Acórdão nº 0134/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução12 de Setembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I-RELATÓRIO 1.

A…………., com os sinais dos autos, interpôs recurso contencioso de anulação do Despacho de 18/12/2002, que determinou a reposição de 116.096,37 €, proferido pelos PRESIDENTE E VOGAL DO CONSELHO DIRECTIVO DO INSTITUTO NACIONAL DE INTERVENÇÃO AGRÍCOLA (INGA) no TAF de Ponta Delgada.

1.1.

Proferida sentença nesse Tribunal, que concedeu provimento ao recurso, com a consequente anulação do Despacho, foi a mesma objecto de recurso para este STA que, por Acórdão de 22/10/2008 (fls. 398/405), revogou a sentença recorrida.

1.2.

Remetidos os autos ao TAF de Ponta Delgada foi proferida (nova) sentença que julgou procedente o recurso, anulando o Despacho sob recurso.

  1. Inconformados com esta sentença, os PRESIDENTE E VOGAL DO CONSELHO DIRECTIVO DO INGA dela interpõem recurso de agravo, sobre o qual recaiu despacho de admissão (fls. 426), ao abrigo dos artigos 734.º, 736.º e 740.º, n.º 1, do CPC e 105º da LPTA.

  2. Os Recorrentes apresentaram ALEGAÇÕES, com as CONCLUSÕES seguintes: “A. A decisão final impugnada nos presentes autos é tomada ao abrigo de disposições do Direito Comunitário.

    1. Ao abrigo do princípio da aplicação descentralizada do Direito Comunitário, o juiz nacional é o juiz comum do contencioso comunitário e, enquanto tal, deve assegurar na ordem interna o respeito por todas as normas e princípios do Direito Comunitário, de entre os quais, assume particular relevância, o princípio do Primado do Direito Comunitário sobre as disposições nacionais, o elaborado e proclamado de há longos anos a esta parte, pela jurisprudência do Tribunal de Justiça C. A jurisprudência do Ac. Simmenthal, de 09.03.1968, reafirma o princípio do Primado e sua estreita correlação com o da aplicabilidade directa.

    2. Nos termos do art. 8°, n.° 1, do Reg.(CEE) 729/70, a recuperação dos montantes indevidamente pagos, somente na falta de disposições comunitárias, será decidida aplicando o direito nacional, sê-lo-á, porém, sem prejuízo dos limites impostos pelo Direito Comunitário, no sentido de que as regras previstas pelo direito nacional não podem, na prática, tornar impossível ou excessivamente difícil a recuperação dos auxílios indevidos (Acórdão Deutshe MilchKontor, Procs. 205/82 a 215/82 e Acórdão Martin Huber, de 19.9.2002, Proc. C-336/2000, do Tribunal de Justiça das Comunidades).

    3. Os controlos foram efectuados por força do Reg.(CEE) n.° 4045/89, que diz respeito ao controlo da realidade e da regularidade das operações que façam directa ou indirectamente parte do sistema de financiamento pelo FEOGA, secção «Garantia», com base nos documentos comerciais dos beneficiários ou devedores», tendo em vista a detecção de irregularidades no âmbito do sistema de financiamento do FEOGA, secção «Garantia».

    4. O regulamento 4045/89 prevê que os controlos possam ser efectuados passado mais de um ano desde o pagamento da ajuda e prescreve um prazo mínimo de 3 anos, no decurso do qual os beneficiários são obrigados a conservar a documentação comercial que sustentou o pagamento da ajuda, sem prejuízo, no entanto, da possibilidade de os Estados-membros poderem prever um prazo mais longo.

    5. O Estado português no art. 8.º, do D.L. 185/91, que regulamenta entre nós o Reg. 4045/89, estabelece para realização dos controlos os prazos da legislação comercial, ou seja 10 anos.

    6. O recorrente dispunha, pois, de um prazo de 10 anos para pedir a devolução das ajudas indevidamente pagas.

      1. Os Regulamentos Comunitários prevêem um regime de controlos “a posteriori” das ajudas comunitárias do FEOGA-GARANTIA, porque estas são intervenções de mercado que, por natureza, deverão ter repercussão imediata nos preços ao consumidor final.

    7. O pagamento da ajuda é efectuado em face do pedido instruído com a documentação exigida, mas a verificação sobre a realidade e regularidade do pedido e da respectiva documentação não é condição do pagamento da ajuda que é logo colocada à disposição do beneficiário, embora este fique sujeito à verificação da realidade e regularidade do que declarou para obter a ajuda. (Acórdão de 06-12-2005, do Pleno da Secção do CA, Proc. n.° 0328/02) K. O artigo 141.º do CPA não pode ser aplicado se conduzir a solução desconforme com as normas dos regulamentos comunitários acima mencionadas, pelo que temos de conceder prevalência à aplicação das normas comunitárias e afastar a aplicação da norma nacional. (Acórdão de 06-12-2005, do Pleno da Secção do CA, Proc. n.° 0328/02) L. Por conseguinte, a douta decisão recorrida viola o art. 8°, n.° 1, do Reg.(CEE) 729/70, o art. 4° do Reg. 4045/89 e art. 8°, do D.L. 185/91.

      Termos em que, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, anulada a douta sentença recorrida, com todas as legais consequências. Assim se fazendo JUSTIÇA.” 4.

      O Recorrido deduziu CONTRA-ALEGAÇÕES com as seguintes CONCLUSÕES: “(

    8. O recurso interposto pela autoridade administrativa é limitado a uma questão de direito, pelo que a decisão sobre a matéria de facto está definitivamente assente.

      (B) Integra a decisão sobre a matéria de facto a constatação (factual) do julgador de que «os pressupostos (certos ou errados) em que se apoiou a decisão que ordena a reposição eram já verificáveis aquando da concessão dos subsídios», sendo este juízo o resultado da observação (empírica) dos factos e da prova produzida em 1.ª instância (art. 351° do Código Civil).

      (C) Ao contrário do que o agravante pretende induzir, a solução dada pela jurisprudência por ele citada não é aplicável à situação fáctica do caso vertente, na medida em que, neste caso, ficou comprovado que os pressupostos das ajudas eram já verificáveis antes da sua concessão, independentemente de qualquer controlo “a posteriori”.

      (D) O acto impugnado fundamenta-se apenas em pretensas irregularidades formais relativas aos certificados de ajudas; acontece que estes tipicamente integram o procedimento que culmina com o acto de concessão das ajudas, cujos pressupostos eram verificáveis aquando da sua concessão, nem o agravante coloca isto em causa.

      (E) Tal como decidido na douta sentença recorrida, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 140°, n°1, b), e 141°, n°1 do CPA e 28° da LPTA, o acto impugnado tem a natureza de um verdadeiro acto revogatório e, portanto, é ilegal, porque proferido sete anos após a concessão das ajudas, ou seja, muito para lá do prazo de um ano previsto naqueles preceitos. (Ac. STA de 20/10/2004, rec. 0301/04).

      (F) Estando comprovado que os pressupostos do pagamento eram verificáveis “ex ante”, independentemente de qualquer controlo “a posteriori”, não se percebe em que medida é que se pode afirmar que era impossível ou muito difícil a recuperação de auxílios indevidos, através dos controlos prévios expressamente previstos na lei comunitária.

      (ci) É totalmente falso afirmar que a disposição do art. 141°, n°1 do CPA viola o primado do direito comunitário, já que os valores da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima também fazem parte da ordem jurídica comunitária. — (Acórdão Martin Huber, TJC de 19/09/2002, P. C-336/2000) (H) Salvo o devido respeito, também não deixa de impressionar a ideia que se foi formando em alguma jurisprudência, citada pelo agravante, de que o prazo de reposição das ajudas consideradas ilegais é equiparado ao prazo de 10 anos para o comerciante conservar a sua escrituração mercantil (art. 40° do Cod. Com., art. 118°, n°2 do CIRS e art. 123°, n°4 do CIRC).

      (I) Na verdade, o prazo mais alargado de conservação de documentos não tem necessariamente de coincidir com os prazos de controlo, e muito menos com o prazo de revogação de actos administrativos anuláveis (1 ano) ou de caducidade do direito à liquidação de tributos (4 anos), como resulta, respectivamente, do arts 141º, n°1 do CPA, e dos arts. 92°, n°1 do CIRS e 101° do CIRC, por remissão para os arts. 45° e 46° da LGT, conjugados com o art. 36°, n°1 do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (republicado pela Lei n°50/2005, de 30/08).

      (J) O dever de conservação da escrituração por 10 anos tem primacialmente a função de assegurar a prova no tráfego jurídico mercantil e o direito de exame de documentos, sendo estabelecido no interesse de diversos interessados (Estado e particulares), como também resulta do disposto nos arts. 42° a 44° do Cód. Com.

      (K) Sendo portanto ilegítimo e abusivo daí extrair outras consequências, não previstas na lei, que se desviam manifestamente de todo o regime...

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