Acórdão nº 01483/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução04 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.1. INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP e A………… Ldª, interpõem recurso de revista, nos termos do artigo 150º do CPTA, do Acórdão do TCA Sul que revogou decisão do TAF que, com fundamento em alteração das circunstâncias, revogara, por sua vez, anterior deferimento da providência formulada por B……….

1.2. O pedido formulado por B……….. consistiu no decretamento de providência cautelar de suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado [AIM] de medicamentos genéricos contendo Valsartan, concedidos pelo INFARMED às contra-interessadas, entre as quais a ora recorrente A……….., durante o período de vigência da Patente e dos Certificados Complementares de Protecção 20 e 24 [que terminam em 23-9-2013 e 2-2-2015, respectivamente], relativamente aos produtos que identifica; e também na intimação do INFARMED a não autorizar ou não realizar a transferência das AIM’s concedidas para as contra-interessadas durante o período de vigência das referidas Patentes e Certificados Complementares de Protecção 20 e 24M; e ainda na intimação da Direcção-geral das Actividades Económicas, através do requerido Ministério da Economia e Inovação, a abster-se de, enquanto a patente PT 96.799 e a extensão do seu âmbito de protecção garantida pelos CCP 20 e 24 se encontrarem em vigor, emitir os PVP’s requeridos ou a requerer pelas Contra-interessadas ou a abster-se de emitir os referidos actos sem suspender a sua eficácia.

1.3. Por sentença datada de 2-2-2011, o TAC de Lisboa julgou procedente a providência cautelar requerida [cfr. fls. 1654/1695].

1.4. Inconformados, dela recorreram o INFARMED e várias contra-interessadas mas o TCA Sul, por acórdão de 28-4-2011, negou provimento aos recursos interpostos e confirmou a sentença recorrida [cfr. fls. 1964/1991].

1.5. Através do requerimento de fls. 2041/2049, a A……….. requereu, invocando para o efeito a entrada em vigor da Lei nº 62/2011, de 12/12, e o disposto no artigo 124.º do CPTA, a revogação da decisão que deferira a providência, pedido esse que contou com a concordância do INFARMED [cfr. fls. 2074/2079 dos autos].

1.6. Por decisão datada de 4-6-2012, foi aquele pedido julgado procedente e, em consequência, revogada a suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado dos medicamentos genéricos de Valsartan que o INFARMED havia concedido às Contra-interessadas [cfr. fls. 2083/2098 dos autos].

1.7. Inconformada, a B……… interpôs recurso jurisdicional daquela decisão para o TCA Sul que, por acórdão de 18.10.2012 (fls. 2813/2822), revogou a decisão recorrida e manteve na ordem jurídica a decisão contida no acórdão de fls. 1964/1991, que suspendera a eficácia dos actos de AIM concedidos às contra-interessadas.

1.8. É sobre esse aresto o presente recurso de revista.

1.9. O INFARMED concluiu nas suas alegações: «1ª O Recurso de Revista, nos termos do artigo 150.° do CPTA, deve ser admitido quando, cumulativamente, i) esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância, jurídico ou social, se revista de importância fundamental, e, ii) quando a admissão de recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

  1. No caso concreto, a questão relativamente à qual se pretende a douta intervenção deste Venerando STA, consista em saber se o requisito da alteração das circunstâncias inicialmente existentes, prevista no artigo 124,°, n.º 1, do CPTA, se refere exclusivamente à verificação de factos novos ou se engloba igualmente alterações legislativas que alterem o regime jurídico aplicável à situação em concreto, provocando uma mudança relevante na convicção do juiz.

  2. Ora, esta questão é de uma evidente relevância social, o que se constata pelo facto de haver mais de 300 ações administrativas especiais bem como providências ativas relativas a esta questão, assim como, pelo facto de esta questão ter capacidade para colocar em causa o desenvolvimento do mercado de genéricos, que tem inquestionavelmente devolvido resultados muito positivos traduzidos em benefícios, quer para o cidadão quer para o Estado.

  3. Por outro lado, para além de esta questão revelar uma enorme complexidade jurídica, revela-se também necessária uma melhor aplicação de direito, uma vez que, a decisão do TCA Sul é violadora do regime de revogação, alteração e substituição das providências cautelares.

  4. Além de que, in casu, também é necessária uma melhor aplicação do direito por parte do Venerando STA, e nem se diga, por outro lado, que o presente recurso de revista seria inadmissível por se tratar de uma providência cautelar, na medida em que a questão que se pretende ver solucionada não se coloca noutra sede que não em sede de alteração e revogação de processos de providência cautelar 6.ª Nestes termos, e tendo presente que este Venerando Tribunal ainda não se pronunciou sobre esta matéria, afigura-se-nos totalmente conveniente a admissão do presente recurso de revista.

  5. Da letra da lei não resulta qualquer indicação no sentido de que o conceito de "alteração das circunstâncias inicialmente existentes", se refere exclusivamente a alterações a surgir no plano fático, não fazendo o artigo qualquer tipo de distinção 8.ª Note-se que, nas mais elementares regras sobre interpretação da lei, estabelecidas no Código Civil, se prevê que não pode "ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso". (artigo 9.°/2, do CC).

  6. Nestes termos, O deferimento do pedido de revogação da decisão do TCA Sul que decretou a providência cautelar dependeria da prova da ocorrência de uma "circunstância" - conforme letra da lei - superveniente à prolação da sentença e do pressuposto de que tal "circunstância" veio a alterar o juízo que esteve na base da sua concessão.

  7. Ora, entende o ora Recorrente que tais requisitos se encontram previstos nos presentes autos na exata medida em que a lei os prevê.

  8. No que diz respeito à ocorrência de uma "circunstância" superveniente à prolação da sentença, note-se que pedido de revogação da decisão que decretou a providência cautelar apresentado pela contra interessada vem na sequência da publicação da Lei 62/2011, requerendo a revogação da decisão tomada pelo Venerando TCA Sul em 28.04.2011, que diferiu o pedido de suspensão de atos de autorização de introdução no mercado ("AIMs") de medicamentos genéricos com a substância ativa "Valsartan", 12.ª A Lei 62/2011 entrou em vigor no passado dia 17 de Dezembro de 2011, sendo que nos termos do artigo 9,°/1 da Lei 6212011, o legislador conferiu natureza interpretativa à nova redação dada aos artigos 19.°, 25,° e 179,° do Estatuto do Medicamento.

  9. Efetivamente, ao atribuir natureza interpretativa aos supra mencionados artigos do Estatuto do Medicamento, o legislador esclareceu, de forma inequívoca, que não só o procedimento de autorização de introdução no mercado de medicamentos apenas visa apreciar a qualidade, segurança e eficácia do medicamento como também que nunca pretendeu conferir ao INFARMED competências em matéria de propriedade industrial, até porque tal se mostraria incompatível com as atribuições deste Instituto, 14.ª Por seu turno, no que diz respeito à possibilidade de que essa "circunstância" pudesse alterar o juízo que esteve na base da concessão da providência, importa referir que a decisão tomada pelo Venerando TCA Sul de 28.04.2011, que decretou a presente providência de suspensão de eficácia de AIMs de medicamentos genéricos contendo a substância ativa "Valsartan" foi deferida por se considerar verificados os requisitos previstos no artigo 120.º/1/b) do CPTA.

  10. Com a entrada em vigor da norma interpretativa constante da Lei 62/2011, resulta agora evidente a total improcedência da pretensão de fundo da Requerente, isto é, não se verifica o requisito do fumus boni iuris, na sua vertente do fumus non malus iuris, para que a presente providência de suspensão de eficácia de AIMs de medicamentos com a substância ativa "Valsarlan" possa ser adotada nos termos do artigo 120.º/1/b) do CPTA.

  11. Assim, encontramo-nos perante uma efetiva ‘alteração das circunstâncias inicialmente existentes'; a qual em última análise se consubstancia numa alteração legislativa, uma vez que o pedido de revogação da decisão que decretou a providência cautelar apresentado pela contra interessada vem na sequência da publicação da Lei 62/2011.

  12. Sendo que, como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, são dados que alteram a convicção do juiz na análise dos requisitos da providência cautelar, independentemente de serem oriundos de factos supervenientes ou alterações legislativas supervenientes ao decretamento da providência».

1.10. A Recorrente A………. alegou, concluindo: «1. O presente recurso tem por objecto o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul que revogou a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo com base no seguinte fundamento: "( ... ) o mecanismo processual contido no n.º 1 do artigo 124º do CPTA não se destina a "corrigir" decisões erradas mas apenas e tão só a permitir que uma eventual pronúncia judicial favorável ao decretamento duma providência cautelar possa ser reapreciada caso ocorra uma "alteração das circunstâncias inicialmente existentes", ou seja, uma alteração no plano dos factos que fundamentaram o decidido.", pelo que "( ... ) a decisão recorrida fez uma errada interpretação do regime contido no artigo 124º do CPTA e, como tal, não pode manter-se".

  1. O Acórdão proferido pelo Tribunal a quo perfilhou uma interpretação manifestamente errada da lei, porquanto a exegese do artigo 124º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos não poderá ser limitada apenas à alteração das circunstâncias no "plano dos factos".

  2. Nos termos do disposto no artigo 150º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais...

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