Acórdão nº 01241/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Fevereiro de 2013
Magistrado Responsável | DULCE NETO |
Data da Resolução | 27 de Fevereiro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade A……, S.A., deduziu contra a autoliquidação de Derrama, no valor de € 34.709,77, apurada na Declaração de Rendimentos, Modelo 22 – Declaração de Grupo de Sociedades, respeitante ao exercício de 2007.
1.1.
Terminou a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões: 1. A douta sentença recorrida anulou a derrama autoliquidada na declaração de rendimentos de IRC, respeitante ao exercício de 2008, por considerar que o quid dessa mesma derrama, quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos das sociedades, é constituído pelo lucro tributável do grupo.
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Nos termos da mesma peça decisória, em sede de aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, quando o n.º 1 do art. 14º da Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro, refere que a derrama incide sobre o lucro tributável sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, apenas pretende abranger o lucro decorrente da soma de lucros tributáveis e prejuízos fiscais individuais, uma vez que só este se encontra sujeito.
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O Meritíssimo Juiz a quo, na esteira do mesmo entendimento, considera que assumindo a Lei a existência de grupos de sociedades e criando um regime especial de tributação destes, tal terá necessariamente de vigorar em toda a linha, independentemente de poder vir proporcionar resultados mais favoráveis aos sujeitos passivos assim identificados.
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Com a entrada em vigor da Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro, a derrama passou a ser calculada sobre o valor do lucro tributável do IRC, em alternativa a colecta, critério assumido pela Lei n.º 42/1998, que vigorou até ao exercício de 2006.
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Enquanto que o n.º 1 do artº 18º da Lei n.º 42/1998 estabelecia que a derrama incidia sobre a colecta de IRC, o n.º 1 do artº 14º da Lei n.º 2/2007 passou a determinar que a derrama recai sobre o lucro tributável.
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A alteração ao método de calculo da derrama, consagrada no artº 14º da Lei n.º 2/2007, criou uma nova regra de incidência que conduz à liquidação da derrama mesmo na ausência de IRC a pagar, consubstanciando uma verdadeira mudança de paradigma no respectivo cálculo que, no limite, até pode desvirtuar a sua acessoriedade face ao IRC.
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A derrama da LFL de 2008 é claramente um imposto autónomo em relação ao IRC.
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Na análise do conteúdo dos preceitos legais em confronto, forçoso é recorrer à ratio legis, tendo sempre presente que a captação do sentido de uma norma não pode fazer-se de uma forma isolada.
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Entre os motivos subjacentes a apresentação da Proposta de Lei n.º 92/X, elemento propulsionador da actual Lei das Finanças Locais, está o reforço do sistema de financiamento autárquico, assente na diminuição da dependência financeira dos municípios em relação às receitas provenientes do Estado e de algumas entidades privadas, designadamente as oriundas do sector da construção civil. A referida iniciativa legislativa vem, desde logo, ao encontro da garantia institucional da autonomia local, consagrada no n° 1 do artº 238º da CRP, que obriga as autarquias a dispor de meios financeiros suficientes e autónomos, bem como do gozo de autonomia na gestão desses mesmos meios.
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A raiz da actual Lei das Finanças Locais, em homenagem ao disposto no nº 2 do artº 238º da CRP, também convoca os princípios constitucionais do equilíbrio financeiro e da justa repartição. Este último, em particular, aponta para a concretização de medidas legislativas que promovam a coesão económica e social de todo o território, assegurando o crescimento equilibrado de todas as regiões, imperativo constitucional, atento o disposto na alínea d), do artº 81º da Lei Fundamental.
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A doutrina vertida na douta peça decisória, que considera que o quid da derrama, quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos das sociedades, é constituído pelo lucro tributável do grupo, representa, em última instância, um rude golpe aqueles princípios estruturantes da nova lei das Finanças locais, uma vez que sanciona um incompreensível desvio a um dos mais importantes objectivos que presidiram as alterações nela consignadas: evitar que a derrama deixasse de ser liquidada quando existissem prejuízos fiscais reportáveis de exercícios anteriores.
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O quid da derrama, quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos das sociedades, não é constituído pelo lucro tributável do grupo, pelo que, no âmbito do referido regime especial de tributação, deverá ser...
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