Acórdão nº 608/06.0TBMGL.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Setembro de 2013
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 12 de Setembro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I G, LDA intentou acção com processo ordinário, contra M, SA e ESTADO PORTUGUÊS (Réu este que veio a ser absolvido da instância em sede de despacho saneador), peticionando a condenação dos Réus: a) A reconhecerem a Autora como dona e legitima possuidora das máquinas penhoradas, abstendo-se de perturbar tal direito; b) A pagarem solidariamente à Autora a quantia de €201.720, acrescida daquela que vier a ser liquidada nos termos articulados, bem assim de juros de mora desde a citação até integral e efectivo pagamento; Ou, caso, assim não se entenda, c) Ser a Ré M condenada a pagar à Autora a quantia de €201.720, bem como os acréscimos peticionados na alínea anterior; Ou, caso, assim não se entenda, d) Ser o Réu Estado Português condenado a pagar à Autora a quantia de €201.720, bem como os acréscimos peticionados na alínea anterior; Para tanto, a Autora alega que no âmbito de uma dada execução que a Ré M instaurou contra G, Lda., foram indevidamente penhorados e removidos uma máquina escavadora e um martelo demolidor, bens estes de sua pertença que se encontravam nas suas instalações, em virtude de anteriormente os ter comprado à dita sociedade executada; disso a exequente foi informada e estava ciente no acto da penhora com remoção, sabendo que esta causaria prejuízos à Autora, cuja indemnização reclama, quer pela privação de uso e fruição da escavadora e martelo, quer pela desvalorização entretanto sofrida por este equipamento, tudo no montante global liquidado de € 201.720, acrescido de igual prejuízo, a liquidar oportunamente, enquanto perdurar aquela privação.
Contestou a Ré M, defendendo que a Autora nunca quis receber a máquina escavadora (e não também o martelo porque não deduziu embargos de terceiro relativamente a este), apesar de liminarmente ordenada a sua restituição provisória mediante prestação de caução no âmbito dos respectivos embargos de terceiro, assim fazendo perdurar o lucro cessante que agora reclama. Concluiu pedindo a condenação da Autora como litigante de má fé em multa e indemnização, esta não inferior a € 7.500 a seu favor.
A Ré M apresentou articulado superveniente, invocando que a partir de 7 de Julho de 2006 os bens penhorados em causa deixaram de estar na disponibilidade daquela e do seu fiel depositário, independentemente do levantamento da penhora ordenado por despacho de 4 de Julho de 2006, passando a ficar apreendidos (em Fevereiro de 2007) à ordem da massa insolvente da G, Lda., nos autos de Insolvência nº000/06 do Tribunal Judicial de ….
Foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente e a condenar a Ré M a reconhecer que a Autora é dona e legitima possuidora das máquinas penhoradas identificadas, abstendo-se de perturbar tal direito e a pagar à Autora a quantia de € 43.560 (quarenta e três mil, quinhentos e sessenta euros), com juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento e absolveu-se a Autora do pedido de condenação em multa e indemnização como litigante de má fé.
Inconformadas, Autora e Ré recorreram, tendo sido ambas as Apelações julgadas improcedentes.
De novo recorreram Autora e Ré, agora de Revista, apresentando as seguintes conclusões: Da Ré: - Resulta das concretas circunstâncias que ocorreram no momento em que teve lugar a diligência de penhora com remoção dos bens penhorados que a transacção invocada pelo legal representante da recorrida no momento não se afigurava credível, pelo que não tinha igualmente credibilidade a invocada propriedade da máquina.
- Com efeito, tendo o legal representante da recorrida conhecimento da existência da dívida e do penhor desde Dezembro de 2002, e sabendo também que nos meses subsequentes a máquina mantinha o ónus do penhor, pois a dívida continuava por liquidar, não era credível que tivesse comprado à executada G, Lda a máquina em referência.
- Por outro lado, resulta da alínea S dos factos assentes e das respostas dadas aos pontos 26 a 30 da base instrutória que os documentos que exibiu no momento da remoção, além de serem diversos da realidade, não ofereciam credibilidade, dado o seu caracter contraditório e equívoco, quer em termos de valores, quer de datas e meios de pagamento.
- Por consequência, não se afigurará como culposa, em qualquer das modalidades, a conduta da recorrente nos referidos autos de execução, antes resultando que a mesma agiu de acordo com o disposto nos arts. 831° nº1, 848° nº1, 2 e 3, 840° nº1 e 285º nº1 e 3 do C.P.Civil, na redacção ao tempo em vigor, dentro dos limites do legítimo de direito de acção que a constituição e a lei adjectiva lhe facultavam.
- Resulta ainda não ocorrer qualquer falta do dever objectivo de cuidado, tanto no aspecto objectivo como no subjectivo e concreto, inexistindo "culpa in agendo" ou abuso de direito de acção por parte da recorrente, antes devendo ser considerado que esta fez uso legítimo do disposto no art. 20° do C.R.P. e arts. 2° e 831º do C.P.Civil, na redacção do D.L. 38/2003 de 31/3, não estando assim reunidos os pressupostos que a façam incorrer na obrigação de indemnizar a tal título.
- Por outro lado, conforme resulta da resposta data ao ponto 17º da Base Instrutória, não logrou a recorrida provar quais os danos que em concreto decorreram da alegada privação da máquina, pois não logrou provar que tivesse trabalhos destinados para a mesma.
- Por consequência, inexistirá em absoluto qualquer obrigação indemnizatória por parte da Ré pois de facto não se provou a existência de qualquer prejuízo, o que é consentâneo com o tipo de bem em causa - máquina industrial - que não é passível de uso constante e indiferenciado como se de um veículo automóvel ligeiro se tratasse.
- Por outro lado, tendo resultado provado, por força da resposta dada ao ponto 40 da base instrutória, que a máquina esteve sempre imobilizada e sem qualquer tipo de utilização, não terá ocorrido qualquer enriquecimento da recorrente, uma vez que não a utilizou nem dela retirou qualquer proveito.
- Assim, sendo a medida do empobrecimento a medida do enriquecimento, e não tendo ocorrido este, não terá aplicação “in casu” o instituto do enriquecimento sem causa, pelo que carecerá de fundamento o arbitramento de qualquer montante indemnizatório a tal título.
- Conforme resulta da alínea L) dos factos assentes o Tribunal, no âmbito dos embargos em causa, determinou por despacho de 17 de Março de 2004, que não foi objecto de qualquer reclamação ou recurso, a restituição provisória à recorrida da máquina escavadora e martelo em causa, mediante a prestação de caução através de meio idóneo de valor equivalente à quantia exequenda.
- Por força da resposta negativa dada ao ponto 53 da base instrutória, corroborada com o largo acervo documental junto na fase instrutória, resultou provado, que a recorrida tinha oportunidade, possibilidade e meios para prestar a referida caução dentro do vasto leque que o permite o nº1 do art. 624° do CCivil - Assim, ao não prestar tal caução, tendo meios, oportunidade e condições para o fazer, como desde logo resulta dos documentos de fls. 1098 a 1128 dos autos, a recorrida concorreu, com tal omissão, para o surgimento do dano cujo ressarcimento vem posteriormente a invocar.
- Por consequência, a entender-se que houve danos, existe culpa da recorrida na sua ocorrência, cuja indemnização vindica, a par de manifesto abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”.
- Aplicou assim de forma indevida o douto acórdão o disposto nos arts. 473°, 479° e 483° do C.Civil, uma vez que não ocorreram os pressupostos subjacentes à aplicação do instituto do enriquecimento sem causa, nem os relativos à obrigação de indemnizar em sede de responsabilidade extracontratual.
- A não se entender assim, sempre deveria o douto acórdão ter aplicado os arts. 570° nº1 e 334° do C.Civil, excluindo de todo qualquer obrigação indemnizatória por parte da recorrente.
Da Autora: - Considerando os factos que o tribunal de 1ª instância elencou corroborados pelo Acórdão recorrido, nomeadamente o facto, provado, de que...
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