Acórdão nº 4706/10.8TBCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelTAVARES DE PAIVA
Data da Resolução10 de Outubro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I- Relatório AA – Restauração Ldª intentou a presente acção contra BB- … Ldª pedindo que esta fosse condenada a restituir-lhe em dobro , o que a autora lhe tinha entregue a título de sinal e reforço de sinal no âmbito de um contrato promessa , bem como a indemniza-la pelas despesas que foi tendo e de benfeitorias que foi fazendo na expectativa da efectivação do negócio .

Alega para o efeito no essencial o incumprimento definitivo do aludido contrato promessa por banda da Ré, circunstância que preencheu a cláusula resolutiva do contrato prevista no contrato a favor da autora.

A Ré contestou, impugnando os factos alegados pela autora e em reconvenção pede a perda a seu favor das quantias que a autora lhe tinha entregue , por entender que a resolução do contrato por parte da autora equivale á recusa em cumpri-lo ,preenchendo com isso outra cláusula resolutiva do contrato.

A autora replicou, impugnando a razão de direito da reconvenção ,concluindo pela sua improcedência e ampliou o pedido pedindo , agora, para o caso de se entender que a ré não teve culpa na frustração do negócio prometido, a condenação dela a restituir-lhe , em singelo as quantias que lhe tinha entregue.

Depois do julgamento foi dada respostas aos quesitos, tendo sido proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela autora, entre o mais condenando , com base na nulidade do contrato ( questão que foi oficiosamente conhecida) ,a ré a restituir à autora os €180.000,00 entregues a título de sinal , bem como a indemniza-la de uma série de outras despesas com juros e julgou improcedente a reconvenção.

A Ré não se conformou com esta decisão e interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que, pelo Acórdão de fls. 640 a 652 v, revogou a sentença da 1ª instância, substituindo por uma decisão, que julgou a acção e a reconvenção improcedentes.

A Ré não se conformou e interpôs recurso de revista.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões: Por declaração recebida pela recorrente em 26JAN10 (doe. 24) a recorrida declarou resolvido o contrato-promessa referido nos autos.

5.2.

Resolução que a recorrente considerou indevida e injustificada, o mesmo julgando o acórdão recorrido: "...é certo que, face aos factos provados nestes autos e apenas perante eles, se pode agora dizer, como aliás já se disse neste acórdão, que a autora, face à comunicação da CM de 29/10/2009, devia ter exibido a licença de utilização do prédio e ter-lhe explicado que o facto de o pedido ter sido titulado de alteração de uso se devia a um lapso seu, já que o uso a que destinava a fracção era já de restaurante. Depois disso e com o resultado dessa actuação é que eventualmente poderia vir a resolver o contrato-promessa, se a licença para a utilização do restaurante lhe tivesse a ser recusada ou se ficasse demonstrado que tal necessariamente aconteceria por culpa da ré." (negrito nosso).

5.3.

Após tal declaração e excedendo os factos provados o acórdão recorrido lança mão de afirmações conjecturais, hipotéticas e opinativas, acabando por decidir "que a resolução do contrato pela autora - que, nestes autos, perante os factos provados, se tem de considerar indevida, por falta de prova do fundamento invocado - se pode, ao mesmo tempo, considerar como uma resolução baseada numa representação não culposa do incumprimento da ré (parafraseia-se Brandão Proença), o que impede que se identifique a declaração de resolução com declaração tácita de recusa de cumprimento e por isso não justifica uma resolução do contrato pela ré.

Ou seja, nesta parte não tem razão a ré, pelo que a reconvenção não pode proceder.".

5.4.

Assim decidindo, o acórdão recorrido fez errado enquadramento jurídico dos factos e errada interpretação e aplicação da lei. Efectivamente, 5.5.

Da indevida resolução contratual efectuada pela recorrida resulta necessariamente o seu incumprimento contratual.

5.6.

Com a consequente perda das quantias pagas a título de sinal.

5.7.

E mesmo que se aceitasse, o que se não concede, que a resolução indevida não é equiparável à recusa em cumprir, nunca se poderia, no caso dos autos, considerar que a resolução se baseou numa representação não culposa de incumprimento da recorrente. Vejamos, 5.8.

A recorrida solicitou à recorrente que dos elementos solicitados pela DAE lhe fossem facultados os referentes aos pontos 1. e 2. do ofício, tendo-se a recorrente apressado a entregar-lhe o documento relativo ao n°. 1 e a comunicar-lhe que o do n°. 2 não era necessário.

5.9.

A recorrida nada mais voltou a solicitar à recorrente.

5.10.

A recorrida não utilizou junto da DAE nem o documento nem a informação a recorrente lhe facultara.

5.11.

Nem ali entregou nenhum dos restantes elementos pela DAE solicitados.

5.12.

A recorrida, que sempre contactou a recorrente através dos seus advogados, bem sabia que, se não apresentasse os documentos solicitados pela DAE nem confirmasse junto dela que estando a loja aprovada para restaurante não era necessária a autorização dos condóminos, o processo de emissão da licença específica para o exercício da restauração não teria seguimento.

5.13.

o Nada disso tendo feito não se vê que possa deixar de ser culposa qualquer representação de incumprimento da recorrente.

5.14.

A recorrida sabia bem que, quando resolveu o contrato, não havia sido indeferido o seu projecto, nem recusada a emissão da licença para o exercício da restauração.

5.15.

Não vem provado que a recorrente se tivesse recusado a prestar à recorrida qualquer informação, documento ou auxílio que ela lhe tivesse pedido.

5.16.

Quando decidiu resolver o contrato a recorrente estava confessadamente em incumprimento, já que deixara há 5 meses de pagar as prestações mensais do preço.

5.17.

Que a recorrente desistiu do seguimento do processo de emissão da licença para o exercício da restauração, é a conclusão lógica e indiscutível dos factos provados nos autos.

Assim sendo, Deve o acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que julgue procedente o pedido reconvencional, com a consequente perda a favor da recorrente das quantias que recebeu a título de sinal e seus reforços, por ser de JUSTIÇA.

A A apresentou contra-alegações concluindo: 1. A "BB- …, Lda", vem insurgir-se contra a parte do Acórdão que julgou improcedente o pedido reconvencional por si deduzido.

  1. A Recorrente vem agora alegar que a Recorrida desistiu do seguimento do processo camarário e que tal fundamento não foi considerado pelo tribunal "a quo".

  2. Nunca na Douta Contestação foi alegado pela Recorrente que tivesse existido, por parte da Recorrida, qualquer desistência do seguimento do processo camarário, nem nenhum facto surtiu provado que pudesse conduzir a tal conclusão.

  3. A Recorrida, para que o processo camarário pudesse prosseguir os respetivos trâmites, teria de se munir de documentos que não estavam ao seu alcance, como eram a licença de Utilização e a autorização dos condóminos.

  4. A loja em causa não estava licenciada para restauração, facto que impunha a alteração ao uso e a concordância dos condóminos.

  5. Uma das licenças do edifício não continha a fração em causa e a outra licença, a entregue pela Recorrente por duas vezes à Recorrida, apenas tinha as finalidades de habitação, estacionamentos e comércio.

  6. Não sendo a loja destinada a habitação nem a estacionamento, por exclusão de partes, só poderia destinar-se ao comércio, e COMÉRCIO NÃO É RESTAURAÇÃO! 8. Contudo, até se podia dar o caso de a Recorrida desistir do seguimento do processo camarário mas continuar com interesse na celebração do contrato definitivo, nem que fosse para não abdicar dos valores entretanto entregues à Recorrente, a título de sinal e reforços de sinal.

  7. Em lado algum, nem mesmo na remissão global contida no art. 58. da sua Contestação-Reconvenção, a Recorrente baseia o incumprimento da Reconvinda na alegada desistência do seguimento do processo camarário, pelo que esteve bem o Tribunal "a quo" ao entender que se tratava de matéria nova que não podia ser apreciada.

  8. A desistência do seguimento é uma conclusão que a Recorrente pretende, agora, à falta de melhor e mais válido argumento, lançar mão para tentar fazer valer um direito que sabe perfeitamente não lhe assistir.

  9. A Recorrida, que entregou à Recorrente a quantia de € 180.000,00 e que suportou diversas despesas e encargos, não iria, pura e simplesmente, desistir do seguimento do processo camarário e perder as quantias em causa.

  10. A Recorrida foi confrontada com diversas situações que a impediram de continuar na prossecução dos seus objetivos, expressos no contrato promessa de compra e venda.

  11. Alega a Recorrente que a Recorrida não entregou nenhum dos documentos solicitados junto do Departamento das Atividades Económicas da Câmara Municipal de Cascais (DAE), mas tal facto não foi alegado nos articulados, não ficou assente nem foi quesitado, sendo até contrariado pela prova testemunhal produzida.

  12. Existem, sim, factos que provam que a Recorrente não facultou à recorrida um dos elementos solicitados pela DAE: a autorização dos condóminos.

  13. Vem a Recorrida acusada de não ter confrontado a DAE com a licença de utilização. A licença em causa foi junta, tendo sido na sua base que a DAE aferiu a necessidade de alteração ao uso da fração e a consequente exigência de aprovação dos condóminos do edifício.

  14. Não fazia qualquer sentido, a Recorrida confrontar a DAE com a certidão camarária emitida pelo Departamento de Urbanismo: não havendo licença para restauração, teria sempre de existir uma alteração ao uso da ioja em causa e a alteração ao uso de uma fração autónoma carece da aprovação de maioria de 2/3 dos condóminos.

  15. Quem sabe se é ou não necessária a aprovação dos condóminos é o DAE, não a Recorrente ou a Recorrida e foi o DAE quem solicitou esse documento.

  16. Aliás, a confrontação da DAE com a certidão camarária do Departamento de Urbanismo foi feita em juízo e o seu...

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