Acórdão nº 0575/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução08 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A……….., Lda., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, julgou improcedente a reclamação deduzida, nos termos dos artigos 276º e seguintes do CPPT, contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de Tondela de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia com vista à suspensão do processo de execução fiscal.

1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes: A. O presente processo respeita a uma reclamação apresentada pela A………. contra o indeferimento, por parte do Serviço de Finanças de Tondela, de um pedido de dispensa de prestação de garantia em que não foi realizada a audição do contribuinte prévia a esse indeferimento, em violação do disposto nos artigos 267.º, n.º 5, da CRP, 60º da LGT e 45º do CPPT.

Da efectiva falta de fundamentação da decisão do OEF reclamada nos autos: B. Ao invés do que o Tribunal a quo veio a considerar na sentença recorrida, o conteúdo da decisão do OEF reclamada nos autos atém-se por uma consideração genérica, vaga e não aplicada ao caso concreto, em relação ao pedido formulado e respectiva prova, que, por isso, em nada fundamenta a decisão de indeferimento e que não poderá senão equivaler a uma falta de fundamentação.

C. A “fundamentação” a que a AF recorre para indeferir o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado pela A……….. vem a ser, simplesmente, uma reprodução de normas legais e de um ofício-circulado – cf. teor do acto de indeferimento reclamado nos autos.

D. Falta – ostensivamente – na decisão reclamada nos presentes autos, uma apreciação do caso concreto, que passa incontornavelmente por uma apreciação dos elementos invocados no pedido de dispensa e então juntos, o que não sucedeu, verificando-se, em consequência, uma absoluta ausência de fundamentação de facto na decisão reclamada.

E. Ao considerar que a decisão em apreço cumpria os imperativos de fundamentação, em especial, no que respeita à enunciação de razões de facto, o Tribunal a quo violou o disposto no nº 3 do artigo 269º CRP, nos artigos 36º e 37º do CPPT, no artigo 77º da LGT e mesmo nos artigos 124º e 125º CPA, devendo a sentença proferida ser revogada em conformidade.

Da ilegalidade decorrente da falta de apreciação de elementos novos invocados pela A………. em sede de audição prévia: F. A Administração Fiscal não considerou os elementos novos trazidos aos autos no exercício do direito de audição prévia pela A………. (elementos que, aliás, tinham relevância para a decisão do pedido em causa, na medida em que preenchiam e concretizavam os requisitos de tal dispensa de prestação de garantia), nem sobre eles sequer se pronunciou, – como o próprio Tribunal a quo acaba por reconhecer ((8) Conforme se pode ler no primeiro parágrafo da página 43 da sentença recorrida: “ainda que a AF não tenha cumprido integralmente como disposto no art. 60º, nº 7 da LGT...

” (sublinhado nosso).) –, razão pela qual ocorreu vício de violação de lei (por violação do disposto no artigo 60º, nº 7, da LGT), o que inquinava a decisão final reclamada de ilegalidade, ao invés do que foi decidido em 1ª instância.

  1. Da necessidade de cumprimento do disposto no artigo 60º, nº 7, da LGT: G. Ainda que a audição prévia não fosse obrigatória no caso do pedido dos autos – no que não se concede e não se aceita, como adiante se demonstrará –, uma vez dada essa possibilidade pela Administração Tributária à A……….., sempre teria que ser cumprido o previsto no nº 7 do art. 60º da LGT.

    H. Caso contrário, estaríamos perante uma situação perversa em que Administração Tributária concedia a possibilidade de exercício de um direito ao contribuinte, mas depois tirava-lhe todo o efeito útil ao desconsiderar – legalmente, na posição defendida pelo Tribunal a quo – os elementos novos trazidos ao processo.

    I. Após ter concedido esse direito à A……….., permitindo que participasse na formação da decisão em causa, a AT ficou, consequentemente, vinculada aos termos por que deve ser exercido esse direito, nomeadamente, ficou vinculada à obrigatoriedade de ter em conta na fundamentação da decisão final os elementos novos suscitados pela A……….. em sede de audição prévia, de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 60º da LGT, J. O que, não tendo sucedido na decisão final reclamada nos presentes autos – que não se pronunciou, em absoluto, sobre os elementos apontados em sede de audição prévia, não concluindo em que medida é que os mesmos não contribuíram para que o sentido da decisão fosse alterado –, determina que semelhante decisão não se encontre devidamente fundamentada, ao invés do decidido em 1.ª instância.

  2. da obrigatoriedade de audição prévia no caso dos autos: K. De todo o modo, no caso dos autos, a audição prévia ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia em causa nos autos, impunha-se, com efeito, nos termos legais.

    L. A sentença recorrida (acolhendo e transcrevendo o teor do Acórdão deste STA de 26.09.2012) acompanha a corrente que qualifica o acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia como um acto de natureza administrativa – cf., em particular, páginas 42 e 43 da sentença aqui posta em crise.

    M. Consubstanciando a decisão de indeferimento de um pedido de dispensa de prestação de garantia um acto administrativo em matéria tributária e, como tal, sujeito ao regime previsto na LGT para os procedimentos tributários (e, em particular, ao princípio da participação contido no artigo 60º do mesmo diploma), não se pode aventar, no modesto entendimento da A……….., a possibilidade da sua não observância ou simples dispensa, como acabou por concluir o Tribunal a quo para justificar a não observância do dever de fundamentação previsto no nº 7 do artigo 60º da LGT.

    N. Não parece ser legalmente admissível recorrer a uma possibilidade de dispensa de audição prévia prevista ou (i) num regime de aplicação supletiva (in casu, o regime previsto no CPA) ou (ii) num regime criado ad hoc (em concreto, um regime resultante da consideração de que o requerimento de dispensa de garantia, por dever ser fundamentado e instruído com prova, consubstancia, em si, a audição prévia do interessado), quando a própria Lei Geral Tributária não se mostra omissa quanto à matéria.

    O. A aplicação do Código de Procedimento Administrativo às relações jurídico-tributárias, nos termos do disposto na alínea c) do artigo 2º da LGT, mostra-se de carácter supletivo: é a Lei Geral Tributária que se aplica em primeira linha à solução das questões postas ao intérprete-aplicador, só sendo legítimo o recurso aos restantes diplomas enunciados no artigo 2º da LGT em caso de lacuna da mesma Lei.

    P. A Lei Geral Tributária não contém qualquer lacuna quanto ao exercício de audição prévia ao indeferimento de um pedido de dispensa de garantia, que possibilite ou autorize o recurso a regimes especiais previstos em legislação subsidiária ou interpretativamente criados para a situação concreta. Bem pelo contrário: a LGT claramente ordena que previamente ao indeferimento de um pedido apresentado pelo contribuinte à Administração Fiscal – como vem a ser um pedido de dispensa de prestação de garantia – seja aquele ouvido e convidado a participar na formação da decisão final – cf. artigo 60º, nº 1, alínea b), da LGT –, sendo que os nºs. 2 e 3 do mesmo artigo 60º da LGT vêm indicar, peremptoriamente, as situações em que poderá ocorrer a dispensa de audição prévia no âmbito das relações jurídico-tributárias, nos quais não se inclui o indeferimento de um pedido de dispensa de prestação de garantia.

    Q. Ao fazer-se apelo a um regime previsto no Código de Procedimento Administrativo (ou mesmo a um regime que decorre da interpretação de que a própria petição fundamentada afastará a audição prévia) para justificar a possibilidade de dispensa de audição prévia no caso, está-se, em bom rigor, a revogar semelhante disposição da Lei Geral Tributária, aditando-lhe outras possibilidades de dispensa de audição prévia, que o legislador fiscal manifestamente não consagrou.

    R. Ainda que se aceitasse a aplicação subsidiária da possibilidade de dispensa de audiência prévia, prevista no CPA para os casos em que a decisão se mostra urgente, às situações de indeferimento de pedido de dispensa de garantia – no que não se concede –, sempre importará notar que a urgência da decisão invocável para justificar esta dispensa de audiência prévia em procedimentos administrativos «não são razões ligadas com a necessidade de cumprimento do prazo legal de conclusão do processo ou com a necessidade de prevenir o aparecimento de actos tácitos que podem ser invocadas para justificar o preenchimento do pressuposto da urgência da decisão.» - cf. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, op cit.

    S. A urgência da decisão deverá ser justificada e fundamentada por referência à situação material existente, devendo resultar objectivamente do acto e das suas circunstâncias (cf., neste sentido, Ac. STA de 28-05-2002, proc. 048378, disponível em www.dgsi.pt), não já por referência à situação procedimental de cumprimento de determinado prazo estipulado para a conclusão do procedimento ((9) Nas expressivas palavras do Exmo. Senhor Dr. Juiz Conselheiro Lino Ribeiro, em voto de vencido ao entendimento que fez maioria no mencionado Ac. deste STA de 26.09.2012: «O prazo de 10 dias para decidir o dito “procedimento” é assim meramente ordenador ou disciplinador, sem quaisquer consequências negativas para o requerente. Daí que não nos devemos impressionar com a alegação de que tal prazo determina a natureza urgente do procedimento, pois, pelo menos na perspectiva do executado, não há uma correlação necessária entre o prazo de decisão e a urgência na resolução da pretensão. Além disso, a aplicar-se as normas do CPA, seria sempre de exigir um “despacho” a justificar a urgência da...

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