Acórdão nº 10438/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução24 de Outubro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

O Ministério da Justiça inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. A sentença baseou-se na al. a) do nº l do art. 120º do CPTA, por ter sido considerada evidente a procedência da pretensão formulada no processo principal. E essa decisão, em primeira análise e na estrita literalidade do n.9 3 do art. 79. 5 do DL n.9 275-A/2000, de 9 de novembro, parece apresentar-se suficientemente acertada, na medida em que aí se prevê, muito liminarmente, que o serviço permanente é assegurado fora do horário normal de trabalho por piquetes de atendimento, unidades de prevenção ou turnos de funcionários, tendo os trabalhadores direito aos suplementos de piquete, de prevenção e de turno.

  1. No entanto, afigura-se que essa decisão, ora reclamada/recorrida, incorre, de certo modo ou pelo menos em parte, em erro de apreciação e de julgamento. Com efeito, não parece que se deva aceitar que tenha ficado demonstrado, tão bem ou de forma tão evidente, que o processo principal irá ser julgado procedente. A evidência da procedência da pretensão referida na ai. a) do nº l do art. 120º do CPTA tem de ser palmar, ostensiva, sem necessidade de qualquer indagação. O que não acontecerá no caso vertente.

  2. A alínea a) do nº l do art.120º deve ser lida não apenas no sentido de ser procedente a providência cautelar quando a pretensão a formular no processo principal se afigure manifestamente evidente, mas também no sentido inverso, do claudicar do processo cautelar, quando a pretensão do processo principal seja manifestamente ou, simplesmente, possa ser improcedente.

  3. Como está estipulado no artº 79º do DL nº 275-A/2000, o serviço na PJ é de carácter permanente e obrigatório e essa permanência é assegurada, fora do horário normal, por piquetes de atendimento e por unidades de prevenção.

  4. Está afirmado no preâmbulo do Desp. 248/MJ/96, que aprovou o Regulamento dos Serviços de Piquete e de Unidades de Prevenção ou Turnos de Funcionários, que "Os crimes e os seus agentes não conhecem horários de trabalho ou dias de descanso semanal,..." 6. Por outro lado e consequentemente, o pessoal ao serviço, com especial incidência no inserido na carreira de investigação criminal, está sujeito a um ónus ou dever especial de disponibilidade funcional, que implica a sua continuada referenciação/localização e a possibilidade de convocação ou de chamada a qualquer hora para assegurar a prossecução das atribuições da instituição.

  5. E para ressarcimento dessa especial onerosidade ou condição de exercício profissional, a tabela salarial está revalorizada, de forma geral e uniforme. Com efeito, de acordo com o nº 6 do mesmo art. 79º, 25% da remuneração base corresponde ao fator de disponibilidade funcional.

  6. Deste modo, é nestas circunstâncias e com este enquadramento factual e legal ou regulamentar que o caso terá de ser apreciado e decidido. Importará, essencialmente e no estrito cumprimento da lei, assegurar a missão e as atribuições dos departamentos policiais de investigação criminal de forma permanente, com recurso aos instrumentos ou às modalidades específicas de organização dos serviços e de prestação de trabalho.

  7. E salvo dispensa ou impossibilidade material devidamente justificada e autorizada, nenhum funcionário poderá ficar isento do ónus da disponibilidade funcional e do dever de comparência quando solicitado, nomeadamente a coberto do dever e da sujeição ao regime de prevenção.

  8. De outra forma, assistir-se-ia a uma óbvia violação da lei ou a uma clara limitação na aplicação da lei substantiva e legitimante, com fundamento numa pretensa imperfeição ou falha regulamentar, porque não se asseguraria suficientemente o caráter permanente e obrigatório do serviço. E a disponibilidade funcional dos trabalhadores ficaria, indevidamente, muito condicionada, apesar de legalmente estabelecida e remunerada.

  9. É neste contexto e em conformidade com o mesmo que se enquadram e deverão ser vistos os despachos visados, como complementos regulamentares ou orientações procedimentais, de natureza administrativa, mas suportados no desenvolvimento das disposições legais estatutárias. Ainda que se possa reconhecer alguma imperfeição ou menor previsão quer do Regulamento quer dos despachos, o que se visa garantir é o cumprimento da lei positivada. Em caso de necessidade declarada, serão sempre possíveis aperfeiçoamentos no sentido da sua melhor conformação com a lei, mas nunca para o seu desvirtuamento ou redução de âmbitos de aplicação.

  10. É manifestamente evidente que a suspensão dos despachos, ainda que, por agora, somente em relação ao Autor, tornará impossível a sua chamada ou convocação para participar em ações ocasionais ou esporádicas de investigação criminal, que são as tipicamente asseguradas pelas prevenções, e que, de forma imprevista e em última avaliação, acabem por carecer ou ter de envolver recursos humanos reforçados ou mais alargados.

  11. E mais se evidenciará essa ilegalidade e inconveniência decorrente da suspensão das normas em apreço se se perspetivar ou prefigurar que essa suspensão venha a ser alargada a todos ou a um número significativo de elementos da carreira de investigação criminal, em geral e em cada unidade orgânica. O que, aliás, se deverá ter por muito provável, por arrastamento e com o apoio na precedência jurisprudencial desta sentença, se a mesma, claro, for mantida, tendo em conta o ambiente reivindicativo que se vive nesta Polícia neste domínio de modalidades de prestação de serviço e da remuneração de trabalhos suplementares.

  12. Se assim acontecer, ficarão seguramente prejudicadas múltiplas acções importantes e inadiáveis, em notório prejuízo da luta contra a criminalidade e os criminosos.

  13. Em cumprimento e ao abrigo da lei, em casos de ações investigatórias não suscetíveis de prévia e atempada definição do regime de prevenção e afetação do pessoal a integrar, como é o caso, terá de ser aceite a designação pontual e imediata de trabalhadores considerados necessários.

  14. Questão diferente, mas que até poderá ser a causa primeira ou a que está na origem destes procedimentos reivindicativos e impugnatórios, é a remuneração a abonar por essa prestação de serviço, seja em valor superior seja a título de trabalho extraordinário. Mas dessa matéria não se deverá aqui curar de tratar.

  15. Sobre esta matéria, tem-se a aditar que, a propósito de uma providência cautelar intentada pela associação sindical-ASFIC/PJ, o TAF do Porto decidiu no sentido de que "[...] uma eventual decisão de concessão de providência cautelar, com o fundamento na referida alínea a) do nº l do artigo 120º do CPTA, terá de radicar na existência de uma situação de manifesta intensidade dofumus boni iuris que, em situação de manifesta procedência da pretensão material do requerente, vale por si só. Teria assim que ser patente, ser quase inequívoca e inquestionável a ilegalidade das normas para que qualquer providência cautelar fosse concedida com base no norma em apreço" sublinhado nosso (acórdão do TAF do Porto, Proc.e n.s 1026/04.0BPRT).

  16. É sobre a temática do trabalho suplementar e da sua retribuição, pode ver-se que é jurisprudência dominante o reconhecimento de que esse trabalho seja prestado e, consequentemente remunerado, de acordo com os despachos impugnados.

  17. Assim e secundando essa jurisprudência, "[...]o serviço prestado pelo pessoal da policia judiciária, que se enquadre no grupo de investigação criminal, quando prestado fora do...

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