ter decidido no sentido em que decidiu na sentença ora posta em crise.

  4. É inegável que estamos perante um auxílio de Estado, porquanto as campanhas de promoção e de publicidade do vinho que beneficiam um determinado conjunto de empresas, são financiadas com receitas da taxa de promoção, sendo consequentemente possível identificar os três elementos que caracterizam um auxílio de Estado: (i) a vantagem económica (a vantagem económica para os operadores do sector vitivinícola decorre do facto de não terem de suportar o encargo com a organização da promoção dos seus produtos); (ii) para um determinado grupo de destinatários (a vantagem económica é atribuída a um determinado conjunto de empresas ou sector de actividade, in casu, o sector do vinho e dos produtos vinícolas); (iii) financiada através de recursos estatais (as receitas utilizadas provêm da cobrança da taxa de promoção que, como é claro, é um recurso estatal).

  5. A própria Comissão reconhece, nas decisões que se encontram juntas aos autos, que estamos perante um auxílio de Estado (cf. parágrafos 57, 102 ou 131 da decisão junta com a petição inicial e parágrafos 84, 113 ou 131 da Decisão de 20.07.2010, cuja junção aos autos foi ordenada por despacho prévio à sentença).

  6. A taxa de promoção, sendo una, consubstancia — conforme está demonstrado nos autos e vem até afirmado pela própria Comissão Europeia (cf. parágrafos 56 a 58, entre outros, da Decisão da Comissão e, por exemplo, parágrafo 113 da Decisão de 20.07.2010) —, a fonte de financiamento de auxílios de Estado.

  7. Ainda que esta taxa de promoção financie também outras medidas ou prestações que não revistam a natureza de auxílios, o que é facto é que ela constitui a única fonte de financiamento dos auxílios à promoção e à publicidade e à formação e, como tal, faz parte integrante dessa medida — cf., por exemplo, parágrafo 112 da Decisão de 20.07.2010.

    I. A implementação de uma medida parafiscal — in casu, a taxa de promoção — que consubstancia a única fonte de financiamento de um auxílio de Estado não notificado, com o qual tem uma relação de afectação obrigatória ou legal, de tal modo que o produto da taxa influencia directamente o montante do auxílio concedido, tem de ser notificada à Comissão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 88.° do TCE (actual artigo 108.º do TFUE) — cf. jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e pág. 48 do Parecer jurídico junto aos autos.

  8. Foi dada execução pelo Estado Português à taxa de promoção do vinho cobrada pelo IVV e às medidas financiadas pelo produto dessa imposição parafiscal, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão – cf. parágrafos 1 e 3 da aludida Decisão da Comissão.

  9. A Comissão Europeia inscreveu as medidas de auxílio e o respectivo modo de financiamento em causa nos presentes autos no conjunto de auxílios não notificados — conforme melhor decorre do parágrafo 3 da decisão junta com a petição inicial, que ora se transcreve: «(3) Resultando das informações prestadas ter sido dada execução ao dispositivo em causa, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão, foi o mesmo inscrito no registo dos auxílios não notificados».) L. A proibição de execução ou efeito suspensivo previsto no n.° 3 do actual artigo 108.° TFUE foi, inclusivamente, recordada pela Comissão a Portugal no parágrafo 147 da Decisão da Comissão que se juntou com a petição inicial.

  10. A taxa de promoção, não tendo sido notificada previamente à Comissão e continuando a ser mantida em execução, é necessariamente inválida até à prolação e trânsito final da decisão da Comissão sobre a respectiva compatibilidade com o mercado comum e manter-se-á inválida, relativamente ao período em questão nos autos, por mais regular e compatível com o mercado comum que se venha a considerar, a final, o auxílio investigado (cf. por exemplo, Ac. de 21.11.1991, FNCE, proc. C-354/90) e foi explicado na petição inicial que dá causa aos autos.

  11. «[U]ma decisão da Comissão que declare um auxílio não notificado compatível com o mercado comum não tem por consequência regularizar, a posteriori, os actos de execução que são inválidos por terem sido adoptados em violação da proibição contida nessa disposição [n.° 3 do art.° 88.º], porquanto «qualquer outra interpretação conduziria a favorecer a inobservância, pelo Estado-Membro em causa, dessa disposição e privá-la-ia do seu efeito útil.» — cf. Acórdão de 05.10.2006, TRANSALPINE ÖLLEITUNG IN ÖSTERREICH GMBH, processo C-368/04, n.° 41; cf.., ainda, Acórdão de 21.10.2006, processo C-261/01 e 262/02.

  12. A taxa de promoção não podia, por isso, ser cobrada. E tendo-o sido — como o foi (cf. parágrafo 132 da Decisão de 20.07.2010: «Portugal deu execução ilegalmente ao financiamento das campanhas de promoção genérica do vinho, financiadas por meio de uma taxa cobrada sobre os produtos nacionais e sobre os produtos importados dos outros Estados-Membros, em violação do artigo 108°, n.° 3, do TFUE») — impõe-se agora aos órgãos jurisdicionais nacionais que declarem a anulação dos actos de liquidação da taxa de promoção relativos ao período em questão, uma vez que o estabelecimento daqueles auxílios e daquela taxa de promoção, sem prévia pronúncia da Comissão Europeia, é contrário ao Direito Comunitário - o que, em concreto, se requereu nos presentes autos relativamente ao acto de liquidação da taxa de promoção do período de Junho de 2009 e veio a ser, com manifesto erro de julgamento, indeferido em primeira instância.

  13. «75. Enquanto a apreciação da compatibilidade de medidas de auxílio com o mercado comum é da competência exclusiva da Comissão, agindo sob a fiscalização do Tribunal de Justiça, os órgãos jurisdicionais nacionais zelam pela salvaguarda dos direitos dos particulares em caso de violação da obrigação de notificação prévia dos auxílios de Estado à Comissão, prevista no artigo 93.°, n.° 3, do Tratado [88.º, n. 3] (v. acórdão de 17 de Junho de 1999, Piaggio, C-295/97, colect., p. 1-3735, n.° 31).» - cf. parágrafo 75 do Acórdão do TJUE, de 21.10.2003, proferido no processo c-261/01 e 262/02.

    Q «53. A este propósito, importa recordar, por um lado, que cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais proteger os direitos dos particulares face a uma eventual violação, por parte das autoridades nacionais, da proibição de pôr em execução auxílios, a que se refere o artigo 93.°, n.° 3 [88.°, n.° 3], último período, do Tratado e que tem efeito directo (acórdãos, já referidos, Fédération nationale du commerce extérieur des produits alimentaires e Syndicat national des négociants et transformateurs de saumon, n.° 12, e Lornoy e o., n.° 30), e, por outro, que o Estado-Membro é, em princípio, obrigado a restituir os impostos cobrados em violação do direito comunitário (acórdão de 14 de Janeiro de 1997, Comateb e o., C-192/95 a C-218/95, colect., p. 1-165, n.° 20)» — cf. parágrafo 53 do Acórdão do TJUE, de 21.10.2003, proferido no processo C-261/01 e 262/02.

  14. «62. Importa ainda sublinhar que a ilegalidade de uma medida de auxílio, ou de uma parte dessa medida, em virtude da violação da obrigação de notificação prévia à sua execução, não é afectada pelo facto de a referida medida ter sido considerada compatível com o mercado comum por uma decisão final da Comissão.» - cf. parágrafo 62 do Acórdão do TJUE, de 21.10.2003, proferido no processo c-261/01 e 262/02.

  15. «63. Com efeito, o Tribunal de Justiça já declarou que, sob pena de prejudicar o efeito directo do artigo 93.°, n.° 3 [88.º, n.° 3] último período, do Tratado e de não respeitar os interesses dos particulares que os órgãos jurisdicionais nacionais...

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