Acórdão nº 0393/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução03 de Abril de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 2362/12.8 BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 A………… (a seguir Executada, Reclamante ou Recorrida), invocando o disposto nos arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), reclamou junto do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto da decisão do órgão da Administração tributária (AT) que lhe indeferiu o pedido de dispensa da prestação de garantia por ela formulado ao abrigo do disposto no art. 52.º, n.º 4, da Lei Geral Tributária (LGT) e no art. 170.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), após a notificação que lhe foi efectuada para o efeito, nos termos do n.º 6 do art. 169.º deste Código, na sequência da oposição que deduziu.

1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou a reclamação procedente e, em consequência, anulou o acto reclamado.

1.3 A Fazenda Pública (a seguir Recorrente) não se conformou com essa sentença e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no art. 276.º do CPPT, do despacho proferido em 2012.07.05, pelo Exma. Sra. Directora de Finanças Adjunta, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 3514201101036980, que corre termos no serviço de Matosinhos 2 (OEF) e que indeferiu a isenção da prestação de garantia para efeito de suspensão da execução.

B. A douta sentença recorrida anulou o despacho reclamado, por entender que a AT face à informação de que dispõe, não se concebe que a AT se mantenha inerte, como se não possuísse essa informação, limitando-se a alegar que a Reclamante não fez a prova que lhe incumbia, (...) pois quer por força do princípio do inquisitório, da verdade material e da boa fé, está a mesma obrigada a atender a esses elementos que estão na sua disposição, ainda que não tenha sido expressamente solicitada a sua junção ao procedimento.

C. Baseando a sua convicção nos documentos existentes nos autos, a douta sentença sob recurso considerou como assente a factualidade elencada de 1 a 15 do probatório (Ponto IV - “Matéria de facto”), decidindo, a final, pela procedência da presente reclamação.

D. Ora, ressalvado o devido respeito com o que desta forma foi decidido, não se conforma a Fazenda Pública, sendo outro o seu entendimento, já que considera que a douta sentença sob recurso incorreu em erro de julgamento na matéria de direito, como a seguir se argumentará e concluirá.

E. Contrariamente ao sentenciado, perfilha a Fazenda Pública o entendimento, já defendido na sua contestação, de que não é de proceder a pretensão formulada na presente reclamação, porquanto não padece o acto controvertido de qualquer ilegalidade.

F. Com efeito, entende a Fazenda Pública que recai sobre o executado o ónus de provar a verificação dos requisitos para obtenção da dispensa de garantia e não tendo aquela juntado com o requerimento a necessária prova documental, a justificar a análise e ponderação crítica, nada mais restou à Administração Fiscal que não fosse, perante os factos de que dispunha, fazer a sua interpretação conforme o direito aplicável.

G. Assim, tal pedido de isenção, conforme dita o n.º 3 do art. 170.º do CPPT, deve ser instruído com a prova documental necessária, o que pressupõe que toda a prova relativa a todos os factos que têm de estar comprovados, deve ser produzida com o pedido, em obediência aos interesses de prossecução da legalidade e do interesse público os subjacentes à tomada de decisões de concessão de isenção da prestação de garantia e não do foro subjectivo e arbitrário da Fazenda Pública.

H. Deste modo, a prova a efectuar competia à reclamante, no momento em que apresentou o requerimento, em consonância com a jurisprudência dominante, designadamente no Ac. TCA – Sul, proc. 00155/03, de 06.05.2003, disponível em www.dgsi.pt, no Ac. TCA – Sul, proc. 00348/04, de 07.12.2004, disponível em www.dgsi.pt, no Acórdão do TCA – Sul de 29-11-2011, proferido no proc. 05169/11.

I. Assim, não se encontravam reunidos os pressupostos exigidos pelos art. 52.º, n.º 1, 2 e 4 da LGT e 169.º do CPPT: o prejuízo irreparável, a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis e a falta de responsabilidade da requerente na insuficiência ou inexistência de bens.

J. Ademais, resulta dos princípios gerais da prova, designadamente do art. 342.º do Código Civil que quem invoca um direito ou pretensão tem o ónus da prova dos respectivos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos.

K. Desta forma, para que fosse dispensada a prestação da garantia, cabia à reclamante alegar e provar factos dos quais se pudesse concluir pela verificação de tal prejuízo, bem como da sua insuficiência económica.

L. Ora, o pedido de dispensa de garantia apresentado pela reclamante junto do órgão de execução fiscal nos termos do artigo 170.º do CPPT deveria ter sido fundamentado de facto e de direito e instruído com toda a prova documental indispensável, sendo que tal não resulta do requerimento apresentado pela recorrida.

M. Ora, à recorrida incumbia-lhe provar que não obstante a insuficiência de bens penhoráveis para pagamento da dívida exequenda, não se verificou a dissipação dos seus bens com o intuito de diminuir a garantia dos credores, v.g. a este propósito o acórdão do TCA Sul de 27.04.2006, proc. n.º 01139/06.

N. Por outro lado, o reclamante não alegou a ocorrência de irreparáveis prejuízos.

O. Ademais, não se conjectura como poderia ser a AT a carrear para os autos os elementos probatórios atinentes aos factos pessoais alegados pela ora recorrente, de que a prestação da garantia lhe iria causar prejuízo irreparável ou que o mesmo não dispõe de meios económicos suficientes para a prestar, estando a reclamante encontra-se naturalmente e em regra, em melhores condições para satisfazer tal prova de harmonia com a factualidade por si alegada.

P. Assim, pretendeu o legislador ao impor tal ónus probatório ao reclamante na supracitada norma do art. 170.º n.º 3 do CPPT, solução que se afigura como a mais acertada e por isso a escolhida pelo legislador, como ao intérprete, em todo o caso, sempre deve presumir, nos termos do disposto no art. 9.º n.º 3 do Código Civil.

Q. Salienta-se que, a douta sentença sustenta o seu entendimento no voto exarado no acórdão do STA, processo 0708/12, de 26.09.2012.

R. Todavia, a jurisprudência firmada nesse mesmo acórdão foi em sentido distinto: S. Desta forma, entende, pois a Fazenda Pública, com a ressalva do devido respeito, que a douta sentença sob recurso enferma de erro de julgamento sobre a matéria de direito, porquanto fez errónea interpretação e aplicação do disposto nas normas legais aplicáveis in casu, mais concretamente as que regem a isenção da prestação da garantia para efeitos de suspensão do PEF, mais concretamente os arts. 52.º da LGT e 169.º do CPPT.

Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida atendendo à verificada inutilidade da lide, ou por não ser adequado o momento da subida da reclamação, ou quando assim não se entenda, por verificação de erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito».

1.4 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.5 Não foram apresentadas contra alegações.

1.6 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença recorrida e mantida a decisão administrativa reclamada, com a seguinte fundamentação: «Nos termos do estatuído no artigo 52.º/4 da LGT a Administração Tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.

A responsabilidade do executado, prevista na parte final do número 4, deve entender-se em termos de dissipação dos bens com o intuito de diminuir a garantia dos credores e não mero nexo de causalidade desprovido de carga de censura ou simples má gestão dos seus bens

1.

[ 1 Lei Geral Tributária, anotada, 2.ª edição, página 205, Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa.

] Como resulta do teor do artigo 52.º/4 da LGT, para que possa ser deferida a dispensa de prestação de garantia é necessário que se verifiquem três requisitos, cumulativamente, embora dois deles comportem alternativas.

Assim é necessário: l. Que haja uma situação de inexistência de bens ou sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e acrescido; 2. Que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado; 3. Que a prestação da garantia cause prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos.

É ao executado que pretende a dispensa da prestação de garantia que incumbe o ónus da prova dos pressupostos de que depende tal dispensa, designadamente de que não foi por culpa sua que se verificou a situação de inexistência de bens ou sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e acrescido 2.

[ 2 Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6.ª edição, 2011; volume III, páginas 23 3/235, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa. Acórdãos do PLENO da SCT do STA, de 17 de Dezembro, de 2008-P. 327/2008 e de 2012.10.17-P. 0414/12, e da SCT, de 2010.12.19-P...

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