Acórdão nº 6121/05.6TBLRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA |
Data da Resolução | 13 de Fevereiro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e mulher, BB, CC e mulher, DD e EE e mulher, FF, propuseram uma acção contra GG, HH e mulher, II, JJ, Lda. e KK, Lda., pedindo: (1) a sua condenação solidária no pagamento da quantia de 94.000.000$00 (€ 468.870,02), com “a correcção monetária devida pela perda do valor do dinheiro, desde 14 de Março de 1995 quanto à quantia de Esc. 40.000.000$00, e desde 15 de Julho de 1996 quanto à quantia de 7.000.000$00”, a fixar “em execução de sentença – a título de pagamento em dobro das quantias por eles recebidas”; (2) “em alternativa, caso assim se não viesse a entender”, a sua condenação solidária no pagamento da quantia de 47.000.000$00 (€ 234.435,01), também sujeita a correcção monetária nos mesmos termos já referidos – “a título de restituição em singelo das quantias por eles recebidas”; (3) “em qualquer dos casos”, a sua condenação solidária no pagamento da quantia de € 149,91, acrescida de juros moratórios à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento, a título de reembolso das despesas pagas com notificação judicial avulsa, portes de correio, certidões e certificado notarial.
Para o efeito, e em síntese, alegaram que, por contrato de 21 de Dezembro de 1994, os réus prometeram vender-lhes 35/113 de um prédio rústico e ceder-lhes os direitos sobre uma parcela de terreno, ficando incumbidos de fazer aprovar e licenciar o projecto de loteamento e as construções previstas, antes de se fazer a escritura de venda; que foram acordadas adendas ao contrato, em 15 de Julho de 1996 e em 29 de Fevereiro de 2000; mas que, mais de dez anos depois, os réus não obtiveram o licenciamento e as aprovações em causa, por forma a que fosse possível fazer a escritura, por motivos que lhes são imputáveis; que entretanto a ré GG vendeu o artigo rústico .../..., objecto dos contratos, a Joaquim Dimas Fernandes e à ré JJ; que os réus se colocaram “em situação de incumprimento total definitivo”, sujeitando-se “às sanções previstas nos artºs 440º, 441º, 442º, 798º, 799º, 800º, 801º e 804º, todos do Cód. Civil”.
HH e mulher, II, JJ – .., Lda. e KK, Lda. contestaram em conjunto.
Invocaram a ilegitimidade dos réus HH e mulher, II e contestaram a possibilidade de condenação solidária, por terem os demais réus diferentes participações no contrato; alegaram que o contrato de 1994, com a adenda de 15 de Julho de 1996, foi alterado, dando origem a um novo contrato, de 29 de Fevereiro de 2000; afirmaram não terem responsabilidade na falta de licenciamento do loteamento nem na inviabilização de qualquer contrato de compra e venda; alegaram incumprimento dos autores ou, subsidiariamente, impossibilidade de cumprimento.
Em reconvenção, pediram a condenação dos autores “a reconhecerem que os RR. têm a faculdade de fazerem suas todas as importâncias que lhes foram pagas ou, se assim se não entender, a pagarem aos RR. a quantia que se liquidar em execução de sentença relativa à sua comparticipação nas despesas com as ligações de águas, electricidade, gás e saneamento.” Afirmaram ainda os réus que, das quantias pagas pelos autores, receberam “a quantias total de € 134.675,43 (27 mil contos), porquanto a importância de € 99.759,58 (20 mil contos) foi recebida pela Ré GG” e que, portanto, é o montante de € 134.675,43 “que deve ser considerado pertencente aos ora contestantes”.
Subsidiariamente, pediram a declaração de nulidade ou anulação “dos negócios subjacentes aos contratos celebrados em 21/12/1994 e 29/2/2000”, por “inexistência ou impossibilidade do objecto”, com a restituição das quantias recebidas.
Requereram a intervenção do Município de Leiria, alegando direito de regresso quanto a determinadas quantias em que eventualmente viessem a ser condenados, que veio a ser admitida a fls. 236.
Também contestou a GG, sustentando que em 21 de Dezembro de 1994, já não era, nem proprietária, nem possuidora do prédio a que o contrato-promessa respeita. Quanto à parcela a ceder, disse, em síntese, ter prometido ceder os seus “direitos de uso e posse” sobre ela “para tornar viável e exequível o demais negócio pactuado no contrato (mas a que a Congregação é estranha, pois nele não quinhoa qualquer interesse)”, não ter deixado de cumprir nenhuma obrigação a que estivesse vinculada, estar a parcela ocupada pelos autores e não ter recebido nada dos mesmos, nada tendo portanto a restituir.
Concluiu que a acção deve improceder quanto a si.
Os autores replicaram, afirmando nomeadamente que os réus HH, por si e como procurador dos demais réus, e sua mulher, II “receberam já dos autores, há muito tempo, a totalidade das contrapartidas financeiras acordadas para o negócio, no valor de 47.000.000$00” e que é a ré KK, Lda. que ocupa a parcela a que o contrato respeita. Disseram ainda que “os autores sabem apenas que os negócios com os réus foram feitos sem determinação de parte ou direito e que a totalidade do preço já pago, no valor de 47.000 contos na moeda antiga, foi paga directamente ao réu HH, em nome deste, mas também sem determinação da parte que cabia a cada réu. Daí que tenha cabimento e não seja abusivo o pedido de condenação solidária de todos os réus sem excepção, cabendo a estes a divisão dessa responsabilidade, através do direito de regresso (…)”.
O Município de Leiria contestou.
2. A acção foi julgada parcialmente procedente pela sentença de fls.784, que decidiu: “– Condenar os réus HH, "JJ, Lda.", "KK – ... e "GG" a, solidariamente, pagarem aos autores a quantia de € 234.435,01 (duzentos e trinta e quatro mil, quatrocentos e trinta e cinco euros e um cêntimo), acrescida de juros à taxa de 4%, devidos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, – Absolver os réus HH, "JJ-…, Lda,", "KK" e "GG" do demais peticionado pelos autores, – Absolver a ré II da totalidade do peticionado pelos autores, – Absolver os autores do demais peticionado pelos réus reconvintes HH, II, "JJ, Lda." e "KK, SA".
Entendeu-se na sentença que foi celebrado um único contrato-promessa, embora referente a mais do que um objecto, definitivamente incumprido em consequência “do arquivamento final do processo de loteamento”, arquivamento esse que provocou a impossibilidade de cumprimento, não imputável a nenhuma das partes; e que, havendo sinal passado, deve o mesmo ser restituído em singelo, recaindo sobre todos os réus (com excepção de II) a obrigação de restituição, sendo indiferente que o réu HH tenha recebido os 47.000.000$00, porque ele actuou por si e em representação dos demais réus.
Os réus recorreram para o Tribunal da Relação de Coimbra. HH, JJ – ..., Lda. e KK – ..., Lda. recorreram conjuntamente; a GG interpôs recurso separado.
O acórdão de fls. 888 concedeu provimento parcial a ambas as apelações, revogando “a sentença na parte em que condenou as 1ª, 3ª e 4ª rés a restituir, solidariamente com o 2º réu, a quantia de trinta quatro mil novecentos quinze euros e oitenta e cinco cêntimos (€ 34.915,85 equivalentes a Esc 7.000.000$00), alterando-se a decisão relativamente a essa quantia para a condenação de apenas o 2ª réu à sua restituição” e “confirmando a parte restante da decisão na parte impugnada, valendo a condenação solidária quanto às 1ª, 3ª e 4ª rés e 2º réu somente em relação à quantia de cento noventa nove mil quinhentos dezanove euros e dezasseis cêntimos (€ 199.519,16 equivalentes a Esc. 40.000.000$00).” Manteve-se ainda a decisão relativa a juros, não apreciada por “exorbitar o âmbito dos recursos”.
Diferentemente do que se afirmara na sentença, a Relação concluiu que “foram celebrados dois contratos em união, um dos quais um contrato-promessa de compra e venda de 35/113 avos correspondentes por fim aos lotes ... e ... do prédio a lotear ..., e outro incidente sobre uma parcela a ceder pelas 3ª e 4ª rés, tudo para fins de construção pelos AA naqueles lotes e pressupondo que haveria ratificação do Plano de pormenor e licenciamento do loteamento”; que a compra e venda se tornara impossível, por causa não imputável às partes, por não ter sido aprovado o projecto de loteamento; que a cedência da parcela, isoladamente considerada, não se tinha tornado impossível; mas que, “porque ocorre uma união de contratos, e atendendo ao unitário interesse objectivo que domina essa união de contratos, justifica-se a resolução total dos negócios unificados, nos termos do nº 2 do artigo 793º do CC. A resolução está implícita nos pedidos de restituição ou perdimento das quantias entregues. Por força da extinção total dos contratos, as quantias pagas pelos AA devem ser-lhes restituídas, como a sentença ordenou.” Por fim, a Relação decidiu ainda que “existe solidariedade passiva de todos os RR subscritores, quanto à restituição das quantias que somam os 40 mil contos sinalizados. Nessa parte, não se mostra infringido o disposto no artigo 513º do CC. Quanto aos restantes 7.000 contos, inexiste solidariedade passiva e apenas o 2º réu está obrigado à sua restituição.” 3. Os réus recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça, também em dois recursos separados; os recursos foram admitidos como revista, com efeito devolutivo.
Nas alegações que apresentaram, os recorrentes HH, JJ – ..., Lda. e KK – ..., Lda. formularam as seguintes conclusões: “1 - No contrato celebrado entre Autores e Réus, em 29 de Fevereiro de 2000, ficou expressamente esclarecido que os promitentes cedentes intervinham nas seguintes qualidades: a) a "JJ, Lda.", como proprietária do prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ... (objecto de loteamento e do plano pormenor), a cuja parte se atribuiu o valor expresso de metade de quarenta mil contos; b) a ""GG", como possuidora da parcela de terreno com a área de 1 230 m2, referido na alínea b) do contrato promessa de compra e venda de 21 de Dezembro de 1994 (parcela de terreno com 15 ms de largura por 82 ms de comprimento); área que reconhecia passar a ser dos Autores, tal como havia antes recebido destes, em 1988, no contrato promessa então celebrado; com igual valor ao do objecto anterior.
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