Acórdão nº 0564/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | CASIMIRO GONÇALVES |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, julgou improcedente a oposição que deduziu à execução fiscal contra si instaurada para cobrança de taxas APA (Administração do Porto de Aveiro, S.A.).
1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 25. O litígio sub judice tem origem numa profunda discordância da Recorrente quanto à exigibilidade do pagamento, sem quaisquer limites ou restrições, das rendas relativas à concessão do uso privativo de uma parcela do domínio público no Porto de Aveiro. 26. Uma parcela de terreno que foi utilizada para instalação e exploração de um “terminal TIR de mercadorias” e que, por isso, dava origem ao pagamento de rendas à entidade concedente, a APA.
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Acontece que tal concessão do uso privativo da parcela dominial em causa foi prejudicada, em larga medida, pela intervenção realizada ao abrigo do Programa Polis — Programa de Requalificação Urbana e Valorização Ambiental das Cidades.
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Uma intervenção que teve lugar na cidade de Aveiro e que veio a resultar para a ora Recorrente, em primeira instância, numa proibição de construção, reconstrução ou ampliação de edifícios no terreno objeto da concessão e, algum tempo volvido, na própria extinção da concessão.
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Factos dos quais não foram, no entender da ora Recorrente, extraídas as devidas consequências tributárias, continuando as rendas a ser liquidadas nos mesmos exatos termos em que tal vinha ocorrendo no passado, não obstante a extinção da concessão.
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O fundamento apresentado na decisão recorrida para habilitar esse comportamento é fácil de enunciar: a Recorrente manteve-se, “de facto”, na área concessionada até Setembro de 2004 o que em si mesmo prejudicaria, sem mais, a pretensão da Recorrente em não pagar a totalidade dos valores reclamados pela APA. Um argumento singelo mas que esquece, no entanto, o impacto direto e indireto que aquelas limitações legais acarretaram.
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É que o valor da concessão tem um valor económico que não pode estar desligado das circunstâncias concretas em que a utilização dos bens do domínio público é efetuada. Não saber se no dia seguinte a utilização do espaço pode continuar a ser efetuada tem, como não poderia deixar de ser, um impacto no valor económico da utilização do espaço.
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Trata-se, para o efeito, da própria continuidade das operações da Recorrente que, dessa forma, está a ser colocada em causa. Um aspeto que em circunstância alguma pode ser negligenciado mas que, no caso em apreço, foi total e integralmente ignorado pela decisão do tribunal “a quo”.
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Pelo que há um “quantum” das rendas que corresponde, de forma clara, a um imposto oculto, uma vez que lhe falta o elemento fundamental da taxa, a sinalagmaticidade.
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Daí que as rendas encerrem, em parte, uma verdadeira natureza fiscal, ficando nesses termos a sua criação sujeita ao princípio da legalidade tributária, ou seja, adstrita à reserva de lei em sentido formal, prevista nos artigos 103°/2, 165° e 198° da Constituição da República Portuguesa. Regras que não foram, claro está, respeitadas no caso em apreço.
Termina pedindo que o recurso seja julgado procedente e seja, consequentemente, revogada a sentença recorrida, julgando-se a oposição procedente.
1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.
1.4. O MP emite Parecer no sentido da improcedência do recurso, nos termos seguintes: «1. Matéria controvertida: - Se as rendas pagas pela utilização de concessão para uso privativo de uma parcela de domínio público no Porto de Aveiro onde a recorrente instalou e explorou até Setembro de 2004 um terminal TIR de mercadorias, assumem apenas em parte a natureza de taxas; - se é de entender estarem as mesmas prejudicadas pela intervenção realizada ao abrigo do “Programa Polis”; - se as referidas taxas têm a natureza de imposto oculto, pelo que a sua criação devia ter ocorrido por lei formal da Assembleia da República, nos termos previstos nos arts. 103°/2, 165° e 198° da C.R.P..
Defende-se na sentença recorrida que as taxas em causa são devidas, em face do previsto no art. 18° do Dec.-Lei n°468/71, de 5/11, concessão de uso privativo de uma parcela dominial, disposição que remete para o que resulta ainda das tarifas aplicáveis.
E que a tal não impedirá a extinção da concessão de serviço público operada pelo Dec.-Lei n° 330/2000, de 27/12, nem que por este tenham deixado de ser considerados o bem em causa do domínio público, em face da existência posterior de uma situação de facto desse tipo, sendo de rejeitar, por isso, a existência de um imposto oculto.
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Posição que se defende: a. Fundamentação.
É certo que o montante das referidas rendas é diferente do que foi liquidado, a título de taxas.
O que está em causa nos presentes autos são estas últimas, cujo montante ascende a € 555.826,84, liquidadas a esse título, e respectivos juros, e em dívida à Administração do Porto de Aveiro.
Aliás, tais taxas são devidas quer pela utilização de contador de água e pela ocupação de terrenos marginais de domínio público marítimo.
É certo que as mesmas foram ainda liquidadas de acordo com o “decorrente” do dito contrato de concessão, conforme ficou expresso no ponto 12 da matéria de facto e documento de fls. 182 e 183 para que se remete.
Após a invocada “intervenção” realizada ao abrigo do dito “Programa Polis”, e a que se refere até o que ficou a constar do ponto 5, não só se extinguiu a dita concessão, como os ditos terrenos deixaram de integrar o domínio público.
No entanto, o decidido obtém ainda sustentação no facto da ora recorrente ter continuado a explorar o dito terminal até Setembro de 2004, cedendo espaços a terceiros, conforme ficou ainda expresso no ponto 6 da matéria de facto.
A questão da inconstitucionalidade faz algum sentido relativamente a taxas aplicadas posteriormente à Constituição da República Portuguesa (C.R.P.), na versão aprovada pela Revisão Constitucional de 1997.
Com efeito, após esta, passou a prever-se reserva parlamentar quanto ao “regime geral das taxas”, matéria relativamente à qual a C.R.P. era anteriormente omissa.
No entanto, em face do que veio a ser previsto no art. 4° n° 2 da Lei Geral Tributária (L.G.T.), as mesmas podiam continuar a ser aplicadas, desde que tenha ocorrido a contraprestação de um serviço, a utilização de um bem do domínio público ou mesmo a remoção de um obstáculo jurídico, o qual teve de ser afastado para que a referida actividade portuária pudesse continuar ainda a ser exercida no local pela recorrente.
No caso a sua aplicação ocorreu com o fundamento legal do art. 7° n° 4 do Dec.-Lei n° 273/2000, de /11, o qual aprovou o Regulamento de Tarifas da APA — Administração do Porto de Aveiro, S.A..
Segundo a concepção doutrinária existente quanto à distinção entre taxa e imposto, a jurisprudência do S.T.A. tem vindo ainda a admitir que a tarifa se enquadre no conceito de taxa que não no de imposto — assim, entre outros, o acórdão de 27-6-07, processo n° 0236/07.
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Síntese conclusiva.
Assim, parece ser de concluir, em síntese, que, em face do alegado, não é de afastar que as taxas em causa estejam de acordo com o legal e constitucionalmente exigível, nomeadamente, por corresponderem a um serviço prestado, à utilização de um bem do domínio público ou à remoção de um obstáculo jurídico, de acordo com o que as distingue dos impostos e com o que veio a ser previsto no art. 4º n° 2 da LG.T., de que decorre ser o recurso de improceder, confirmando-se o decidido.» 1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.
FUNDAMENTOS 2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes: 1. A oponente, “A………, S.A.”, em 10/3/1992, celebrou com a “Junta Autónoma do Porto de Aveiro”, o contrato que consta a fls. 56/65 que se dá por reproduzido, mediante o qual obteve a concessão do uso privativo de uma parcela do domínio público marítimo com a área de...
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