Acórdão nº 272/2001.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Outubro de 2013
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I D instaurou acção com processo ordinário contra A C, A S (agora representada pelos seus herdeiros habilitados), C e CC, CRL (anteriormente CF, CRL e absolvida do pedido por sentença de homologação proferida a fls 95), peticionando a condenação solidária destes no pagamento da quantia de 6.383.593$00, acrescida de juros vencidos e vincendos; solidariamente a condenação nos montantes que se vierem a apurar em execução de sentença, acrescidos de juros vencidos e vincendos.
Para o efeito, alega que o primeiro Réu prestava serviços de contabilidade para a sua empresa de indústria de calçado, desde 1994 e mediante o pagamento da quantia mensal de 14.000$00, incumbindo-lhe calcular os valores para entrega ao estado, quer em termos de IVA, quer em termos de contribuições para a Segurança Social. Porém, o primeiro Réu apenas entregou na Segurança Social uma pequena parte dos montantes que lhe solicitava e eram entregues, tendo, em Fevereiro de 2001, tomado conhecimento de que, face à conduta daquele Réu, estavam em dívida 6.383.593$00, já que o primeiro Réu rasurava os títulos e colocava neles o seu nome completo, depositando-os na sua conta.
Os segundos e terceiros Réus, apesar das rasuras dos cheques, procederam ao respectivo pagamento, violando os deveres de zelo, cautela, previsão e diligência, pelo que são responsáveis solidariamente com os dois primeiros Réus.
Os dois primeiros Réus não apresentaram contestação.
A Ré C C, CRL contestou e no seu articulado impugnou invocando o desconhecimento da materialidade vertida na Petição Inicial e alegou que, sendo a conta da Ré C, nenhuma responsabilidade tem no pagamento dos cheques, pois carecia de legitimidade para recusar o seu depósito, concluindo pela absolvição da instância, por ilegitimidade, ou, caso assim se não entenda, pela improcedência da acção quanto a si e consequente absolvição dos pedidos.
A Ré C contestou referindo que o Autor assinou os cheques em causa e, por isso, não existe falsificação da assinatura, além do que tais cheques não foram depositados num dos seus balcões, mas na co-Ré, que é a instituição de crédito tomadora e tendo os cheques sido apresentados ao serviço de compensação do Banco de Portugal pela terceira Ré, não tendo havido devolução física à contestante, não lhe podem ser assacadas responsabilidades, tanto que, nos seus procedimentos, observou as instruções vigentes dadas pelo referido Banco de Portugal.
Na réplica o Autor concluiu como na Petição Inicial.
Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente com a condenação solidária dos Réus A C, os herdeiros habilitados de A S e C a pagarem ao autor D a quantia de trinta e um mil, oitocentos e quarenta e um euros e vinte e três cêntimos, acrescida de juros, à taxa em cada momento vigente para obrigações comerciais, desde a data da instauração da acção até efectivo pagamento.
Inconformada com o decidido a Ré C interpôs recurso de Apelação, o qual veio a seu julgado improcedente.
Vem de novo a Ré C recorrer, agora de Revista, apresentando as seguintes conclusões: - Por força da prova constante dos autos, designadamente documentos, que infirmam a matéria de facto dada como provada, o valor dos cheques emitidos pela recorrente, rasurados e retidos dada a truncagem no banco tomador é de 1.723.888$00.
- Por força do disposto nos artigos 264º nº2 e 514º, nºs 1 e 2, ambos do CPC deve o julgador conhecer oficiosamente os documentos que estão nos autos e daí retirar todas as consequências jurídicas.
- A sentença de 1ª instância e o acórdão recorrido que a confirma, enfermam de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos dos artigos dos artigos 668º, nº1 alínea d) e 724º, nº1, ambos do CPC.
- Através de prova por presunção judicial, dada a observação e conhecimento directos das rasuras pelo julgador, devia, por força do disposto nos artigos 349º e 351º, ambos do CC ser julgada afastada a culpa da recorrente.
- Deve ser julgada ilidida a presunção do artigo 799º, nº1 do CC.
- O banco tomador não actuou como representante legal nem como auxiliar da recorrente, nos termos do artigo 800º, nº1 do CC. É autónomo.
- O banco tomador é uma instituição de créditos com todos os direitos e deveres para exercer a sua actividade no território nacional, por força do disposto no artigo 5º do Dec. Lei 381/77, de 09/09 e artigo 3º alínea c) do Dec Lei 298/92, de 31/12.
- O banco tomador não representa nem é auxiliar da recorrente. É independente, actua nas suas próprias instalações e tem pessoal próprio.
- Determinam os artigos lº, nº1 e 5º, ambos do Dec. Lei 381/77, de 09/09, que são extintas as Câmaras de Compensação, passando as as atribuições que lhes cabiam para a competência do Banco de Portugal.
- Estabelece o artigo 92º, nº 1 alínea a) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras que compete ao BP nos termos da sua Lei Orgânica regular, fiscalizar e promover o bom funcionamento dos sistemas de pagamentos.
- No âmbito das competências legais que lhe foram conferidas do artigo 14º da Lei Orgânica do Banco de Portugal, aprovado pela Lei 5/98, de 31/01, o BP foi criado o pelo BP o SICOI, anexo à Instrução do BP nº 125/96.
- O artigo 15º do SICOI atribui ao banco tomador a responsabilidade pela verificação da regularidade do preenchimento de todos os cheques que lhe sejam apresentados, bem como pela retenção e guarda daqueles que não são apresentados fisicamente ao banco sacado.
- Nos termos do artigo 3º, nº1 do CCivil (CC) os usos que não forem contrários aos princípios da boa-fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine.
-O SICOI por força da lei que o determina consubstancia um uso bancário, um uso do comércio atendível, com força de lei.
- É inconstitucional o nº. 1 do artigo 799º do CC, quando interpretado, com uma interpretação no sentido de que há culpa de um banco sacado quando um cheque por si emitido é recebido verificado e retido na agência/balcão der um outro banco tomador por violar os princípios da segurança e da confiança no comércio jurídico, bem como da previsibilidade constantes do artigo 2º da CRP.
- Na sentença recorrida, foram violadas, entre outras, as disposições legais contidas nos artigos 3º nº 1; 349º; 351º; 799º nº 1 e 800º, nº 1, todos do CC, 264º, nº 2; 514º nºs 1 e 2; 668º nº 1 alínea a) e 724º nº 1, todos...
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