Acórdão nº 01905/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Janeiro de 2014
Magistrado Responsável | ABEL ATANÁSIO |
Data da Resolução | 16 de Janeiro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Formação de Apreciação Preliminar Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I – Relatório A……………….. E OUTROS, recorrem, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão do TCA Norte datado de 07-08-2013, que, em sede da providência cautelar proposta contra B………………….
, S.A. e a AGÊNCIA DO AMBIENTE, I.P., negou provimento ao recurso jurisdicional interposto da sentença do TAF de Mirandela, datada de 05-03-2013, que julgou improcedente a requerida providência.
Os Recorrentes interpuseram a presente providência peticionando a condenação dos ora Recorridos “a edificar até ao final de Fevereiro de 2013, ou no prazo de um mês a contar da data da notificação da sentença que vier a ser proferida por este Tribunal, uma conduta em material de construção não poroso que conduza as águas residuais provenientes da ETAR de Torre de Moncorvo, por forma a que as mesmas não transbordem para os prédios rústicos dos requerentes (...), nem se infiltrem no respectivo solo, que se prolongue por uma distância não inferior a 100 metros desses terrenos, sob pena de não o fazendo no prazo estipulado ser concedido aos requerentes o direito de procederem a essa edificação, determinando-se em tal caso a interrupção do funcionamento da ETAR em questão durante o período necessário à conclusão da obra pelos requerentes (...)”.
O TAF de Mirandela julgou improcedente a providência requerida.
Interposto recurso para o TCA Norte, este confirmou a decisão recorrida.
Deste aresto, é pedida agora a admissão de recurso de revista excepcional nos termos do artº 150º do CPTA.
O Recorrente alega, em síntese, da seguinte forma: No presente recurso está em causa a apreciação de duas questões de direito que, pela sua relevância jurídica se revestem de importância fundamental, sendo ainda a admissão do recurso claramente necessária para uma correcta aplicação do direito, por omissão de pronúncia por parte do tribunal a quo quanto a questão alegada pelos recorrentes.
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A primeira questão de direito a apreciar e decidir pelo STA é a que consiste em saber se na reapreciação da matéria de facto pelo tribunal de recurso deve ser dada «prevalência ao princípio da oralidade, da prova livre e da imediação», como se sustenta na pág. 12 do douto Acórdão recorrido, citando-se em concordância a posição doutrinária defendida por António Geraldes, ou, se pelo contrário deverá vingar a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, expressa, entre outros, no Acórdão de 16.03.2011, proferido no proc. nr. 48/08.7TBVNG.P1.S1, segundo a qual «na reapreciação da prova, feita ao abrigo do disposto no art. 712.°, n.°s 1, al. a), e 2, do CPC, a Relação deve formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1ª instância, sem estar de modo algum limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova».
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Como bem sustenta o STJ, o tribunal de recurso deve formar a sua própria convicção «no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1ª instância», sem qualquer limitação resultante do princípio da imediação da prova.
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A tese defendida no douto Acórdão recorrido não tem o mínimo de correspondência na letra da lei, violando assim as normas que integram as alíneas a) e b) do nr. 1 e o nr. 2 do art. 712° do CPC ex-vi art. 1° do CPTA e ainda o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art. 655° 1. do CPC, ex-vi art. 1° do CPTA ao auto-limitar a sua competência de livre apreciação das provas, aplicando-se tal princípio tanto ao «tribunal colectivo» da 12 instância quanto ao da 22 instância e ao sufragar a «apreciação arbitrária da prova» efectuada pelo tribunal de 12 instância, a que se alude nos art.s 4° a 410 e nas conclusões P a 82 da alegação de recurso da sentença de 5.03.2013 4ª A segunda questão de direito que justifica a admissão do presente recurso de revista excepcional consiste em saber se, como se sustenta na pág. 12 do douto Acórdão recorrido, citando de forma concordante o Acórdão do mesmo Tribunal proferido em 8.03.2007 no recurso nr. 00110/06, «na reapreciação da matéria de facto ao tribunal de recurso apenas cabe um papel residual, limitado ao controlo e eventual censura dos casos mais flagrantes», ou seja, «só é permitido ao tribunal de recurso alterar a decisão sobre a matéria de facto, em casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e essa mesma decisão» - Acórdão recorrido pág.s 12/13, ou se pelo contrário, como se sustenta, entre outros, no Acórdão do STJ de 6.07.2011, proferido no proc. nr. 8609/03.4TVLSB.L1.S1, tem o tribunal de recurso competência para, na reapreciação da prova, alterar a decisão sobre a matéria de facto nos casos em que, não sendo embora manifesto o erro na apreciação da prova, verifique que ele existe.
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A tese sustentada por António Geraldes e à qual o tribunal a quo aderiu (122 pág. do douto Acórdão recorrido) de que «só deve ser alterada a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos» não temo mínimo de correspondência na letra da lei (art. 712° 1. e 2. do CPC ex-vi art. 1° do CPC), violando as normas que integram as alíneas a) e b) do nr. 1 e do nr. 2 do referido preceito legal.
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As hipóteses equacionadas nas alíneas a), b) e c) do nr. 1 do art. 712° do CPC, não são cumulativas, mas sim alternativas, pelo que o verbo «impor», a que se alude na 122 pág. do douto Acórdão recorrido (citando António Geraldes), aplica-se apenas aos casos enquadráveis na alínea b) do nr. 1 do art. 712° do CPC (nesse sentido o Acórdão do STJ de 4.11.1997, proferido no proc. nr. 98A319).
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A «modificabilidade da decisão de facto» é pois admitida pelo legislador não apenas quando os elementos fornecidos pelo processo impõem decisão diversa, «insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas» (al. 712° 1. b) do CPC), mas também nos casos em que (como o sub judice), «tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada nos termos do art. 685°- B, a decisão com base neles proferida» e os elementos fornecidos pelo processo impuserem uma decisão diversa da proferida.
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No caso em apreço partiu o TCA-Norte do pressuposto (de direito) errado de que a matéria de facto fixada pela 1ª instância «só deve ser alterada… nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos» (pág. 12 do douto Acórdão recorrido), ao contrário do sustentado e bem pelo STJ no seu Acórdão de 6.07.2011, proferido no proc. nr. 8609/03.4TVLSB.L1.S1 de que «o poder da Relação de alterar a matéria de facto, que lhe é conferido pelos arts. 690.°-A e 712.°, n.° 2, do CPC, não se limita aos casos de erro manifesto ou grosseiro ou a situações de ausência de suporte probatório.
Pode acontecer que exista suporte probatório, relativamente à matéria de facto em causa, que seja incorrectamente valorado, sem que essa incorrecta valoração se traduza em erro ostensivo ou manifesto».
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Cometeu assim o tribunal a quo, salvo o devido respeito, um claro e inequívoco erro de julgamento sobre uma questão de direito que pode e deve ser apreciada pelo STA em sede de revista excepcional, dado tratar-se de uma questão que pela sua relevância jurídica se reveste de importância fundamental, uma vez que tem aplicação não apenas no caso sub judice, mas sim...
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