Acórdão nº 00033/10.9BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelAna Paula Soares Leite Martins Portela
Data da Resolução14 de Setembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P. (IFAP, I.P.), inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF dE MIRANDELA, em 30/06/2011, que julgou procedente a Acção Administrativa Especial interposta pelo CONSELHO DIRECTIVO DO BALDIO DE SENDAS, anulando a decisão final do IFAP-IP constante do ofício nº 3179/DAI/UPRF/2009, de 30/09/2009, que determinou, a modificação unilateral do contrato afecto ao Projecto nº 200210056659 (Programa AGRO – medida 3), com a consequente reposição pelo A., no prazo de 30 dias, da quantia de € 138.725,43.

Para tanto alega em conclusão: A. O Tribunal a quo anulou …a decisão final do IFAP-IP, constante do ofício nº 3179/DAI/UPRF/2009, de 30/09/2009, que determinou, a modificação unilateral do contrato afecto ao Projecto nº 200210056659 (Programa AGRO – medida 3), com a consequente reposição pelo A., no prazo de 30 dias, da quantia de € 138.725,43.

B. Entendeu o Tribunal a quo, que “… o acto impugnado é anulável porque foi praticado com ofensa do disposto no art.° 5.°, n.° 2 do CPA - art.° 135.° 4 CPA”, porquanto a “…Autora cumpriu integralmente o projecto de investimento não tendo sido detectada qualquer irregularidade na sua execução física e que todo o dinheiro recebido do IFAP foi utilizado no pagamento das despesas relativas á execução do projecto”; e que “… foi praticado com ofensa do disposto no art.° 141.° do CPA — art.° 135.° do CPA …”.

C.Salvo melhor entendimento, ao contrário do entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, o acto não foi praticado com ofensa do disposto no Art° 5°, n° 2 do CPA e do Art° 135° nº 4 CPA, uma vez que não foram levados em consideração, a existência de deveres contratuais acessórios.

D.Com efeito, o cumprimento de um projecto apresentado no âmbito do Programa AGRO, não se esgota na… regularidade da sua execução física, pois, entre outras formalidades, o beneficiário tem de cumprir a regra da elegibilidade.

E. Ou seja, só pode apresentar a pagamento despesas efectivamente realizadas, porquanto, a ratio das ajudas pagas no âmbito do Programa Agro é reembolsar as despesas efectivamente realizadas e não financiar ab initio a execução de um projecto.

F. Ora, na situação em apreço, verificou-se em sede de controlo que à data da apresentação do pedido de pagamento (12/05/2004), as despesas apresentadas pelo recorrido não se encontravam efectivamente liquidadas, uma vez que, os cheques utilizados para o pagamento foram emitidos em 10/09/2004.

G.O não cumprimento da regra elegibilidade por parte da recorrida põe em causa a relação de confiança e de transparência essencial à manutenção da relação contratual, razão pela qual esta conduta terá de ser sancionada.

H. Aliás, sobre esta questão, pronunciou-se, neste sentido, a 1ª Secção - Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo do Norte, através de Acórdão proferido em 13-01-2011, no âmbito do Processo nº 01450/06.4BEVIS.

I. Verifica-se assim, que, se é certo que o beneficiário executou fisicamente o projecto, não menos verdade é que é que não o fez da forma a que legalmente estava obrigado, pelo que, salvo melhor entendimento, o Tribunal a quo no acórdão recorrido, não faz uma correcta interpretação dos factos e de direito.

J. Salvo melhor entendimento, também não é correcto o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, no sentido de anular a decisão final proferida pelo ora recorrente, por ofensa do disposto no Artº 141º do CPA.

K. Com efeito, é pacífico na jurisprudência, (Cfr. acórdãos para fixação de jurisprudência do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, de 6/10/2005 e de 29-03-2007, proferidos no âmbito do Rec. nº. 2037/02 e do Rec. nº 0661/05), que tratando-se de ajudas comunitárias, deverá prevalecer o Principio da Repetição do Indevido, porquanto em sede de Direito Comunitário, este tem o valor de princípio geral.

L. A este respeito destaca-se ainda o recente Acórdão para fixação de jurisprudência, proferido, em 3/5/2007, pelo Pleno do Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do Recurso nº 1775/02, que é taxativo em consagrar o entendimento que “o artigo 141.º do CPA não pode ser aplicado se conduzir a solução desconforme com as normas dos regulamentos comunitários acima mencionadas, pelo que temos de conceder prevalência à aplicação das normas comunitárias e afastar a aplicação da norma nacional. (Negrito nosso) M. Ora, na situação em apreço, foi detectada uma irregularidade por parte da entidade recorrida, por incumprimento da regra de elegibilidade n.° 1 do Regulamento (CE) n.° 1685/2000 com a última redacção dada pelo Regulamento (CE) n.° 448/2004, da Comissão, de 10 de Março, bem como do artigo 32° do Regulamento nº 1260/1999, do Conselho, de 21 de Junho.

N. Saliente-se que essa irregularidade foi detectada, no âmbito de uma acção de controlo de primeiro nível a projectos co-financiados pelo FEOGA-O, regulada pelo Artº 5º Decreto-Lei n° 168/2001, de 25 de Maio, e prevista no artigo 10º do Regulamento (CE) n°438/2001, da Comissão, de 2 de Março de 2001, e nos termos do protocolo celebrado entre o Gestor do Programa AGRO e o IFAP.

  1. Ou seja, a irregularidade é detectada na sequência de um controlo imposto pela legislação nacional e comunitária.

    P. Assim, à luz do referido Acórdão, proferido no âmbito do Recurso nº 1775/02, tratando-se a acção 3.1, da Medida 3 - Desenvolvimento Sustentável das Florestas, do Programa AGRO, de uma ajuda comunitária paga ao abrigo do FEOGA-O, perante a irregularidade detectada, deverá sempre o Principio da Repetição do Indevido prevalecer sobre o Principio da Estabilidade e da Confiança, consagrado no Artº 141º do CPA, desta forma se protegendo, em toda a sua extensão, os interesses da Comunidade.

  2. Razão pela qual, fica assim demonstrado que, ao contrário do entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, o acto recorrido não ofende o disposto no Artº 141º do CPA, existindo assim, uma incorrecta interpretação do direito.

    Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser revogada a decisão recorrida, assim se fazendo Justiça.

    *O Baldio de Sendas apresentou contra-alegações, concluindo da seguinte forma: A. Entendeu o Tribunal a quo que o acto impugnado é anulável porque foi praticado com ofensa do art. 5.° n.°2 do CPA, infligindo um sacrifício desnecessário à recorrida uma vez que, procedendo o pedido teria de repor uma verba que utilizou para o fim a que se destinou, porquanto, cumpriu integralmente o projecto de investimento não tendo sido detectada qualquer irregularidade na sua execução física e todo o dinheiro recebido do IFAP foi utilizado no pagamento das despesas relativas à execução do projecto de arborização da área inculta objecto do contrato.

  3. O tribunal a quo fez uma correcta interpretação dos factos e do direito, razão pelo qual, não merece censura a douta sentença ora recorrida.

  4. Com efeito o IFAP, I.P. pode rescindir ou pode modificar unilateralmente o contrato atributivo dc ajudas consoante se verifiquem os requisitos para cada um dos efeitos, expressos nos n.°s 1 e 2 do art. 11.º do DL 163-A!2000,de 27 de Julho, respectivamente.

  5. No caso concreto, está demonstrado nos autos que o projecto foi executado na integra pela recorrida, não se tendo detectado qualquer irregularidade na sua execução e que a recorrida facultou à recorrente todos os documentos comprovativos da utilização de todo o dinheiro recebido do IFAP, no pagamento das despesas referentes à execução do projecto.

  6. Decore expressamente do douto acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, proferido em 13/01/2011, citado pelo recorrente nas suas alegações de recurso, que os fundamentos em que se baseou o IFAP, I.P. para tomar a sua decisão de modificação unilateral, afastam precisamente a possibilidade de usar o mecanismo da modificação unilateral do contrato.

  7. Passando a citar o acórdão referido “... Esta prerrogativa (de modificação unilateral), que está prevista no n° 2 do artigo 11º do DL n° 163-A/2000, é utilizada quando o incumprimento resulte de «condições concretamente verificadas na execução do projecto» ou da «falta ou insuficiência de documentos comprovativos» ... Nem se está perante uma execução parcial ou execução diversa do projecto de investimento, resultante de condições específicas surgidas na sua execução, nem de ausência ou insuficiência de documentos...”.

  8. Acresce que a entidade recorrente actuou no exercício de um poder discricionário, onde cobram autonomia, constituindo seus limites internos, os princípios administrativos, designadamente, o princípio da proporcionalidade, plasmado no n.°2 do art. 5.° do CPA e no n.°2 do art. 266.° da CRP.

  9. O princípio da proporcionalidade exige que a decisão administrativa colidente com a posição jurídica dos administrados seja, não apenas adequada e necessária à prossecução dos interesses públicos específicos, como proporcional em sentido estrito, no sentido em que a lesão sofrida pelo administrado deve ser proporcional e justa em relação ao beneficio alcançado pelo interesse público, não podendo a Administração infligir sacrifícios desnecessários e desproporcionados aos destinatários dos actos.

    I. Na situação em apreço, o interesse público específico visado com a atribuição do poder de modificação unilateral, é a utilização, por parte dos beneficiários, dos dinheiros públicos para os fins a que se destinam (o desenvolvimento da produção florestal e agrícola nacional).

  10. Com base neste enquadramento, é manifesto que a decisão anulada se apresenta, desde logo, como absolutamente inadequada e desnecessária à prossecução daquele interesse público especifico, visto a recorrida ter cumprido integralmente o projecto de investimento de arborização da área inculta objecto do contrato, no qual aplicou todo o valor das ajuda concedidas.

    L. Pior que isso, aquela decisão põe em causa todo o investimento, inviabilizando a prossecução daquele interesse público especifico, uma vez que a recorrida, caso se visse...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT