Acórdão nº 350/05.0GASPS.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Outubro de 2008
Data | 15 Outubro 2008 |
Órgão | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
O Digno Magistrado do Ministério Público acusou o arguido …, solteiro, pedreiro, nascido a 9.1.79, filho de … e de …, natural da freguesia de C…, S. Pedro do Sul, onde reside no Lugar de A…, imputando-lhe a prática, em autoria material e concurso real, dos seguintes ilícitos: - um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo artº 137º, nºs 1 e 2, por referência ao artº 15º, al. b), ambos do CP; - uma contra-ordenação p. e p. pelo artº 13º, nºs 1 e 3 do CE; - uma contra-ordenação p. e p. pelos artºs 27º, nºs 1 e 2, al. a)-3º e 146º, al. i), ambos do CE; - um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nº 2 do DL 2/98 de 3.1.
Os demandantes …, …, …, … e …, respectivamente viúva, filhos e mãe do falecido …, deduziram pedido indemnizatório contra o arguido, contra …, alegada proprietária do veículo conduzido pelo arguido, e contra o Fundo de Garantia Automóvel (doravante FGA). Pedem a condenação destes no ressarcimento de danos patrimoniais, e bem assim a compensação de danos de carácter não patrimonial, ambos alegadamente sobrevindos ao ofendido/falecido, e aos próprios demandantes pessoalmente.
O demandado FGA deduziu contestação ao pedido indemnizatório – cfr. fls. 409 a 413 . Efectuado o julgamento foi proferida a sentença de fls.711 na qual se decidiu condenar o arguido por ….
- um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo artº 137º, nº 1 do CP, na pena de 20 meses de prisão; - um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nº 2 do DL 2/98 de 3.1, na pena de 4 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico na pena conjunta de 22 meses de prisão.
Ao abrigo do disposto no artº 50º, nº 1 do CP, foi-lhe suspensa a execução da pena pelo período de 3 anos.
- uma contra-ordenação p. e p. pelo artº 13º, nºs 1 e 3 do CE, na coima de 180 euros; - uma contra-ordenação p. e p. pelo artº 27º, nºs 1 e 2, al. a)-1º do CE, na coima de 150 euros.
absolver a demandada … da totalidade do pedido civil contra si deduzido.
condenar o demandado … e, em solidariedade com este, o Fundo de Garantia Automóvel (FGA), a pagarem a quantia global de 167.712 euros (sendo no caso do FGA, por força da franquia de 299,28 a cargo do arguido, somente no valor limite de 167.412,72 euros), repartidos do seguinte modo: 1 – aos demandantes …, …, … e …, a quantia de 30.000 euros, a título de compensação pelo dano da perda da vida do falecido marido/pai; 2 – à demandante … a quantia 17.500 euros a título de compensação dos danos não patrimoniais por si sofridos; 3 - à demandante … a quantia 10.000 euros a título de compensação dos danos não patrimoniais por si sofridos; 4 - ao demandante … a quantia 10.000 euros a título de compensação dos danos não patrimoniais por si sofridos; 5 - ao demandante … a quantia 12.500 euros a título de compensação dos danos não patrimoniais por si sofridos; 6 – à demandante … a quantia de 87.712 euros (86.400 euros + 1.312 euros), a título de indemnização por danos patrimoniais (prejuízos emergentes e lucros cessantes).
condenar o demandado … e, em solidariedade com este, o FGA, a pagarem juros sobre os montantes referidos em d), contados desde o trânsito em julgado da presente sentença, e até efectivo e integral pagamento, à taxa legal então em vigor, e que presentemente é de 4%.
absolver os demandados … e FGA do remanescente do pedido contra si formulado, isto é, da importância de 303.300,72 euros Inconformado, recorreu o Fundo de Garantia Automóvel, concluindo a sua motivação do seguinte modo: 1.
O acidente em discussão nos presentes autos ocorreu quando o arguido circulava com o seu veículo, em parte, pela metade esquerda da faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário.
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O arguido circularia, sensivelmente, pelo meio da estrada altura em que colheu o peão que, por sua vez, caminhava também ele por meio da estrada.
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A conduta do peão, ao caminhar pelo meio da estrada foi, igualmente, motivadora da eclosão do acidente.
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O peão contribuiu com culpa para a produção do acidente.
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Tendo em conta a medida da contribuição de cada um dos intervenientes na produção do acidente, deverá a responsabilidade ser repartida entre ambos na proporção de 75% para o arguido e 25% para a vítima.
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A douta sentença ao considerar a culpa única e exclusiva do arguido na produção do acidente violou, assim o disposto nos artigos 483º e 487º do Código Civil.
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Dos factos provados resulta unicamente que a vítima tinha 54 anos à data do acidente, era saudável, trabalhador e tinha alegria em viver.
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Apenas a viúva e o filho … integravam o agregado familiar do malogrado Sérgio.
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Os autos não fornecem quaisquer outros elementos que permitam ao tribunal um juízo que vá além do de normalidade na fixação dos montantes indemnizatórios.
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Os factos considerados pelo tribunal a quo não foram objecto de um adequado juízo de equidade e não são, na opinião do recorrente, suficientes para atribuir os valores que foram fixados.
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Entende o recorrente que a indemnização fixada a título de dano patrimonial pela perda do direito à vida não deveria ir além dos 30.000 €.
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Ademais não está devidamente provado qual o impacto que as lesões decorrentes do acidente em discussão provocaram na vida de cada um dos demandantes, daí que se refira que o tribunal a quo não poderia ir além dum juízo de normalidade.
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Deverão assim os valores das indemnizações arbitradas ser reduzidos, não ultrapassando os 10.000€ para a demandante …(viúva), 7.500.00 € para o demandante … e 5.000,00 para cada um da demandante … e …, a título de danos patrimoniais.
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Provado que está a idade da vítima (54 anos) à data do acidente, que auferia uma remuneração mensal, como trabalhador por conta própria, de 800.00 €, e que veio a falecer na sequência do acidente, deixando, por isso de contribuir para o agregado familiar é inquestionável o direito à indemnização a título de lucros cessantes.
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Contudo os factos considerados pelo tribunal a quo não foram objecto de um adequado juízo de equidade.
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Entende o recorrente que a indemnização fixada a título de dano patrimonial pela perda do rendimento pela contribuição da vítima para o agregado à demandante … não deveria ir além dos 45.000.00€.
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Ficou demonstrado nos autos que a Companhia de Seguros Império Bonança SA efectuou o pagamento de um capital de remição de 22.485,83 € e um subsídio de funeral de 2.997,60 à demandante ….
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Tal informação foi prestada na sequência do pedido formulado pelo tribunal à referida seguradora, não tendo, depois, considerado o seu teor.
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O capital de remição pago pela dita seguradora, no âmbito do seguro de acidentes de trabalho, tem o mesmo objectivo final que o montante indemnizatório atribuído pelo tribunal a quo a título de indemnização por lucros cessantes fixada no ponto 6. da alínea e) da parte decisória da sentença.
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O tal montante sempre haveria que deduzir o capital de remição já pago pela seguradora no âmbito dos pagamentos efectuados pela cobertura de acidentes de trabalho.
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As despesas de funeral referidas no ponto 34 dos factos provados da sentença devem ser considerados integralmente cobertas pelo subsídio pago a esse título pela seguradora de acidentes de trabalho.
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A não se considerar o pagamento efectuado pela dita seguradora, haverá uma inquestionável duplicado, estando ainda o demandado Fundo de garantia Automóvel obrigado, eventualmente, a proceder ao reembolso de tais montantes à seguradora.
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Finalmente, concluindo-se que a vítima contribuiu com culpa na produção do acidente, os montantes indemnizatórios a fixar deverão ser reduzidos na medida da contribuição dessa mesma culpa.
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A douta sentença violou, por isso, o disposto no artº 483º e artº 566º, nº 2 e 3 ambos do Código Civil.
O Mº Pº na comarca respondeu pugnando pela improcedência do recurso na parte em que contrarie os factos constantes da acusação pública.
Nesta Relação o Exmo. Procurador – Geral Adjunto posto que o recurso se restringe ás matéria de natureza civil não emitiu parecer.
Parecer que notificado não mereceu resposta.
Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência há que decidir: O recurso está limitado à matéria de direito nos termos dos artºs 364º e 428º do CPP.
O âmbito dos recursos afere-se e delimita-se através das conclusões formuladas na respectiva motivação conforme jurisprudência constante e pacífica desta Relação, bem como dos demais tribunais superiores, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
As questões a resolver são as seguintes: A.
Culpa da vítima na produção do acidente.
B.
Indemnização – Direito à vida C.
Indemnização – Danos não patrimoniais próprios dos requerentes D.
Indemnização – Lucros cessantes Factos dados como provados: 1 – No dia 17.9.05, pelas 20.15 horas, o arguido conduzia o...
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