Acórdão nº 01/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Fevereiro de 2013
Magistrado Responsável | DULCE NETO |
Data da Resolução | 20 de Fevereiro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
A FAZENDA PÚBLICA interpõe recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte que confirmou a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, mantendo a decisão de procedência da reclamação que a sociedade A………., S.A., deduziu contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de Matosinhos-1 de indeferimento do pedido de prestação de garantia através de fiança oferecida pela sociedade A………., S.A.
1.1. Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso versa sobre o critério de aferição da idoneidade concreta da fiança prestada para suspensão da execução fiscal.
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Essa questão tem importância fundamental pela sua relevância jurídica e social.
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Seguro é, efetivamente, que a presente controvérsia não se confina aos estreitos limites dos presentes autos e que se reproduzirá em todos os casos em que se mostre necessário avaliar a idoneidade concreta do fiador na sequência das decisões judiciais que concluíram pela admissibilidade abstrata da fiança.
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A questão preenche, portanto, os requisitos do art. 150º, 1, do C.P.T.A, pelo que o recurso deve ser admitido.
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O acórdão em recurso decidiu que os requisitos da idoneidade concreta do fiador se encontram plasmados no art. 633º, 1, do C.C. e que consistem apenas na sua capacidade para se obrigar e na existência de ativo de valor superior ao da divida afiançada.
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A Fazenda Pública entende, ao invés, que aquela disposição legal não é diretamente aplicável às situações previstas nos arts. 169º e 212º do C.P.P.T e no art. 52º da LGT.
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A avaliação do fiador deve atender ao tipo, natureza e composição do seu património, aos ónus existentes, ao valor do seu passivo e, sobretudo, à sua capacidade financeira de curto prazo, isto é, à sua solvabilidade de curto prazo.
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Este último índice é absolutamente determinante já que, em qualquer execução, a garantia tem como objectivo não só proteger o credor contra a depreciação e delapidação do património do devedor no período da suspensão do processo executivo mas também garantir o credor, no termo daquele prazo.
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Essa dupla função da garantia adquire maior relevo no processo executivo fiscal, por vigorar no nosso ordenamento jurídico-fiscal, ainda que de forma mitigada, o principio do solve e repete.
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Por força desse princípio, a prestação da garantia tem que equivaler a um pagamento — o que ocorre com a garantia bancária e o seguro-caução — ou, pelo menos, assegurar esse pagamento de forma substancial. Na lógica do sistema, a suspensão da instância executiva só ocorre porque a finalidade do processo - a cobrança da dívida tributária - se mostra lograda antecipadamente por via da garantia obtida.
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Acresce que a fiadora se assumiu como principal pagadora, isto é, se assumiu como devedora solidária da obrigação exequenda, pelo que é inequivocamente responsável pelo seu pagamento.
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Apenas por essa razão e se outras não existissem, a distinção estabelecida pelo acórdão entre efetuar o pagamento/prestar garantia tem que ser rejeitada, pelo que, neste caso, a fiadora se prontificou a solver a divida da sua afiançada.
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Em vista do exposto, a solvabilidade de curto prazo da fiadora é absolutamente determinante para a aceitação da garantia prestada.
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A jurisprudência do acórdão recorrido que julgou válida a fiança apenas pela relação existente entre o valor do ativo e dos capitais próprios da fiadora e o valor da obrigação afiançada não pode, pois, manter-se.
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Com efeito, ela aplica indevidamente o art. 663º do C.C. e viola o disposto nos arts.30º, 2, da LGT, 85º do C.P.P.T. e 200º, 2, deste último diploma.
Termos em que se solicita a sua revogação com as legais consequências.
1.2.
A Recorrida apresentou contra-alegações, que concluiu do seguinte modo: i. A Fazenda Pública interpõe recurso de revista para este Supremo Tribunal, quando está na posse de elementos que apontam, precisamente, no sentido de que a jurisprudência firmada pelo Tribunal ad quem se consolidou no sentido oposto, tendo em conta que, para proferir a decisão ora recorrida, o próprio Tribunal a quo se suportou, não só em jurisprudência própria, mas, inclusivamente, em jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo - que a própria Fazenda Pública invoca.
ii. Nestes termos, o recurso a que se responde corporiza uma verdadeira litigância de má fé - na medida em que, nos termos do artigo 456.º n.º 2 d) do CPC, se faz do processo um uso reprovável com o fito de «(...) protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.» - pela invocação consciente de um argumentário infundado, em circunstâncias em que sabe e não pode desconhecer que não existe qualquer controvérsia doutrinal e/ou a jurisprudencial, susceptível de gerar incerteza e instabilidade na resolução da questão em apreço — inexistindo, portanto, “fundamento sério” para o presente recurso — litigância de má-fé que cabe, não à Administração Fiscal (Nos termos do artigo 104.° da LGT.
), mas sim à própria Representação da Fazenda Pública (Nos termos do artigo 456.° e 459.° do CPC.
).
iii. O presente recurso foi interposto ao abrigo do disposto no artigo 150º. do CPTA, pelo que, por força do constante no artigo 147º. n.º 1 do CPTA, e uma vez que se trata de processo urgente, o recurso deveria ter sido interposto no prazo de 15 dias — ou seja, até ao dia 17.11.2012 — quando, como resulta dos autos foi interposto em 23.11.2012.
iv. No acórdão recorrido não se evidência a existência de um qualquer erro manifesto, e a pronúncia nele contida não se apresenta desenquadrada do espectro das soluções jurídicas plausíveis para as questões sobre as quais que se debruçou, - as quais, como se disse, estão hoje pacificamente consolidadas na Jurisprudência.
v. As questões analisadas tampouco revelam uma especial complexidade, na medida em que a sua resolução não exige a realização de operações exegéticas ou hermenêuticas de particular dificuldade, não ultrapassando aquilo que é usual nas controvérsias judiciárias.
vi. Afora o inegável interesse da Recorrente, em obstar ao trânsito em julgado do acórdão recorrido, e em alimentar a sua sanha litigante, não se vê que estejam em causa interesses comunitários, de especial relevância jurídica ou social, susceptíveis de legitimar a admissão do recurso de revista — os quais nem vêm alegados.
vii. O presente recurso não deve, portanto, ser admitido (Cfr., entre outros, os Acs. STA, de 20/5/09, rec. n.° 295/09, de 29/6/2011, rec. n.° 0568/11, de 7/3/2012, rec. n.º 1108/11, de 14/3/12, rec. n.º 1110/11, de 21/3/12, rec. n.° 84/12, e...
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