Acórdão nº 399/10.0TCGMR.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB e mulher CC, pedindo para ser declarado dono de vários prédios, que melhor identifica, com a condenação dos réus a reconhecerem tal direito de propriedade e a absterem-se de qualquer acto violador do mesmo, bem como a desocupá-los e a pagarem-lhe indemnização a liquidar ulteriormente.

Alegando, para tanto, e em suma, que, sendo dono dos mencionados prédios, os réus ocupam dois deles, o que lhe causa prejuízos.

Citados os réus, vieram contestar, impugnando os factos pelo autor alegados, excepcionando a caducidade do direito de restituição de posse, a prescrição da invocada usucapião e do direito indemnizatório, mais alegando a aquisição do seu direito de propriedade, por usucapião, cujos requisitos melhor descrevem, sobre as parcelas que ocupam, que integram o lote …, com a área de 690 m2, dele fazendo parte uma área que está descrita no registo predial como fazendo parte do lote .., e que ocupam desde 1981. Assim pugnando pela improcedência da acção. E, por via da alegação dos factos tendentes à aquisição originária das ditas parcelas de terreno que ocupam, deduziram reconvenção onde peticionaram a constituição do seu direito de propriedade sobre os prédios em causa e o cancelamento dos respectivos registos prediais.

O autor replicou.

Foi proferido o despacho saneador, com fixação dos factos tidos por assentes e com organização da base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho de fls 633 a 635 consta.

Foi proferida a sentença que, julgando improcedentes a acção e a reconvenção, absolveu as partes dos respectivos pedidos.

Inconformados, interpuseram, autor e réus, sem êxito[1], recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães.

Ainda irresignados, vieram os réus pedir revista excepcional para este Supremo Tribunal de Justiça, que, como tal, e por via da contradição de julgados, foi admitida.

Tendo formulado, no que ora importa[2], na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª – O presente recurso de revista incide apenas sobre matéria de direito, procurando colocar ao sábio julgamento do Supremo Tribunal de Justiça estritamente uma questão de direito: pode uma actuação extrajudicial de uma parte (oposição feita pelo autor ao réu através de interpelações, ou, no limite, início de pagamento de encargos fiscais pelo primeiro) interromper a contagem do prazo da usucapião, obstando à aplicação do nº 2 do art. 1252.º do CC, de acordo com o qual a existência do corpus faz presumir o animus? 2ª – O acórdão recorrido valorou como factos susceptíveis da interrupção da usucapião factos ocorridos num plano extrajudicial em 2002, o que colide com o acórdão do STJ de 19 de Novembro de 2009, pois neste se pode ler que “a prescrição só se interrompe pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, atenta a regra constante do nº 1 do artigo 323.º do CC. Esta é aplicável à usucapião, por força do disposto no art. 1292.º do mesmo diploma legal”. 3ª - O fundamento da presente revista é a violação de lei substantiva, nos termos do artigo 722.º, nº 1, alínea a) do CPC, mais concretamente, a decisão recorrida consubstancia, desde logo, uma violação de lei substantiva por erro de interpretação e de aplicação do disposto nos artigos 323.º, nº1 e 1292.º, ambos do CC; 4ª - O acórdão recorrido padece de uma errada interpretação e aplicação dos citados preceitos legais, pois, não tendo sido feita prova nos autos da existência de uma qualquer citação ou notificação judiciais pelo Autor aos Recorrentes, deve considerar-se que a - suposta - oposição daquele a partir de 2002, por via das interpelações feitas por intermédio da testemunha DD, não teve o condão de interromper o prazo da usucapião; 5ª - Mais: nem as interpelações feitas pelo Autor, nem o pagamento por si dos encargos fiscais a partir de 2003 tiveram qualquer efeito no sentido de interromper o prazo da usucapião de que beneficiam os aqui Recorrentes, uma vez que se trata de actuações extrajudiciais que não revelam qualquer tipo de oposição por parte daquele, susceptível de interromper o cômputo do prazo de usucapião nos termos do artigo 323.º, nº 1, para o qual remete o artigo 1292.º, ambos do CC; 6ª - Na verdade, foi a errada interpretação das normas constantes dos artigos 323.º, nº 1 e 1292.º do CC, que inquinou toda a decisão recorrida, inviabilizando a aplicação da presunção do artigo 1252.º, nº 2, do mesmo Código e a obtenção do efeito jurídico de aquisição originária da propriedade por usucapião, ao abrigo do artigo 1296.° do referido diploma legal; 7ª - A matéria de facto dada como provada na sentença recorrida demonstrou amplamente tudo o que fora alegado pelos Recorrentes e que permite considerar preenchidos os requisitos enunciados no artigo 1263.º, alínea a), do Código Civil, a saber: a) Os Recorrentes ocupam, no sentido de prática reiterada de actos materiais, os terrenos objecto do dissenso judicial em causa; b) A posse dos Recorrentes é pública, sendo conhecida quer por todos os vizinhos, quer pelo Autor; c) Os Recorrentes praticam vários actos materiais correspondentes ao exercício do direito, em especial procedem à limpeza e conservação dos terrenos e à sua exploração agrícola, neles construíram um poço e realizaram a sua vedação face às áreas confinantes; 8ª - Isto significa que os Recorrentes mantêm a posse sobre os terrenos, de forma pública e pacífica, sem oposição de quem quer que seja e sem quebra de continuidade por um período que se estendeu desde 1984 até 2010, o que permitiu a aquisição do direito de propriedade; 9ª - Constitui um erro de aplicação da lei substantiva afirmar-se, como resulta da sentença recorrida, que em virtude de em 2002 apenas terem decorrido 18 anos sobre o início da posse não está verificado "o preenchimento cumulativo de todos os pressupostos necessários à aquisição...

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